PROFESSORA BEBEL

‘É um erro crasso associar civismo e militarismo’, diz Bebel

Por Roberto Gardinalli | roberto.gardinalli@jpjornal.com.br
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Divulgação
Em entrevista ao JP, deputada estadual falou sobre impactos das escolas cívico-militares e comentou desistência do governo estadual na instalação de pedágios
Em entrevista ao JP, deputada estadual falou sobre impactos das escolas cívico-militares e comentou desistência do governo estadual na instalação de pedágios

Deputada estadual por Piracicaba e segunda presidente da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo), Professora Bebel (PT) esteve à frente de assuntos considerados relevantes nas últimas semanas. Como dirigente do sindicato, o maior da América Latina, Bebel segue com pressões para que governo estadual atenda às reivindicações dos profissionais da educação. Entre elas, o reajuste salarial relativo ao piso nacional e um plano de recuperação do poder de compra.

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Ainda no campo da educação, Bebel se posiciona contra o modelo das escolas cívico-militares. Em Piracicaba, duas instituições de ensino se classificaram para a terceira fase de discussões para a implementação do projeto. Para Bebel, “Escolas cívico-militares são, na verdade, a militarização da educação, o que é um verdadeiro crime contra o direito dos estudantes a uma formação básica sólida, de qualidade”.

A deputada também assumiu um papel de liderança durante a polêmica da instalação dos pedágios na rodovia SP-304, a Luiz de Queiroz, entre Americana e Piracicaba. A estrada, uma das mais importantes da região, foi colocada em um projeto de privatização do governo do estado. O projeto previa a instalação de três pedágios na região, nas cidades de Americana, Santa Bárbara d’Oeste e Piracicaba. Além desses, outros dois pedágios estavam previstos para a Estrada Velha de Tupi. Após pressões na região e realizações de reuniões nas cidades que seriam afetadas que tiveram a participação de Bebel, o governador Tarcísio de Freitas voltou atrás. “Isso foi uma vitória da nossa luta, porque o governador assim se pronunciou após a denúncia que fizemos, a audiência pública que realizamos em Americana, o abaixo-assinado que veiculamos, a frente parlamentar que criamos, a mobilização da sociedade que se mostrou totalmente contrária à colocação de cinco novas praças de pedágios na nossa região”, disse a deputada. Confira a entrevista completa de Professora Bebel ao JP.

A Apeoesp pediu a adesão de professores da rede estadual em uma assembleia que discutiu o início de uma greve da categoria. Gostaria que você explicasse as principais reivindicações da categoria.

Temos uma longa lista de reivindicações não atendidas. No momento, estamos centrando em reajuste imediato de 6,27%, relativo ao piso nacional, plano de recuperação do poder de compra de nossos salários, atribuição de aulas presencial, justa e transparente, fora das férias dos professores, convocação de 44 mil professores concursados, revisão das regras do estágio probatório, climatização das escolas, direito dos professores se alimentarem nas escolas, regras justas para a recondução dos professores, enfim, a valorização do magistério e uma escola pública de qualidade para todos.

Um dos pontos que a Apeoesp tem divulgado é a questão da climatização das salas de aula em tempos de mudanças climáticas. Segundo um levantamento feito pelo seu mandato, cerca de 2% das salas de aula da rede estadual paulista possuem ar-condicionado. Nas tratativas que a Apeoesp tem feito com o governo, qual é o parecer que eles têm dado a respeito desse assunto?

Com a nossa pressão, estamos forçando o governo a climatizar escolas. Agora, o governo alega que já climatizou 912 escolas. Isso é resultado da nossa luta, pois levantamos a questão. Mas ainda é pouco diante de uma rede com 5 mil escolas. Continuamos na luta.

O seu mandato tem enviado emendas parlamentares para a melhoria de escolas estaduais de Piracicaba. As mais recentes foram na Etec Fernando Febeliano, para a compra de ares-condicionados, e também para melhorias nas Escolas Estaduais Augusto Saes, Mirandolina de Almeida Canto e Barão do Rio Branco. Gostaria que você comentasse a importância desses repasses para o dia a dia dos alunos e dos trabalhadores da escola. Como eles influenciam no desenvolvimento de cada pessoa?

Destino recursos por meio de emendas do mandato popular que exerço na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo para escolas, hospitais, custeio da saúde, obras de infraestrutura e outras finalidades, assim como articulo com deputados federais do meu partido para ajudar as mais diversas entidades de Piracicaba. Mas fico muito satisfeita de poder contribuir para melhorar as escolas, pois a educação é, a meu ver, a principal política pública. Até agora, já destinei quase R$ 4 milhões em emendas parlamentares para reformas e aquisição de equipamentos para escolas de nossa cidade. Creio que essas melhorias proporcionam não somente bem-estar para professores, estudantes e funcionários, mas ajudam a melhorar a qualidade do ensino.

Ainda falando sobre a educação, recentemente o Cursinho Popular Paulo Freire iniciou as atividades do ano letivo de 2025. Como tem sido a recepção dos alunos e voluntários do cursinho? Pode-se dizer que esse cursinho é uma ferramenta de desenvolvimento da educação piracicabana?

