A popularização dos medicamentos injetáveis para emagrecimento abriu espaço para um mercado paralelo perigoso. Nos últimos meses, consumidores de diferentes estados relataram reações severas após usar supostas canetas de tirzepatida vendidas por atravessadores, clínicas improvisadas ou lojas informais. O que prometia perda de peso rápida acabou se tornando um problema de saúde real — e, muitas vezes, urgente.
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Apesar de o Brasil permitir a manipulação de tirzepatida em condições específicas, especialistas alertam que a maior parte do que circula fora das farmácias e da rede regulada não passa de falsificação. Testes laboratoriais recentes mostraram frascos com pureza entre 7% e 14%, quando o padrão exigido para o medicamento original é 99%. Em muitos casos, o princípio ativo simplesmente não existe ou aparece misturado a substâncias desconhecidas.
Reações que acendem o alerta
Os efeitos adversos relatados por vítimas ajudam a expor a dimensão do problema. Há casos de náuseas intensas, tontura, diarreia, vômitos persistentes, febre, lesões na pele e queda drástica de pressão logo após a aplicação. Alguns pacientes foram parar no hospital poucas horas depois do uso.
Segundo endocrinologistas, esses sintomas não estão ligados ao medicamento verdadeiro, mas sim à presença de impurezas, falta de esterilidade, solventes inadequados e até resíduos químicos instáveis. Substâncias proibidas, como sibutramina injetável, já foram identificadas em lotes clandestinos.
Quando a composição é totalmente irregular, o risco de infecção também cresce. Frascos multidoses compartilhados entre vários pacientes — prática comum no mercado ilegal — facilitam contaminações e aumentam a chance de reações imunológicas graves. Em condições mais severas, podem ocorrer picos de pressão, arritmias, surtos psicóticos ou infecção sistêmica.
Como esse mercado clandestino opera
Profissionais da área apontam que a estrutura desse comércio funciona em duas frentes proibidas:
- Manipulação irregular, sem ambiente estéril, rastreabilidade de insumos, controle microbiológico ou prescrição individual.
- Falsificação, quando o produto não contém tirzepatida ou inclui substâncias não declaradas.
Na prática, as condições impostas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) são sistematicamente ignoradas. Muitos dos frascos vendidos são superconcentrados, armazenados sem cadeia fria, manipulados sem controle técnico e distribuídos a diversos compradores. As embalagens raramente mostram lote, data de fabricação ou qualquer identificação confiável.
Ao contrário do medicamento original, produzido em canetas descartáveis, seladas e rastreáveis, as versões clandestinas costumam vir em ampolas genéricas, sem informações claras e muitas vezes com rótulos improvisados.
O que é permitido — e o que não é
A legislação brasileira autoriza a manipulação de tirzepatida somente quando condições rígidas são cumpridas. Entre elas:
- pureza do insumo comprovada por laudos;
- fabricação em ambiente estéril;
- prescrição individual obrigatória;
- frascos destinados a um único paciente;
- proibição de estoque e de produção seriada;
- rastreabilidade completa da origem da matéria-prima.
Descumprir qualquer dessas exigências já caracteriza irregularidade. E quando o produto é completamente adulterado, sem tirzepatida real ou com aditivos não declarados, trata-se de falsificação — crime de saúde pública.
Além das reações agudas, há um risco silencioso: quem usa um produto falsificado acredita estar em tratamento, quando na verdade continua com diabetes ou obesidade sem controle adequado. A falta de acompanhamento médico e de medicação eficaz favorece a progressão de doenças metabólicas, aumenta o risco cardiovascular e pode atrasar intervenções necessárias.
O que diz a fabricante
A Eli Lilly, responsável pelo Mounjaro, reforça que não autoriza nenhuma forma de manipulação, reenvasamento ou venda avulsa. Qualquer frasco líquido comercializado fora da apresentação oficial deve ser tratado como falsificação.
Análises internas identificaram substâncias desconhecidas, ausência total do princípio ativo e impurezas que tornam o produto imprevisível e inseguro. A fabricante ressalta que só existem canetas descartáveis produzidas industrialmente, com controle de qualidade e rastreamento.