O bispo Dom Devair Araújo da Fonseca, 58 anos, responsável pela Diocese de Piracicaba, é o entrevistado desta semana da coluna Persona, do Jornal de Piracicaba. Dom Devair completará nos próximos dias, em 16 janeiro de 2026, cinco anos à frente da Igreja Católica de Piracicaba com uma atuação intensa em nossa região.
Ordenado em 1998 como padre (27 anos), Dom Devair foi nomeado bispo auxiliar pelo Papa Francisco para a Arquidiocese de São Paulo – sua ordenação como bispo foi em 2015, portanto, há 11 anos.
Natural de Franca e com passagem pela capital paulista antes de chegar à Noiva da Colina, Dom Devair comenta, nesta entrevista, sobre os trabalhos realizados pela Igreja neste ano que se encerra e também acerca dos planos para 2026.
Ele também fala das mudanças que ocorreram no comando da Igreja, com a chegada do novo Papa, Leão XIV, mais jovem em relação ao antecessor, o Papa Francisco, e com vigor renovado para essa nova etapa.
Dom Devair comenta ainda sobre a conjuntura política em nível regional e nacional, sobre o início do governo Helinho Zanatta e também a respeito das eleições gerais de 2026, quando certamente haverá uma polarização entre os grupos de esquerda e de direita.
Para finalizar, o líder da Igreja Católica em Piracicaba e região deixa uma mensagem de otimismo para o novo ano que se inicia. Veja a entrevista na íntegra abaixo:
Quantas igrejas estão sob sua responsabilidade, quantos padres e quantas cidades – poderia, por gentileza, citar às cidades? A Diocese é formada por 15 municípios e tem um número total de padres em torno de 120, somando os religiosos e os diocesanos. Os padres diocesanos são em torno de 75 e os demais são padres religiosos. As cidades que compõem a nossa diocese: Águas de São Pedro, Capivari, Charqueada, Corumbataí, Ipeúna, Mombuca, Piracicaba, Rafard, Rio Claro, Rio das Pedras, Saltinho, Santa Bárbara d´Oeste, Santa Gertrudes, Santa Maria da Serra e São Pedro.
Dom Devair, estamos chegando ao final de 2025, gostaria de saber um balanço dos trabalhos realizados pela Diocese de Piracicaba e se preencheram as suas expectativas... Neste ano (2025), nós tivemos o ano do Jubileu. E por isso, nós fomos convocados pelo Papa Francisco, ainda no ano passado, em 2024, ter esse tema do jubileu como Jubileu da Esperança. Tivemos uma intensa programação nas igrejas jubilares, nas sete igrejas que receberam esse título. Aqui em Piracicaba, a Catedral Santo Antonio, depois a igreja Nossa Senhora Aparecida e o santuário Nossa Senhora dos Prazeres. Depois nós tivemos mais quatro igrejas também marianas. Em todas essas igrejas, nós tivemos celebrações importantes, momentos de encontro com toda a comunidade. Esse ano também eu realizei 17 visitas pastorais e, assim, durante esse ano eu completei 34 visitas pastorais somadas com as do ano passado. E o momento da visita pastoral é um momento muito importante porque ele permite ao bispo encontrar-se com a comunidade e ajudar a ver um pouco a realidade da comunidade, os trabalhos que estão sendo desenvolvidos. E assim, já realizei a visita pastoral, que é uma obrigação do bispo, em metade as paróquias da diocese. Além disso, nós tivemos acontecimentos, acontecimentos para a juventude. Tivemos um encontro em Santa Bárbara que reuniu cerca de 35 mil pessoas, que foi uma vigília de oração que aconteceu na usina ali em Santa Bárbara e que foi um movimento muito bonito. Depois, nós tivemos também outras celebrações muito importantes. Neste ano, nós tivemos a consagração a São Miguel Arcanjo, consagração da Diocese, que aconteceu em 26 de julho deste ano. Foi um momento muito importante, muito bonito de reunião da nossa Diocese. Tivemos também uma celebração que foi proposta com o encontro de todos crismandos adultos e eram em torno de 1700 pessoas, que aconteceu também em Santa Bárbara, na Casa de Maria, e foi um momento marcado por uma profunda experiência de fé. Além disso, o acompanhamento das famílias que tem sido feito e com o processo de nulidade de muitos casais que chegaram a reavivar a sua vida matrimonial e isso tem acontecido com muita frequência. E no final ano, como uma coroação deste ano, nós tivemos a ordenação de três novos padres para a Diocese: o padre Alisson, o padre Lucas e o padre Manolo, que estão direcionados para as paróquias aqui em Piracicaba.
