A DISPUTA PELO PAÇO

'Era uma vez em São José': Qual é a senha do Wi-fi do coração dos eleitores de São José?

Por Guilhermo Codazzi, editor-chefe de OVALE | São José dos Campos
| Tempo de leitura: 5 min
Reprodução
Cena do filme 'Era uma vez no Oeste'
Cena do filme 'Era uma vez no Oeste'

O trem serpenteia o árido do deserto. Centenas de homens, sob sol escaldante, trabalham duro na construção da cidade. A trilha, de Ennio Morricone, toca sem dó o peito do espectador. Jill McBain, interpretada magistralmente por Claudia Cardinale, carrega baldes de água para saciar a sede dos operários, enquanto o misterioso Harmônica desaparece rumo ao horizonte.

Com o perdão do spoiler, esta é a cena final de 'Era uma vez no Oeste', de 1968, dirigido por Sergio Leone, considerado por muitos amantes do western como o melhor faroeste de todos os tempos. O roteiro é centrado em quatro protagonistas, com destaque para o vilão Frank (Henry Fonda) e o anti-herói Harmônica (Charles Bronson), que travam um duelo de viva ou morte.

Leia também: Artigo: Bangue-Bangue político opõe Cury e Emanuel versus Anderson e Felicio em S. José

'Era uma vez no Oeste', como tantos outros longas do gênero, é uma história de vingança. Não à toa, a palavra e seu significado são tão frequentes em títulos de filmes do gênero, como 'Mais forte que a vingança', 'Meu ódio será a sua herança', 'Juramento de Vingança' ou 'Balas não erram', 'Fúria abrasadora', 'Dívida de Sangue' e 'Vingança de Ulzana', entre outros.

Em São José dos Campos, no segundo capítulo desta trilogia sobre o cenário pré-eleitoral, podemos dizer que 'Era uma vez no Oeste' é, justamente, uma das histórias em cartaz nesta versão 'faroeste bolinho caipira' (sem espaguete). E ele refere-se ao fato de nós termos o duelo entre um grupo que já comandou a cidade e outro que chefia a prefeitura nos dias de hoje.

Neste segundo capítulo da trilogia, iniciada com 'Três homens em conflito', a alça de mira está no grupo encabeçado por Emanuel Fernandes (PSDB) e Eduardo Cury (PL), ex-prefeitos que governaram São José entre 1997 e 2004 e 2005 e 2012, respectivamente, que voltam à cena eleitoral joseense após uma reviravolta que transformou velhos aliados em 'inimigos políticos'.

Emanuel e Cury, no melhor estilo 'Imperdoáveis' e com um pé em 'Rastros de ódio', sentiram-se traídos em 1º de abril de 2022, quando o então prefeito Felicio Ramuth renunciou ao cargo de prefeito para ser vice na chapa de Tarcísio de Freitas (Republicanos) ao governo de São Paulo, após migrar do PSDB para o PSD, assim como o vice Anderson Farias, o atual prefeito.

Desde então, a relação de proximidade entre Emanuel, Cury e o grupo de Felicio e Anderson ruiu. Hoje, não é recomendável convidar Emanuel para tomar um café com qualquer um de seus ex-aliados. Não à toa, o ex-prefeito, mais importante figura política de São José desde a década de 1990, voltou à cena política após 10 anos e prometeu "empenho máximo" nesta campanha.

A OVALE, Emanuel se negou a dar uma nota para o governo Anderson, mas afirmou que está preocupado com os rumos que a cidade está tomando, se comprometendo a ter uma atuação ainda mais forte do que se fosse candidato. Ele é o incentivador número um da candidatura de Cury, que deixou o PSDB e migrou para o PL de Jair Bolsonaro, mas diz não ter definido se será candidato.

Emanuel, que deu início à dinastia do PSDB, que venceu seis das sete últimas eleições no município e desta vez deve indicar o vice de Cury, afirmou que já está em curso um levantamento dos 'gargalos' atuais de São José, está sendo traçado um diagnóstico. A meta é fazer, no estilo 'Era uma vez em São José', a comparação com as gestões anteriores, de Cury e Emanuel.

Neste duelo, o passado e o presente disputam o futuro. De um lado, o passado busca mostrar-se atual, conectado com o presente, podendo corrigir rotas e construir um futuro melhor. Do outro, o presente tenta mostrar-se como herdeiro de um caminho traçado desde o passado,  ao longo das últimas décadas, no entanto mais moderno, conectado com o que o município precisa.

Como trunfos, além de mandatos bem avaliados, Emanuel e Cury têm a experiência, o apoio do partido de Bolsonaro (em uma cidade com maioria conservadora, segundo as urnas), que possui também a maior fatia do Fundo Partidário e tempo significativo de televisão. Há ainda a vantagem na largada, também por conta do recall, como atestam pesquisas de opinião e trackings.

Como resposta, além da aposta em 'menos Emanuel, mais Brasília', já se ouve nos bastidores do Paço que é hora de começar a "descontruir" os dois ex-prefeitos, chutando do 'Teatro Invertido' para baixo e fazendo valer o peso de ter nas mãos uma máquina fumegante.

Trata-se, prezado leitor, também de um duelo geracional, tipo um 'santinho' versus o algoritmo.

Com mandatos bem avaliados, Emanuel e Cury governaram São José em um período, praticamente, pré-redes sociais. Há quem diga, entre os adversários, que a parte considerável do eleitorado tem uma lembrança distante do 'Era uma vez' da dupla, que aparenta ainda ter métodos analógicos de comunicação com o eleitor. É um bate-papo em praças contra as lives no Instagram.

Além de agir com o cérebro e não com o fígado, o grupo Emanuel e Cury, para fazer valer o que mostram pesquisas internas e reconquistar o Paço Municipal, precisa se conectar ao eleitor de hoje, adaptar o discurso de 1996 e 2004 ao deste novo tempo, mais rápido, direto, dinâmico e customizado. Ganha quem descobrir a senha do Wi-fi do coração e da mente do eleitor.

Até aqui, desde o lançamento do movimento "Política por Gente que Vale", o grupo não conseguiu escapar de um ambiente hermético, desconectado com o dia a dia do cidadão comum, mais interessado em debates práticos, não teóricos. A indefinição de Cury quanto à candidatura a prefeito, que pode até ser uma estratégia, dá sinais dúbios. Mas, tudo indica, estará na briga.

Porém, é preciso se lembrar: máquina de escrever não conecta com Wi-fi. Se conseguir a senha do Wi-fi do eleitor, adaptando-se à São José e ao joseense de 2024, a dupla Emanuel e Cury vai dar trabalho para o Paço.

* No próximo capítulo da trilogia, a análise sobre o desafio de Anderson Farias e notinhas sobre o cenário pré-eleitoral, incluindo os demais nomes que devem participar da disputa pelo Paço Municipal. Há espaço para outras vias? A seis meses da eleição, como mostrou reportagem de OVALE, há oito pré-candidatos. 

Comentários

2 Comentários

  • Jeferson 23/04/2024
    Há espaço para se falar em política nesse jornal, que não seja envolvendo São José e Taubaté?
  • Joel de oliveira 23/04/2024
    Com Cury na disputa o outros serão meros coadjuvante,bora S.Jose.