No lendário filme “E o vento levou...” a protagonista Scarlett O' Hara diz uma frase que ficou famosa: “Não consigo pensar nisso agora. Se eu pensar, fico louca.
Penso nisso amanhã.” Essa fala mostra determinação diante das adversidades, um exemplo de como enfrentar tragédias, adiando as preocupações, sobrevivendo e focando no presente.
Geralmente ficamos ruminando os problemas, sentindo as dores, tentando soluções mágicas que não existem. Mas... “amanhã há de ser outro dia”, aconselha a letra da música do Chico Buarque. “Apesar de você, amanhã será um novo dia e você vai ter que ver a manhã renascer, o céu clarear e o jardim florescer”.
Penso que o que fica das provações, se resume a uma única palavra apenas: esperança! O sentimento que resta depois de tudo aniquilado, quando não sobra pedra sobre pedra.
Senti isso ao ver os comerciantes do Mercadão inaugurando seus boxes provisórios, ainda que precários, nestes dias que antecedem o Natal. Esperança de dias melhores, de reconstrução, prova de resiliência.
Exemplos não faltam. Em Santa Catarina, primeiro aconteceu a tragédia das águas inundando as cidades e engolindo casas, pessoas, animais e destruindo o trabalho de uma vida toda.
Agora, o tornado, que varreu uma cidade inteira, deixando rastros de destruição e morte. E novamente, vejo os rostos desolados e sofridos diante dos destroços, mas ainda um tênue fio de esperança no desejo de reconstrução. E é esse restinho de esperança que os move a prosseguir, a se reerguer, a renascer das cinzas, como a célebre Fênix da mitologia grega.
Quantos já passaram por tragédias durantes as guerras insanas, tantos passaram e passam por injustiças, tantos perdem tudo, emprego, casa, familiares, mas ainda se armam desse sentimento para prosseguir.
Se nesta vida não conseguem justiça, certamente terão justiça em outras, pois a verdadeira Justiça Universal não tem falhas, é perfeita em sua precisão milimétrica.
A cada um segundo suas obras, a chamada lei da ação e da reação, da causa e efeito, o popular “aqui se faz, aqui se paga”.
E temos memória curta. A tragédia de Brumadinho se esvaiu nas brumas do esquecimento. Todos se indignaram, se apiedaram, mas passados alguns anos nem sabemos como estão os sobreviventes, desconhecemos se encontraram os restos mortais de todos que submergiram na lama, se as famílias foram devidamente indenizadas, se as águas poluídas se tornaram cristalinas novamente, se os culpados foram punidos.
Ninguém está livre de surpresas desagradáveis. Um tombo, ossos quebrados, uma batida de carro, um assalto à mão armada, uma enchente, um incêndio, um terremoto, uma bala perdida. Fazemos planos, mas os planos de Deus são outros. É certo que tudo é benéfico, até as provações, que nada mais são do que lições para nosso aprendizado.
Não esperemos viver a vida após a formatura, após o casamento, quando ficar rico, quando comprar a casa dos sonhos, quando tiver o carro do ano, quando emagrecer, quando os filhos saírem de casa, quando os netos vierem, quando puder viajar. O tempo é sorrateiro, leva a juventude, a beleza, a energia, a saúde, leva sorrisos, pessoas, paisagens, prédios são demolidos, tudo é efêmero, passageiro e breve.
Viva o hoje como se não houvesse amanhã, porque no final, pode ser que não haja amanhã...
Ivana Maria França de Negri é escritora.