A Igreja tem como uma de suas premissas os trabalhos sociais. Quais os mais relevantes que o senhor poderia destacar que foram feitos neste ano? A igreja tem desenvolvido os seus trabalhos sociais com muito zelo. Nós temos aqui uma unidade de acompanhamento de crianças e jovens, que é um CCI. E essa obra social é inteiramente mantida pela Diocese, que acompanha cerca de 80 crianças no contraturno (escolar) – 40 crianças de manhã e 40 crianças à tarde. É um serviço prestado à comunidade, de ajuda, de incentivo com a questão da escola e também que dá alimentação e tudo isso. Além desse trabalho, nós temos nas diversas paróquias a distribuição de cestas básicas, de remédios e de outras coisas necessárias. A Diocese tem uma parceria com o Exército de Formiguinhas, com a Débora Ferraz, e através disso muitos trabalhos são realizados. Tivemos um incêndio em uma comunidade, na qual foi possível reconstruir cinco casas, também ajudamos na questão da fiação, além das campanhas normais que são feitas na época do Inverno e também agora no final do ano, próximo do Natal, quando uma grande quantidade de cestas básicas que foi arrecadada e posteriormente foi distribuída também. Nós temos ainda um trabalho missionário na Amazônia, no Alto Solimões, que também foi possível que a gente ajudasse na construção de dois postos artesianos lá. Porque embora lá seja uma região com muita água, não é uma água potável, então as pessoas precisam de poços artesianos. Esse foi um trabalho que nós conseguimos ajudar. E agora no final do ano, os nossos seminaristas com alguns leigos e padres novos – serão cinco padres que vão acompanhar esse grupo na Amazônia, fazendo justamente esse trabalho de intercâmbio de nossos dons com aquilo que é necessário naquela região.
Para 2026, tem alguma mudança ou algum projeto que o senhor queria destacar nas igrejas católicas de Piracicaba?
Para 2026, nós tivemos a realocação de alguns padres – o padre Everton, que estava na Paróquia Santa Teresinha, que vai para a Paróquia Nossa Senhora Aparecida, em Rio Claro. O padre Rafael, que estava na Paróquia Menino Jesus de Praga, que vai para a Paróquia Espírito Santo, também em Rio Claro. O padre Alisson fica na paróquia Menino Jesus de Praga, o padre Lucas fica na Paróquia São José, aqui em Piracicaba, e o padre Manolo na Paróquia Imaculada Coração de Maria. Fora isso, foram apenas mais alguns ajustes nas questões pastorais. E os nossos projetos para 2026 é dar continuidade aos trabalhos que estão sendo desenvolvidos, Nós estamos quase no final da elaboração de nosso plano diocesano de pastoral, que deve ser concluído no primeiro semestre de 2026. E esse plano tem de refletir o momento que estamos vivendo, com muitas pessoas revivendo a sua fé. Nós estamos vivendo esse momento.
Muitos estudos analisam que a Igreja Católica Brasil tem perdido fiéis nos últimos anos. Como o senhor vê essa questão? Há realmente essa tendência? Em Piracicaba, há quantos católicos (em números e em porcentagem) e houve redução ou acréscimo no número de fiéis em nossa região nos últimos anos? Essa perda der fiéis tem de ser entendida muito bem dentro de um contexto. Os números que foram oferecidos pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apresentam uma diminuição e uma estabilização nesta perda de fiéis. Esses números têm de ser compreendidos dentro de uma realidade onde as pessoas hoje têm muito mais possibilidade de dizer a qual realidade religiosa pertence. Isso era um tabu, uma coisa muito mais fechada. Então, compreendendo desse contexto, eu acho que mais que falar em diminuição, nós precisamos ver o número de pessoas que cresce ao assumir o seu compromisso de fé. A celebração que eu disse que nós realizamos aqui com a celebração do crisma de adultos, ela reflete isso. Muito mais pessoas adultas, pessoas que estavam afastadas, retornam para a igreja, justamente tentando regularizar sua vida sacramental. Então, na Diocese de Piracicaba, que eu posso dar como testemunho, é esse crescimento, é essa redescoberta da importância da fé. Mais do que falar em diminuição ou perda de fiéis.
