Em relação a nossos anseios e preocupações, se reconhecemos os ensinamentos de Jesus registrados nos evangelhos, vale a pena refletirmos acerca de sua recomendação: “Não vos inquieteis por vossa vida, com o que comereis; nem por vosso corpo, com o que vestireis”….“Buscai em primeiro lugar o reino de Deus e sua justiça, e todas essas coisas vos serão dadas de acréscimo”. Com essas palavras, o Mestre recomendou-nos procurar o essencial à realização espiritual e garantiu que, assim procedendo, todas as necessidades nos seriam supridas.
Se levássemos a sério essas orientações e as seguíssemos, não segundo convenções humanas mas de acordo com critérios do próprio Mestre, nossa vida seria completamente diversa de como a temos vivido, pois muitos dos nossos atos desmentem nossa confissão de fé. Na maioria das vezes corremos avidamente atrás do que é secundário e superficial, negligenciando o essencial à nossa vida. Sempre prontos para as conquistas materiais, geralmente opomos resistência àquilo que nos purifica, ilumina e liberta. Buscamos destaque social, vantagens financeiras, títulos acadêmicos e poderes mundanos, enquanto nossa realidade essencial permanece negligenciada, até que, diante de inevitáveis sofrimentos, finalmente procuramos socorro espiritual.
Dentre várias interpretações possíveis, buscar o reino de Deus pode ser compreendido como o processo através do qual, após a remoção das sucessivas camadas do ego, é descoberta e revelada a dimensão espiritual que constitui a essência de todo ser. Os indivíduos que alcançaram esse nível se transformaram por completo, mudando condutas, valores e prioridades, passando a agir segundo critérios superiores, sempre em benefício dos demais seres.
Segundo tal perspectiva, nossas prioridades nos definem perante a vida tanto quanto nossas aspirações revelam nosso mundo interior. Em uma sociedade materialista e egocêntrica, estamos saturados de aparências e carentes de essência, repletos de (pre)conceitos e pobres de amor, cheios de ostentações que nos encobrem o vazio interior. Se nos autodenominamos religiosos, particularmente cristãos, podemos verificar se realmente o somos mediante um sincero exame de consciência. Buscamos em primeiro lugar as coisas do espírito e o cumprimento da vontade divina? Procuramos nos tornar instrumentos da sabedoria e do amor em benefício do próximo, seja ele quem for? Servimo-nos dos recursos de que dispomos como ferramentas de promoção do bem comum? Parece-nos que a resposta a essas perguntas define se somos discípulos do Mestre ou se, após dois mil anos, preferimos repetir a hipocrisia farisaica apontada por ele.
Os textos religiosos das mais diversas tradições recomendam que se dê atenção prioritária àquilo que concerne ao espírito, lembrando-nos que somos consciências em breve passagem pela dimensão física, condição a ser aproveitada como oportunidade de realização interior. De acordo com leis que nos regem a vida e o destino, se cumprirmos os propósitos superiores para os quais estamos neste mundo, teremos todas as necessidades supridas, inclusive as de natureza material – o que não significa, obviamente, a satisfação de desejos, caprichos e ambições egocêntricos.
Seguir a referida recomendação de Jesus acerca das prioridades da vida é, pois, um convite à rendição que se deixa transformar, ao exercício e à manifestação da fé e da entrega aos desígnios superiores que proveem tudo aquilo de que necessitamos para alcançarmos a plenitude existencial.