ARTIGO

Já vivemos sem iluminação


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Edson Rontani Júnior é jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba

As tempestades dos últimos dias provocaram uma reviravolta na vida de muitas pessoas. Na capital paulista, cerca de 100 mil lares ficaram sem energia elétrica e, com isso, perderam mantimentos conservados sob refrigeração. Banho ? Só se for gelado. Nem energia para carregar o celular as pessoas tiveram acesso. Distrair como ? Sem celular, sem televisão, sem internet, sem luz.. Muito se falou sobre a poda preventiva de árvores, a privatização do fornecimento de energia elétrica, a culpa política da situação.
Mas como fazíamos no passado ? Explicam curiosos locais como Leandro Guerrini, Samuel Pfromm Neto e Maria Celestina Teixeira Mendes Torres com suas publicações sobre a história de Piracicaba. Antes da luz, fez-se o fogo. Não é a toa que ainda usamos expressões como “segurando vela” ou os mais antigos citavam que ao ir no supermercado deveriam comprar uma lâmpada de 40 velas, em parâmetros para o posterior watts quando surgiu a energia elétrica. 
Em fevereiro de 1873, a Câmara de Piracicaba envia solicitação ao Governo Provincial solicitando 50 lampiões de querosene para instalação na cidade. São Paulo na ocasião havia trocado os postes de querosene por iluminação a gás. Assim, os postes anteriores seriam inservíveis, interessando à edilidade piracicabana que custearia o transporte da capital para cá.
Deve ter passado despercebido por grande maioria, mas meu papel aqui é lembrar alguns destes fatos, dentre eles o de termos comemorado neste 2024 os 150 anos da iluminação pública na “Noiva da Colina”. Sim ! Foi no dia 14 de fevereiro de 1874 que a cidade ganhou postes como iluminação à querosene. Claro que a iluminação não era aquela maravilha e nem dava tanta claridade, mas o piracicabano de então tinha segurança em voltar para casa, retornar de uma visita ou buscar algo na farmácia ou no comércio se é que funcionavam à noite. Lembremos que daí vem outra expressão “dormir e acordar com as galinhas”, sendo que estas se põem a dormir com o escurecer ou levantam piando com o raiar do dia. A iluminação pública era como o lampião de querosene utilizado nas residências. Tinha uma quantidade do líquido e um pavio de tecido. Leandro Guerrini, por sua vez, cita o “Almanak de Piracicaba para 1900”, dizendo que o cessionário da iluminação pública local foi m tal de Manuel Ernesto da Conceição. 
Guerrini lembra que os postes ficavam nas esquinas. O querosene em cada poste tinha uma determinada medida que garantia a iluminação até as 22 horas. Lampiões similares ficavam no interior das residências e estabelecimentos que serviam gastronomia aos comensais. À escuridão, sem Netflix, celular ou qualquer outro entretenimento, os olhos cerravam mais rápido atraindo o sono e jogado nossos ilustres cidadãos aos braços de Morfeu. E tenha uma boa noite ! 
Mas, - pergunta o curioso leitor- e o gelo, o sorvete, a carne congelada ? Vamos com calma. A refrigeração veio décadas depois. Carne durava se colocada em imersão de sal, igual ao bacalhau que conhecemos. 
Algumas semanas – acho que foram várias semanas – escrevemos aqui sobre a iniciativa de Luiz de Queiroz em assumir a iluminação local através da energia elétrica, alcançada com geradores movidos pela água do rio Piracicaba em sua fábrica de tecidos, hoje lembrada como Boyes. Pouco conhecido é que o caminho pioneiro de Queiroz foi assumido em 1903 por Antônio Augusto de Barros Penteado através da Ignarra Penteado & Cia. Este veio com ares modernos, reformando a empresa, capacitando funcionários e levando não apenas luz às residências, mas também energia elétrica para o que quer que Piracicaba tivesse na época, podendo ser geladeira ou algum aparelho audiovisual, se é que existiam. Sem televisão, internet, games, as pessoas buscavam mais a sociabilidade seja para almoçar na residência de familiares ou amigos ou mesmo para “tricotar” sobre a vida alheia. Aí, fez-se a luz. O mundo nunca foi igual como antes...

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