Pelo menos até antes da irresistível Internet, reconhecia-se que “Vox Populi, Vox Dei”. Havia, pois, como que uma certa humildade diante do que não se sabia explicar. O povo, então, tinha voz, embora muitas vezes ignorada. Obviamente, sempre houve, também, quem tivesse a pretensão de falar em nome dele, do povo.
Misteriosamente, porém, ocorria o que se chamou “coincidências significativas”. Ou seja: as mesmas coisas aconteciam ao mesmo tempo em lugares diferentes ainda que distantes uns dos outros. Como assim, por quê?
Ora, os porquês. O genial Karl Jung entendeu: a sincronicidade. As coisas simplesmente acontecem. E independentemente da ciência, da filosofia, das vontades humanas. Estas até mesmo conseguem alterar aquilo que ocorreu. Mas o antes, o princípio existiu. No entanto, a insatisfação humana continua notável. Basta alcançar o desejado para, então, ambicionar o mais além.
Mal me lembre, foi Spinoza que considerou o desejo como “tristeza ligada à falta de algo que amamos”. Assim fosse, jamais nos aventuraríamos em algo que desconhecemos. Mas quem sabe? Pois, desejar é uma permanente – e, muitas vezes, irresistível – condição na vida humana. Quando se deseja, vai-se em busca. Se a alcança, perde-se o entusiasmo algum tempo depois. Para, então, ser assaltado por outros desejos.
O inexplicável parece estar na persistência humana em ignorar o passado. Não há negar seja, a aventura de viver, exclusiva a cada pessoa. No entanto, ignorar repetidas experiências alheias nada mais é do que adiar o encontro de soluções. Ora, obviedades há que seria tolice ignorá-las já que podem revelar impossibilidades permanentes. Que, na juventude, se busque o impossível, isso é apenas compreensível e vivificante. Lastimável será insistir na veleidade quando a vida se alonga. Pois, a sabedoria popular revela-se a cada dia, como que ao sopro do vento.
Ainda na já longínqua juventude, o saudoso João Chiarini – incansável estimulador de talentos – estimulava a moçada a considerar a chamada “filosofia da rabeira de caminhões”. E, também, os grosseiros escritos em paredes dos sanitários públicos. Para ele, lá estavam indícios das reações, do pensar e do sentir populares.
Não fosse verdadeiro, era sintomático. E servia-nos, aos jovens da época, como motivo para largas e proveitosas discussões.
Ditos populares são parte, pois, da sabedoria alcançada pelo povo a partir de vivências comuns. Uma das expressões, por exemplo, refletia realidades familiares da época: “Feliz Adão que não teve sogra”. Pois, famílias morando nas mesmas casas viviam, inevitavelmente, sob a influência das “donas das casas”. As sogras mandavam. E genros e noras não tinham lá muito a fazer, nem mesmo a opinar.
“Macaco que muito pula quer chumbo” – portanto, não se exponha tanto. “Cada macaco no seu galho” – logo, não se meta com aquilo que não entende. “Quem sai na chuva é pra se molhar”, “quem entra no fogo é pra se queimar” – conselhos muito apropriados especialmente a homens públicos que repudiam críticas. “Um dia da caça, outro do caçador” – lembrete a chefes em relação a subordinados. “Tal pai, tal filho” – advertência aos pais que teimam em arbitrariedades como “façam o que eu mando, não façam o que eu faço”.
Sabedoria, pois, não se adquire nos livros, nas faculdades, nas escolas. Sabedoria nem mesmo é cultura especializada, estudos refinados. Sabedoria é somatório de conflitantes experiências de vida: de paz e de desassossego; de alegria e de sofrimento; de conquistas e de derrotas. Enfim: de tanto apanhar, acaba-se aprendendo.
Cecílio Elias Netto é jornalista e escritor.