JOGO DE AZAR

Famílias deixam de comprar o básico por apostas esportivas

Por Ana Laura França | ana.laura@jpjornal.com.br |
| Tempo de leitura: 3 min
Divulgação/Canva

Nos últimos cinco anos, o Brasil enfrentou uma tendência preocupante: os gastos das classes D e E com apostas esportivas dispararam, quadruplicando nesse período. Enquanto o dinheiro que poderia ser investido em um passeio familiar, um curso de aprimoramento ou uma reserva para emergências é destinado a jogadas arriscadas, essa mudança no comportamento financeiro revela um problema crescente, que atinge diretamente as famílias de menor renda.

As apostas esportivas, que envolvem apostar dinheiro em eventos esportivos com a expectativa de ganhar com base no resultado, podem parecer uma forma divertida de acompanhar o time favorito. No entanto, os riscos financeiros dessa prática são altos, e o impacto nas famílias brasileiras de menor renda tem sido significativo. O mercado de apostas no Brasil explodiu após a aprovação da Lei nº 13.756, sancionada pelo então presidente Michel Temer em 2018. Com essa regulamentação, o setor se expandiu rapidamente, atraindo milhões de apostadores e aumentando os gastos em 419% entre 2018 e 2023.

Esse crescimento fez com que as apostas se tornassem uma parte maior do orçamento familiar. Segundo uma análise da Strategy & Brasil, a parcela dedicada às apostas nas classes D e E aumentou de 0,27% em 2018 para 1,98% atualmente, quase quatro vezes mais. Ao mesmo tempo, os gastos com lazer e cultura diminuíram, e os gastos com alimentação mantiveram-se estáveis. A principal motivação dos apostadores dessas classes é a tentativa de "ganhar dinheiro", mas apenas 23% relatam terem obtido mais ganhos do que perdas.

Embora ainda não haja estudos conclusivos sobre a relação causal entre o aumento dos gastos com apostas e a piora da situação financeira das famílias, evidências indicam que essa prática tem um impacto prejudicial. Uma pesquisa da Associação Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) revelou que 63% dos apostadores afirmam que suas rendas foram comprometidas por conta do hábito de apostar. Itens básicos como roupas e produtos de mercado, assim como viagens, foram sacrificados para financiar essa atividade arriscada.

As classes D e E, que englobam famílias com rendas mensais de até R$ 2.400 e R$ 2.000, respectivamente, são as mais vulneráveis. A busca por formas rápidas de melhorar a renda e a falta de educação financeira contribuem para que essas famílias vejam as apostas como uma oportunidade, sem considerar os riscos envolvidos. Uma parcela significativa de brasileiros, especialmente jovens e pessoas com menor instrução financeira, considera as apostas esportivas uma forma de investimento. No entanto, essa percepção é equivocada. Apostas esportivas são altamente arriscadas, diferindo de investimentos planejados que visam retornos a longo prazo.

A confusão entre apostas e investimentos pode levar a expectativas irreais de ganho rápido, comprometendo ainda mais o orçamento familiar. A educação financeira é fundamental para reverter esse cenário, capacitando as pessoas a fazerem escolhas mais conscientes e seguras com seu dinheiro. Em vez de buscar ganhos incertos, a educação oferece as ferramentas para construir uma vida financeira mais estável a longo prazo.

Além disso, é importante entender a chamada "falácia do jogador", uma crença equivocada de que padrões passados influenciam resultados futuros em apostas. Esse tipo de erro de raciocínio pode levar apostadores a decisões ruins, resultando em perdas financeiras ainda maiores.

Enquanto as apostas esportivas podem parecer uma solução rápida para melhorar a renda, elas representam um risco significativo para as famílias de baixa renda no Brasil. A educação financeira é a chave para transformar essas escolhas arriscadas em decisões mais seguras e sustentáveis.

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