Em um país que envelhece mais rápido do que forma novos profissionais de saúde, a Coreia do Sul tem apostado em uma solução inusitada: bonecas robóticas capazes de conversar, lembrar medicamentos e até identificar sinais de emergência. Os dispositivos, chamados Hyodol, deixaram de ser apenas um experimento em Seul e se tornaram parte de programas de bem-estar em diversas cidades.
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Companheiros digitais em lares solitários
O projeto começou em 2019, no distrito de Guro, e hoje ultrapassa 12 mil unidades distribuídas. Com aparência infantil e funcionamento baseado em inteligência artificial semelhante à do ChatGPT, a boneca interage com idosos em tempo real, incentiva rotinas como hora das refeições e monitora movimentos por meio de sensores internos.
Se algo anormal é detectado — como ausência prolongada de atividade — familiares ou assistentes sociais são imediatamente avisados.
Um país que envelhece sem cuidadores
A pressão demográfica impulsiona a busca por alternativas tecnológicas. A Coreia do Sul enfrenta uma das maiores taxas de envelhecimento do mundo, somada à queda acentuada na natalidade e à redução de famílias multigeracionais.
Enquanto isso, o setor de cuidados convive com um déficit crescente: 190 mil profissionais faltavam em 2023, e estimativas apontam para escassez superior a 1,5 milhão até 2032.
Nesse cenário, o custo torna a tecnologia ainda mais atraente. Cada Hyodol custa cerca de 1,6 milhão de won (aproximadamente US$ 1.150), valor bem inferior ao salário anual de um cuidador humano.
Vínculos emocionais e novos hábitos
O impacto emocional dos robôs chama atenção. Muitos idosos adotam as bonecas como parte da família, vestem-nas com roupas artesanais e participam de eventos comunitários organizados por centros de assistência social.
Cuidadores relatam que os Hyodols funcionam como "pontes afetivas": os usuários se abrem com o robô de forma mais espontânea do que com parentes ou profissionais. Em um caso relatado por equipes de atendimento, um idoso verbalizou intenção suicida para a boneca — alerta que permitiu intervenção rápida e salvou sua vida.
Especialistas, porém, destacam riscos. Dependência emocional, isolamento e confusões geradas por quadros de demência estão entre os pontos de atenção.
Privacidade, falhas técnicas e carga de trabalho
O entusiasmo convive com desafios. Pesquisadores levantam preocupações sobre coleta de dados sensíveis e transparência no uso das informações. A CEO da Hyodol, Kim Ji-hee, afirma que os registros são anonimizados, armazenados por três anos e não comercializados.
Ainda assim, assistentes sociais relatam que parte das unidades apresenta falhas e precisa de manutenção frequente, o que aumenta o fluxo de trabalho das equipes responsáveis — mesmo reduzindo a necessidade de visitas presenciais.
Expansão global e futuro do setor
O sucesso sul-coreano chamou atenção internacional. Após testes em Nova York em 2023, a empresa planeja entrar oficialmente no mercado norte-americano em 2026, com versões adaptadas para inglês, chinês e japonês.
A corrida por soluções robóticas para o envelhecimento já envolve outros países: o Japão usa o robô-foca Paro, os EUA testam o ElliQ e Singapura investe no humanoide Dexie. Pesquisas de mercado apontam que o segmento pode movimentar US$ 7,7 bilhões até 2030.
Apesar do avanço, especialistas ressaltam que a tecnologia deve complementar — e não substituir — o contato humano, evitando que idosos se tornem ainda mais isolados.