Outro dia estava esperando uma aluna chegar para uma aula no parque da rua do porto e sentou ao meu lado o senhor Gilberto, que me reconheceu e disse ser leitor assíduo de minhas colunas e do gigante Cecilio. Ele contou que começou a caminhar por ordem do médico, pois havia recebido o diagnóstico de diabetes e estava perdendo a luta pela saúde de seu corpo por causa do açúcar que consumia das mais variadas formas. Mas que aos poucos isso foi mudando, e ele passou a se interessar em como poderia envelhecer de forma mais saudável.
Sabemos que o cérebro humano depende da glicose como principal fonte de energia. É como se fosse o combustível que mantém acesas as luzes de uma grande cidade. Porém, quando esse combustível chega em excesso e de forma contínua, deixa de ser aliado e começa a desgastar as estruturas mais delicadas. O açúcar em demasia provoca inflamação, dificulta a ação da insulina no sistema nervoso central e acelera processos ligados à perda de memória, tornando o cérebro mais vulnerável ao envelhecimento precoce.
Esse efeito acontece porque a glicose e a frutose em excesso participam da chamada glicação, um processo que forma compostos chamados produtos de glicação avançada. Eles funcionam como uma espécie de “ferrugem doce”, que se deposita em proteínas e lipídios do cérebro, modificando suas funções. Outro ponto importante é a resistência à insulina cerebral. Pouca gente sabe, mas a insulina não serve apenas para controlar o açúcar no sangue. Dentro do cérebro, ela também ajuda os neurônios a conversarem melhor, especialmente em regiões críticas para a memória, como o hipocampo. Quando há excesso crônico de açúcar, os receptores de insulina se tornam menos responsivos. É como se a música perdesse o volume: os neurônios passam a se comunicar mal, e a plasticidade sináptica diminui. Esse cenário contribui para quadros de declínio cognitivo e se soma às inflamações naturais do envelhecer.
Estudos mostram que até a frutose, muito presente em alimentos ultraprocessados e bebidas adoçadas, pode acentuar o problema. Ela induz o cérebro a entrar em um “modo forrageio”, priorizando rotas de busca de energia, mas sacrificando processos de memória e aprendizado. Além disso, favorece depósitos de proteína amiloide, conhecidos por sua ligação com a doença de Alzheimer.
As evidências científicas reforçam esses riscos e demonstrou que o consumo frequente de bebidas açucaradas, incluindo sucos aparentemente inofensivos, esteve associado à redução do volume cerebral total, a um hipocampo menor e a pior desempenho de memória — sinais claros de envelhecimento cerebral precoce. Já uma revisão no Journal of Alzheimer’s Disease intitulada “Potential role of sugar (fructose) in the epidemic of dementia” explicou em detalhes como o excesso de frutose pode desencadear mecanismos bioquímicos ligados à inflamação, à resistência à insulina e à deposição de amiloide, abrindo caminho para a demência.
A boa notícia é que o processo pode ser freado. A redução do açúcar líquido é o primeiro passo: refrigerantes, energéticos e sucos industrializados devem dar lugar à água, chás e cafés sem adição de açúcar. Uma alimentação baseada em comida de verdade como frutas inteiras, vegetais, leguminosas e proteínas ajuda a evitar picos glicêmicos nocivos. A prática regular de atividade física também é uma das ferramentas mais poderosas, pois melhora a sensibilidade à insulina em todo o organismo, inclusive no cérebro. E, por fim, o acompanhamento periódico de exames como glicemia e hemoglobina glicada permite identificar precocemente alterações que poderiam passar despercebidas.
Falar dos males do açúcar não é demonizar o doce, mas entender que cada colher a mais pode ser uma pequena rachadura no edifício da mente. Seu cérebro pode envelhecer devagar, com lucidez e memória preservada, se você escolher hoje menos açúcar e mais movimento. Podemos mudar isso agora. Comece como o senhor Gilberto. Até a próxima!
Rogério Cardoso é personal trainer e preparador físico, membro da Sociedade Brasileira de Personal Trainer SBPT e da World Top Trainers WTTC.