IRREVERSÍVEL

O que se sabe: transplantados recebem órgãos infectados com HIV

Por Ana Laura França | ana.laura@jpjornal.com.br |
| Tempo de leitura: 3 min
iStock

Seis pacientes transplantados no Rio de Janeiro receberam órgãos infectados pelo vírus HIV, um caso sem precedentes no SUS (Sistema Único de Saúde). O incidente, que chocou a comunidade médica, foi revelado naa sexta-feira (11) pela BandNews FM e já está sendo investigado pela Polícia Federal, conforme anunciado pelo Ministério da Justiça. Os órgãos infectados vieram de dois doadores, e os pacientes estavam na fila de transplante da SES-RJ (Secretaria Estadual de Saúde), que confirmou a contaminação.

O foco inicial das investigações recai sobre o laboratório privado PCS Lab Saleme, que emitiu os laudos que declaravam os órgãos aptos para doação. Contratado pela Fundação Saúde do Rio de Janeiro, o laboratório é responsável por realizar os exames sorológicos que garantem a viabilidade de transplantes no estado. Após o caso vir à tona, o laboratório teve suas atividades suspensas e foi interditado cautelarmente.

O laboratório, que assinou três contratos com o governo do estado, acumulando um total de R$ 17,5 milhões, está sob suspeita de irregularidades. Dois desses contratos foram firmados de forma emergencial, sem licitação, e o terceiro, de R$ 11 milhões, foi resultado de um pregão eletrônico em 2023. Durante o processo de licitação, houve questionamentos sobre a capacidade técnica do laboratório, que não conseguiu comprovar experiência para realizar metade dos exames previstos no contrato. O PCS Lab Saleme tem entre seus sócios Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, primo do deputado federal Dr. Luizinho, ex-secretário de Saúde do Rio, que esteve à frente da pasta até setembro de 2023.

Em nota, o deputado federal Dr. Luizinho lamentou profundamente o ocorrido e negou envolvimento na escolha do laboratório, afirmando que a contratação ocorreu após sua saída da secretaria. O laboratório também se manifestou, informando que abriu uma sindicância interna para apurar as responsabilidades e que dará suporte médico e psicológico aos pacientes infectados e seus familiares.

O Ministério da Saúde e o Ministério Público do Rio de Janeiro também estão acompanhando de perto as investigações. A ministra da Saúde, Nísia Trindade, garantiu que o governo prestará toda a assistência necessária aos pacientes e reiterou o compromisso de manter a segurança, a qualidade e a confiabilidade do SNT (Sistema Nacional de Transplantes), considerado um dos mais rigorosos do mundo. O Ministério da Saúde também determinou que a testagem de todos os doadores de órgãos no Rio de Janeiro volte a ser feita exclusivamente pelo Hemorio, utilizando o teste NAT, desenvolvido pela Fiocruz, que é considerado mais seguro e confiável.

Além disso, uma auditoria emergencial foi ordenada pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS para verificar possíveis irregularidades na contratação do PCS Lab. A retestagem de todos os órgãos anteriormente analisados pelo laboratório será realizada para identificar outros potenciais casos de contaminação.

O Sistema Nacional de Transplantes, que segue normas rigorosas para proteger doadores e receptores, realiza uma série de exames sorológicos em todos os doadores de órgãos para prevenir a transmissão de doenças infecciosas, como HIV, hepatite B e C, sífilis e toxoplasmose. Especialistas em transplantes ressaltaram que os protocolos seguidos no Brasil são extremamente criteriosos, e a chance de falhas é mínima.

O impacto desse erro, no entanto, já foi profundo. Além dos pacientes que agora enfrentam a convivência com o vírus HIV, o caso levanta sérias preocupações sobre a gestão dos processos de transplante no estado do Rio de Janeiro. A falta de controle e a possível influência política nas contratações de serviços de saúde estão no centro do debate, enquanto as investigações avançam para apurar todas as responsabilidades e assegurar que erros como este não se repitam.

Comentários

Comentários