Esse ano foi marcado por muitas mudanças para a Igreja Católica, com a morte o Papa Francisco em abril e a chegada do novo Papa, Leão XIV, um mês depois. Como foi para o senhor tudo isso? Há muita diferença entre os papas Francisco e Leão XIV na forma como comandam a igreja? Realmente, estamos vivendo esse novo tempo na igreja. A chegada de um (Papa Leão XIV) jovem, que completou 60 anos há pouco tempo e é um papa que já tem mostrado essa nova realidade. Nós ficamos por alguns anos acompanhando algumas debilidades do Papa Francisco por conta da saúde, por conta da sua mobilidade, e nós voltamos a ver um papa que caminha junto, que entra com disposição, que está no auge das suas forças e ele tem dado esses sinais na sua acolhida, e acho nós estamos colhendo bons frutos no início desse pontificado do Papa Leão XIV.
Em 2026, o tema da CNBB é "Fraternidade e Moradia", com o objetivo de despertar a consciência sobre o direito à moradia digna como uma expressão concreta da fé cristã, focando na realidade das famílias sem lar ou em habitações precárias. Como Piracicaba poderá ser beneficiada nesta campanha? O tema da próxima Campanha da Fraternidade é (Fraternidade e Moradia) é um tem social, porém, na Diocese, como eu já disse, nós temos um trabalho social que caminha além um pouco disso. Nós não ficamos muito atrelados a temas ou a propostas quando a ação social é contínua. Nesse ano, nós já tivemos a preocupação com algumas pessoas que ficaram sem casas, com algumas pessoas que ficaram sem a sua moradia, mas também diversas campanhas que foram feitas para ajudar algumas pessoas, sobretudo no início do ano, quando temos algumas enchentes, quando algumas pessoas precisam recuperar os seus bens.
Como o senhor avalia o primeiro ano da gestão Helinho Zanatta? Foi satisfatória? Precisa melhorar em quais pontos? O primeiro ano da gestão Helinho Zanatta se enquadra dentro de restruturação. Claro que toda mudança de cargos causa um certo desajuste e é preciso colocar tudo de acordo com a filosofia de trabalho, a linha de trabalho do novo prefeito. Eu tive alguns encontros com o prefeito, então vejo um pouco essa realidade. Foi uma escolha da população, então agora acho que é também uma avaliação que cabe à população fazer. Mas penso sempre que devemos fazer isso dentro daquilo que é possível. Todos os problemas não resolvidos magicamente da noite para o dia porque não são. É preciso tempo, é preciso esforço, é preciso compreensão e é preciso participação. Apoio muito as iniciativas que tem essa participação e um governo de uma cidade grande como Piracicaba não pode ser feito simplesmente pelo Poder Público. Então, a nossa participação enquanto sociedade civil, enquanto associações, enquanto igreja, é muito importante. Naquilo que é pedido, nós temos colaborado e aquilo que nós precisamos também nós temos recebido com muito zelo, com muito carinho por parte da prefeitura e do prefeito Hélio Zanatta.
Em 2026, o ano promete de uma efervescência política por causa das eleições. Qual o conselho que o senhor daria para os candidatos e para os eleitores? Para 2026, as questões políticas vão se tornar ainda mais acirradas e nós precisamos não ficar simplesmente escolhendo com que pé a gente vai entrar no ano, mas com que mãos nós vamos apertar os botões na urna. Porque aí, também mostramos o que nós queremos, o que nós desejamos, o que nós esperamos realmente para o futuro. É muito importante que a consciência política tenha isso como base. O que nós fazemos nas urnas tem consequência direta para a nossa realidade. Não adianta ficar com propaganda, não adianta ficar com campanha disso ou daquilo, se depois a gente não leva adiante não só aquilo que nós votamos, mas também daquilo que vai acontecendo.
Para finalizar, gostaria que deixasse uma mensagem de Ano-Novo para todos os nossos leitores... Gostaria de deixar uma mensagem de esperança. Eu acho que essa palavra precisa estar muito em nós. Esperança de coisas boas, esperança de um ano renovado, mas também o nosso compromisso pessoal de assumir aquilo que é responsabilidade nossa. Esperar não é uma atitude passiva, esperar é uma atitude nos coloca a caminho, nos coloca em movimento. E esse é um elemento fundamental da fé cristã. A esperança é que nos motiva a caminhar como discípulo de Jesus Cristo.