POLÍTICA

Flávio Paradella: Vale a pena parar a cidade?

Por Flávio Paradella | Especial para a Sampi Campinas
| Tempo de leitura: 5 min
Reprodução/STMC/Gemini
A paralisação marcada pelo funcionalismo expõe conflito jurídico, político e simbólico que coloca a Prefeitura na parede — e a população no fogo cruzado.
A paralisação marcada pelo funcionalismo expõe conflito jurídico, político e simbólico que coloca a Prefeitura na parede — e a população no fogo cruzado.

Campinas caminha para encerrar 2025 sob uma tensão que ninguém planejou, mas que todos agora tentam administrar. A greve marcada para esta segunda-feira, dia 15, surge como um elemento inesperado no tabuleiro político do governo Dário Saadi — não porque o conflito seja novo, mas porque o motivo da paralisação escapa ao controle direto da Prefeitura, ainda que recaia sobre ela todo o desgaste público.

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É um daqueles impasses em que a lógica institucional não conversa com a percepção popular. O problema não foi criado pela administração municipal, não nasceu de uma decisão política do Executivo e tampouco de um corte orçamentário deliberado. Ainda assim, quem pode ser prejudicada é a população, especialmente em áreas sensíveis como a saúde, justamente num período em que a cidade costuma operar no limite.

O estopim do conflito é a suspensão do chamado 13º vale-alimentação para servidores da ativa e do auxílio-nutricional para aposentados e pensionistas. Benefícios previstos em leis municipais, aprovadas pela Câmara e sancionadas pelo próprio prefeito, mas que foram interrompidos por liminar do Tribunal de Justiça de São Paulo, a pedido da Procuradoria Geral de Justiça. A decisão entende que a parcela extra e a extensão aos inativos não atendem ao interesse público.

Do ponto de vista jurídico, o cenário é claro: não há pagamento possível enquanto a liminar estiver em vigor. Do ponto de vista sindical, porém, a leitura é outra. Para o STMC, trata-se de um “direito adquirido”, fruto de campanhas salariais e respaldado por legislação municipal. A entidade sustenta que a Prefeitura poderia — e deveria — agir de forma mais contundente para derrubar a decisão judicial.

É aqui que a tensão ganha contornos políticos. Em termos futebolísticos, como se comenta nos bastidores, o sindicato avalia que a gestão estaria fazendo “corpo-mole”. A interpretação é simples: o impasse judicial alivia o caixa do município, e isso, na visão da categoria, reduziria o empenho real do governo para resolver o problema. Uma leitura subjetiva, difícil de provar, mas poderosa no discurso.

A Prefeitura rebate. Diz que já recorreu ao TJ-SP, apresentou agravo interno, acionou o Supremo Tribunal Federal e segue aguardando uma decisão. Afirma publicamente que a suspensão dos pagamentos gera riscos sociais e econômicos, prejudica milhares de famílias e não interessa à administração. Em resumo: parece que faz o que está ao seu alcance dentro dos limites legais.

A greve, aprovada em assembleia no último dia 5, surge então como uma pressão indireta. Não para obrigar a Prefeitura a pagar — porque isso ela não pode fazer —, mas para forçar uma atuação que o sindicato considera insuficiente. É uma estratégia arriscada. Coloca o Executivo contra a parede por algo que depende, essencialmente, do Judiciário.

O próprio motivo da paralisação causa estranhamento. Uma greve motivada por uma decisão judicial provocada pelo Ministério Público não é trivial. Não se trata de reajuste negado, de negociação rompida ou de corte anunciado. Trata-se de um conflito institucional em que a Prefeitura virou parte passiva — ainda que politicamente responsabilizada.

E aqui cabe uma reflexão incômoda. O chamado 13º vale-refeição está muito distante da realidade do trabalhador comum. No setor privado, a ideia soa quase surreal. No serviço público, porém, benefícios dessa natureza se tornaram prática recorrente, incorporados ao debate como se fossem extensão natural do salário. Isso não invalida a reivindicação, mas ajuda a explicar por que parte da sociedade observa o movimento com estranhamento e com certa antipatia.

Ainda assim, nada disso diminui o potencial impacto da greve. O STMC fala em “a maior greve da história de Campinas”, envolvendo ativos, aposentados, celetistas, estatutários e temporários. A entidade também ameaça levar o caso à Organização Internacional do Trabalho (OIT), ampliando o embate para além das fronteiras locais.

No fim, o que se desenha é um conflito frágil, temerário e, em certa medida, irresponsável. Frágil, porque se apoia mais em percepção do que em fatos objetivos. Temerário, porque penaliza diretamente a população. Irresponsável, porque ignora que há limites legais que nenhum gestor pode ultrapassar sem consequências graves.

A greve coloca o governo Dário Saadi em uma posição desconfortável. E coloca Campinas diante de uma velha pergunta: quem perde quando a disputa institucional vira braço de ferro?

Quase sempre, a resposta é a mesma.

Câmara acelera e vota cargos na segunda


Divulgação/CMC

A Câmara Municipal de Campinas deu mais um passo acelerado para concluir a aprovação do projeto que cria 105 novos cargos comissionados no Legislativo. Menos de dois dias após a primeira votação, o Projeto de Lei Complementar 136/2025 já foi incluído nesta sexta na pauta da sessão de segunda-feira, que marca o encerramento das atividades legislativas de 2025.

Com isso, a proposta deve ser aprovada em segunda e definitiva votação, permitindo que a nova estrutura entre em vigor já em janeiro. Na prática, os vereadores poderão contratar os novos assessores durante o recesso parlamentar, com impacto imediato na folha de pagamento da Câmara.

O projeto foi aprovado em primeira discussão na quarta-feira (10), com 28 votos favoráveis e apenas dois contrários, em uma votação rápida e sem debate em plenário. A matéria já havia chegado assinada por 27 dos 33 vereadores, o que praticamente assegurou sua tramitação relâmpago.

O texto autoriza a criação de 99 cargos de assessor de políticas públicas, vinculados diretamente aos gabinetes parlamentares. Com isso, cada vereador passa a ter oito assessores, três a mais do que os cinco atuais. Cada novo cargo terá salário de R$ 8,5 mil.

Além da ampliação dos gabinetes, o pacote também cria seis cargos de apoio às comissões permanentes da Casa, sendo cinco funções com salário de R$ 10 mil e um cargo de subsecretário de comissões, com remuneração de R$ 32 mil.

O impacto financeiro estimado é de R$ 20 milhões por ano. Com a inclusão do projeto na pauta de segunda-feira, a tramitação será concluída em tempo recorde.

  • Flávio Paradella é jornalista, radialista e podcaster. Sua coluna é publicada no Portal Sampi Campinas aos sábados pela manhã, com atualizações às terças e quintas-feiras. E-mail para contato com o colunista: paradella@sampi.net.br.

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