Sem dúvida, o Cursinho Popular Paulo Freire é um instrumento de desenvolvimento da educação no nosso município e região, como também um espaço de inclusão e justiça social. Recentemente vinte estudantes conquistaram com destaque vagas em universidades públicas, com ótimas notas no ENEM. Sinto-me também orgulhosa dessa iniciativa, que pode ter contribuído para que o MEC tenha criado a Rede Nacional de Cursinhos Populares. Neste ano, inclusive, o cursinho popular, que tem aulas com professores que não recebem qualquer tipo de remuneração, mas fazem isso por amor aos nossos jovens, conta com cerca de 400 alunos inscritos, certamente, pelo bom resultado que tem alcançado e também pela falta de um cursinho popular na cidade, uma vez que a Prefeitura de Piracicaba desativou o que havia.

Piracicaba teve duas escolas aprovadas na segunda audiência pública para se tornarem escolas cívico-militares: a Prof. Elias de Mello Ayres e Prof. Abigail de Azevedo Grillo. Qual é a sua opinião sobre esse processo? Na sua visão como educadora, como as escolas cívico-militares impactam o aprendizado e o processo educacional?

Escolas cívico-militares são, na verdade, a militarização da educação, o que é um verdadeiro crime contra o direito dos estudantes a uma formação básica sólida, de qualidade. É um erro crasso associar civismo e militarismo. Civismo é qualidade de todos os cidadãos e cidadãs e não privilégio de policiais, que o governo quer colocar dentro das escolas, recebendo mais do que professores para impor aos estudantes uma disciplina autoritária de quartel.

Não existirá ensino de qualidade em ambiente repressivo, no qual professores e estudantes tenham receio de ensinar e aprender livremente, como deve ser. Temos que investir na escola pública, para que seja mais atrativa, assim como nos seus profissionais, isso, sim, garantirá uma escola pública cada vez mais de qualidade.

Seu mandato encabeçou um movimento na região para impedir a instalação de pedágios na SP-304, a Rodovia Luís de Queiroz, entre Americana e Piracicaba. Após pressão da sociedade e de autoridades, o governador voltou atrás na privatização do trecho. Nos bastidores, ainda há pressões para manter essa ‘desistência’ do governo? Ou ainda há chances de que o trecho seja mesmo privatizado?

Quero crer que o governador do Estado de São Paulo não tenha duas palavras. Ele afirmou de viva voz aqui em Piracicaba que não haverá pedágios na SP-304. Isso foi uma vitória da nossa luta, porque o governador assim se pronunciou após a denúncia que fizemos, a audiência pública que realizamos em Americana, o abaixo-assinado que veiculamos, a frente parlamentar que criamos, a mobilização da sociedade que se mostrou totalmente contrária à colocação de cinco novas praças de pedágios na nossa região. Enfim, conseguimos forçar o governador a rever a sua posição, depois de dizer na região, em duas situações, uma em Campinas, no dia 21 de março e depois em Americana, no dia 24 também de março, que a SP-304 seria, sim, concedida à iniciativa privada.

Por fim, você citou em uma fala na tribuna da Alesp que Piracicaba deve ser referência estadual na defesa do Rio Piracicaba. Gostaria que comentasse um pouco sobre as suas propostas para a defesa do rio e da natureza em Piracicaba, e como você, na Alesp, pode auxiliar nesse processo.

O Rio Piracicaba é vida, é a base da nossa cidade de Piracicaba. Sem o nosso Rio, Piracicaba não prospera, não terá vidas futuras. Justamente, em função disso, tenho defendido um pacto em defesa do Rio Piracicaba, envolvendo todos os segmentos da sociedade de forma suprapartidária.
Temos que debater a situação do Rio Piracicaba e propor novas iniciativas, a fim de recuperá-lo e protegê-lo, para que não seja mais alvo de ações criminosas, como o  provocado pela Usina São José, de Rio das Pedras, que resultou na mortandade de mais de 70 toneladas de peixes, prejudicando a todos, inclusive as famílias de pescadores do bairro Tanquã que vivem da pesca, assim como o meio ambiente, assim como temos que ampliar e coletar todo esgoto do nosso município.

Esse pacto municipal, sem dúvida, seria uma referência para todo Estado de São Paulo, que deve somar esforços com as Prefeituras e o governo federal a fim de estabelecer metas, inclusive a curto espaço de tempo, para coletar e tratar todo esgoto que são despejados nos rios.  Além disso, criar mecanismos para recuperar as matas ciliares, os afluentes e as nascentes, que estão soterradas por pastagens e o cultivo agrícola, principalmente pela cana-de-açúcar. A agricultura é fundamental, mas precisa ser realizada de forma responsável, respeitando o meio ambiente. Temos que respeitar a natureza, o nosso maior bem, e a recuperação e a preservação dos rios são fundamentais para o futuro da humanidade e essa luta continuarei fazendo na Assembleia Legislativa, chamando a atenção e cobrando o governo estadual para que também se engaje nesta luta.

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