Madalena foi uma figura folclórica de Piracicaba. Era a personificação da alegria.
Por onde passava, mexia com as pessoas, dava-lhes bom dia como se fossem amigos de longa data. Distribuía beijos e abraços.
Muito simpática, nasceu Luís Antônio Leite de Moura, em 27 de dezembro de 1956, mas era como Madalena que gostava de ser chamada. Cursou o ensino fundamental completo.
Usava turbantes coloridos, sua marca registrada, tamancos e saias longas, e parecia nunca estar triste. Seu sorriso escancarado cativava a todos.
A mãe, faxineira, a levava para ajudar no trabalho quando criança. Trabalharam numa república de estudantes chamada “Canecão”, e foram os moradores que escolheram chamá-la de “Madalena”. Gostou tanto do nome que o adotou e ficou. Tinha quinze anos na época.
Alta e magra, 1,80 m de altura, não aprovava ser chamada de travesti, gay, homossexual, não queria ter rótulo nenhum, era só Madalena e pronto! Dizia que tanto fazia a maneira como a denominavam, olhava-se no espelho e via um homem de muita coragem!
Ganhava a vida trabalhando como cozinheira e faxineira. E era muito boa em tudo o que fazia. Seus quitutes agradavam e ela caprichava nos pratos.
Gostava de ajudar as pessoas e foi líder comunitária por quase trinta anos no bairro onde morava. Por ser alegre e desinibida, amava o Carnaval e participava dos desfiles distribuindo sorrisos, todos os anos, compartilhando sua euforia. Participava da Banda do Bule vestida de baiana e era sempre esperada como a principal atração!
Por ser de cor preta e pobre, enfrentou muito preconceito, até morou nas ruas. Lutou contra um câncer, mas superou tudo. Nunca desistiu! E ninguém a via triste e chorosa, sempre esbanjando simpatia, e nada apagava sua alegria de viver.
Um dia resolveu se candidatar a vereadora. Mesmo sem dinheiro para a campanha, foi uma das mais votadas! Teve 3035 votos, o segundo com maior desempenho.
No dia da posse falou: “vou usar terno e gravata na posse e também quando precisar, nas reuniões. Mas vou continuar a ser a Madalena de sempre, com meus turbantes estampados, pois foi a Madalena que o povo elegeu.” Mas não quis ser reeleita nas eleições seguintes. A decisão foi enviada por meio de carta à presidência do Partido. Alegava motivos de saúde e também agressões racistas e homofóbicas sofridas nas redes sociais durante seu mandato.
Madalena teve um fim trágico, que comoveu toda a cidade. Foi assassinada brutalmente, aos 64 anos, em sua própria casa. Foi em abril de 2021. O motivo seria uma disputa pela liderança comunitária do bairro. Mas deixou na memória dos piracicabanos a lembrança de sua alegria de viver, sua simpatia, bondade, e seu sorriso contagiante.
Um ícone que será lembrado nos anais da História de Piracicaba. Foi o primeiro transexual, de origem humilde, que chegou ao Poder Legislativo.
Sua trajetória não deve ser apagada, e sim perpetuar-se como exemplo de resiliência e superação.
Ivana Maria França de Negri é escritora.