
O mercado de café no Brasil enfrenta um novo desafio: a venda de produtos com “sabor café”, mas que não contêm o grão tradicional. O aumento dos preços do café genuíno, influenciado pela alta nas cotações globais e pela escassez de safra, tem gerado uma tendência crescente de comercialização de produtos alternativos, conhecidos como “cafake”. A Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic) alerta que esses produtos são uma tentativa clara de enganar os consumidores e burlar a legislação.
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Recentemente, a Abic identificou a venda de produtos denominados “bebida sabor café”, que são produzidos a partir de cascas, palhas, folhas e outras partes da planta do café, exceto os grãos. A prática foi detectada, entre outros lugares, em Bauru, no interior de São Paulo. Um exemplo é o produto “Oficial do Brasil”, que traz em sua embalagem os dizeres "bebida sabor café tradicional". Embora a embalagem afirme que se trata de uma bebida e não de café puro, a similaridade com a embalagem de café tradicional e o preço mais baixo aumentam o risco de o consumidor ser enganado.
O café arábica, cujos preços bateram recordes históricos no mercado global, atingindo 3,8105 dólares por libra-peso, tem influenciado a elevação dos custos no Brasil, o maior produtor de café do mundo. Para Celírio Inácio da Silva, diretor-executivo da Abic, os preços elevados do café genuíno têm impulsionado a venda desses produtos “fakes”. “Quando o preço do café aumenta, isso abre espaço para a comercialização de produtos alternativos, que podem enganar os consumidores", afirmou ele.
A fabricante do produto “Oficial do Brasil”, a Master Blends, com sede em Salto de Pirapora (SP), se defende, alegando que criou um “subproduto” à base de café e polpa de café torrado e moído, e que isso está claramente indicado na embalagem. A empresa afirma que não aceita que a acusação de enganar o consumidor seja feita contra ela, e compara sua atuação com práticas similares adotadas por outras grandes indústrias de alimentos, como no caso do leite condensado, que passou a ser denominado “mistura láctea”, ou bombons com cobertura sabor chocolate.
A Abic, no entanto, não está convencida de que esses produtos sejam inofensivos. Além da questão mercadológica, a associação levanta preocupações com a saúde do consumidor. A entidade já denunciou o caso ao Ministério da Agricultura e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pois a comercialização de produtos que não passam pela avaliação adequada de segurança alimentar pode representar riscos à saúde pública.
Silva destacou que para a comercialização de produtos alimentícios é essencial ter a autorização da Anvisa, e afirmou que a Abic já alertou o setor supermercadista sobre os riscos do “cafake”. A Master Blends, por outro lado, afirmou ter a autorização necessária para a venda do seu produto e que não precisa da aprovação do Ministério da Agricultura, uma vez que não é um produto derivado de grãos, mas sim de um subproduto do café.
No mercado, o preço do "cafake" também é uma preocupação. De acordo com a coluna “Café na Prensa”, do jornal Folha de S.Paulo, meio quilo do produto “sabor café” tem sido vendido por cerca de R$ 13,99, um valor muito inferior ao preço do café tradicional, que está em torno de R$ 30,00 o meio quilo. Essa diferença de preço tem atraído consumidores que, diante da alta do café puro, optam por alternativas mais baratas.
A Abic, que no passado já implementou iniciativas como o selo de pureza para garantir a qualidade do café vendido no Brasil, alerta para o impacto desses produtos “fakes” na percepção do consumidor sobre o café verdadeiro. O risco, segundo a associação, é que ao consumir essas bebidas alternativas, as pessoas possam passar a associar o café com um sabor inferior, prejudicando o consumo do café genuíno. “Se não combatemos isso, as pessoas vão começar a beber esses produtos e dizer que não gostam de café. Isso pode diminuir o consumo de café verdadeiro", afirmou Silva.
Essa tendência também está em desacordo com os esforços da Abic de manter a imagem do café brasileiro como sinônimo de qualidade e sabor autêntico. A associação teme que o aumento de produtos “fakes” possa afetar a reputação do café nacional, comprometendo a percepção dos consumidores sobre o que é realmente o café de qualidade.