Ao ser informado pela reportagem do Jornal de Piracicaba de que seria fotografado, o estudante João Pedro Nunes, de 13 anos, exibiu imediatamente um sorriso largo e fez um gesto com as mãos, formando o número dois – o símbolo da vitória. Embora não tenha consciência disso, o gesto representa a luta constante que ele enfrenta, repleta de desafios e superações. João foi diagnosticado com síndrome de Down aos três meses de idade e, aos seis anos, com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
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Para a mãe dele, a empresária Aline Nunes, ser mãe de uma criança com deficiência é uma jornada de aprendizado e desafios. Além das demandas diárias, é necessário equilibrar as terapias, duas vezes na semana, e a atenção extra que ele precisa. “Quando ele recebeu o diagnóstico do autismo, foi um alívio, pois muitas atitudes dele eu não entendia. Crianças autistas recebem mais apoio, especialmente no tratamento, do que crianças com síndrome de Down”, explica Aline. João é comunicativo, mas depende das pessoas com quem se relaciona para formar vínculos, explica sua mãe. Por isso, ela ficou preocupada com uma resolução da escola que permitiria a realocação de professores sem pedidos formalizados. A decisão foi suspensa pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), em dezembro. “A criança com autismo se apega ao professor e, com essa possível mudança, o novo professor precisaria de pelo menos seis meses para conquistar novamente a confiança do aluno”, afirma Aline. O apoio da família tem sido essencial. Wilson, marido de Aline e padrasto de João Pedro, é um pilar fundamental, oferecendo suporte emocional e físico para garantir a melhor qualidade de vida para o garoto. “O Wilson ouviu comentários contrários ao nosso relacionamento devido à situação de João, mas ele vestiu a camisa. Amar alguém que vai ser criado no seu núcleo, mas que não é do seu sangue, e tratá-lo como filho, é uma bênção. Não são todos os homens que fazem isso”, afirma Aline, emocionada. Ela também destaca a presença constante do pai de João e da madrasta na vida do filho.
A história de Aline é um exemplo de coragem e resiliência. Engajada nas redes sociais, ela acredita que sua experiência pode inspirar outras mães atípicas. “Compartilho minha experiência para mostrar que é possível ser uma mãe que trabalha e cuida do filho. Mas a rede de apoio para mães atípicas, infelizmente, ainda deixa de ser tão forte”, reflete Aline, com um sorriso de esperança. “Eles vivem o nosso mundo e nós também precisamos viver o mundo deles”, diz.
O autismo é um espectro que afeta a comunicação, a interação social e pode causar comportamentos repetitivos, variando de criança para criança. Segundo a neuropediatra Deborah Kerches, especialista em Transtorno do Espectro Autista (TEA), alguns sinais precoces que os pais podem perceber incluem falta de contato visual, como não olhar para a mãe ao mamar; pouca ou nenhuma resposta ao ser chamado pelo nome após 12 meses; dificuldade em expressar emoções, como não sorrir em resposta a um sorriso; e pouca iniciativa para brincar com outras crianças. “Vale lembrar que nem todas as crianças autistas apresentam atraso na fala. Algumas falam dentro do esperado para a idade, mas têm dificuldades em iniciar ou manter um diálogo, usam palavras fora de contexto ou possuem padrões de fala atípicos”, explica.
Diagnóstico precoce: especialista explica como identificar o TEA
O diagnóstico do TEA é clínico, feito por meio da observação do comportamento e desenvolvimento da criança, com base nos critérios estabelecidos pela Associação Americana de Psiquiatria e pela Organização Mundial da Saúde. “Ainda não há exames laboratoriais ou marcadores biológicos que possam confirmar o diagnóstico. No entanto, algumas escalas padronizadas podem auxiliar na triagem e na avaliação do risco de TEA, especialmente na infância, mas vale ressaltar que são apenas escalas de rastreio e não diagnósticas e dificilmente são sensíveis quando estamos diante do espectro nível 1 de suporte”, enaltece a especialista. Ela destaca que além de um acompanhamento multiprofissional, que pode incluir médicos, psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e outros, de acordo com as necessidades individuais, o envolvimento dos pais é essencial para aplicar as habilidades aprendidas no dia a dia e orientar a equipe sobre ajustes.
Projeto social amplia informações sobre TEA
O Projeto Samuel Autismo surgiu, em 2022, da experiência pessoal de Adriano e Fernanda Turini, membros de uma igreja evangélica de Piracicaba, após o diagnóstico de autismo do filho. Durante pesquisas e conversas com outros pais, o casal percebeu as dificuldades enfrentadas pelas famílias, principalmente no acesso a informações e tratamentos no SUS local.
A ação tem o propósito apoiar essas famílias, promover a conscientização sobre o autismo e melhorar o atendimento e recursos disponíveis no município, oferecendo atendimentos psicológico, neurológico, psiquiátrico, nutricionais, além de esportes e atividades motoras.
Entre agosto de 2023 e dezembro de 2024, por exemplo, o projeto atendeu mais de 400 crianças, com um total de mais de 2.500 atendimentos gratuitos para a comunidade carente. Além disso, mais de 2.000 pessoas participaram de treinamentos e palestras organizadas pela iniciativa. “Autismo é uma condição, e como toda condição pode evoluir ou regredir. É necessário que a sociedade tome conhecimento das necessidades e dificuldades existentes no dia a dia de uma criança, um jovem ou um adulto autista, bem como as dificuldades que cercam suas famílias. Somente assim é possível inserir este público na sociedade de uma forma mais inclusiva.”, destaca Adriano Turini. “Cada passo dado é uma vitória, não só para mim ou para o Samuel, mas para todas as famílias e educadores que enfrentam essa jornada”, diz. Saiba mais: projetosamuelautismo.com.br