Não deixar o laço perto do pescoço é a ordem.
No vasto anedotário jurídico, há uma pérola que não consta dos códigos, mas todo mundo já ouviu falar: a “lei do jus esperneandis”, ou, no bom português, o direito de espernear. É aquela fase final, quando a corda já está no pescoço, figurativamente, claro, e a sentença não volta atrás. É o momento em que a pessoa não tem mais recursos, só a chance de se debater… e perder a compostura.
O direito de espernear não é lei escrita; é um consolo inventado por advogados e jornalistas para explicar o inevitável. Serve para dar um ar respeitável ao ato de reclamar quando não há mais nada a fazer. É o suspiro protocolar antes do ponto final.
Evitar chegar a esse estágio exige visão de jogo. É preciso agir antes que a maré vire contra você: negociar, rever estratégias, admitir erros, cortar perdas. Quem se deixa levar pela ilusão de que “no fim sempre dá certo” corre o risco de se ver com as mãos amarradas e a boca gritando para ninguém ouvir.
E como se sente quem tem de aplicar essa lei? O juiz, ou qualquer autoridade, cumpre o papel de carrasco sem culpa: não criou as regras, apenas executa. Não há prazer sádico, mas também não há lágrimas. O destino do esperneador é uma história que se escreve sozinha.
Para o réu da vez, escapar dessa situação exige planejamento e humildade. Ler as entrelinhas, evitar armadilhas e, principalmente, não cutucar onça com vara curta, porque, quando o direito de espernear, entra em cena, o debate já acabou e, nesse momento, para quem esperneia, talvez fosse mais prático ter nascido sem pernas.
Quanto à “tortura” simbólica que esse direito impõe, só há um antídoto: prevenção, cultivar prudência nas decisões, prever cenários alternativos e não confiar demais na própria esperteza. A arrogância é a melhor amiga do laço no pescoço.
E para que acontecimentos diferentes sejam levados adiante, é preciso abrir espaço para o diálogo antes da catástrofe. Criar canais reais de negociação, incentivar acordos e reconhecer que mudar de rota não é fraqueza, é inteligência.
Uma solução para manter o trágico-cômico da justiça, sem que ele vire tragédia pura, é institucionalizar um “tempo de reflexão humorística”: um prazo em que as partes, antes da decisão final, tenham que contar uma piada sobre o próprio caso. Pode não resolver, mas alivia o peso.
Comparando com outras “leis” não escritas, o direito de espernear lembra, no cenário internacional, as manobras comerciais de Donald Trump. Seus tarifaços funcionavam como laços no pescoço de economias alheias: primeiro o golpe econômico, depois o adversário que, sem saídas, se vê reduzido ao esperneio político.
É a aplicação geopolítica do mesmo princípio.
No fim, o poder do direito de espernear nas relações internacionais é real: países pequenos, sem recursos para contra-atacar, podem apenas protestar contra sanções ou tarifas abusivas. É a encenação global do drama individual e, como toda boa crônica, a moral é simples: não espere a corda apertar. Porque, por mais barulhento que seja o esperneio, ele raramente muda o final da história.
Walter Naime é arquiteto-urbanista e empresário.