O filme Encontrando Forrester (2000), dirigido por Gus Van Sant e protagonizado por grandes atores, como Sean Connery, Robert Brown e Murray Abraham, mostra Jamal Wallace, um adolescente negro morador de um bairro periférico de Nova York, que possui um talento incomum para a escrita e revela extraordinária aptidão para a literatura. Vivendo, entretanto, entre amigos que valorizavam acima de tudo a prática esportiva e a música Rap, sente-se isolado, incompreendido e profundamente infeliz. Procura realizar-se como jogador de basquetebol, e também nessa área consegue algum sucesso, mas sente que suas aspirações mais profundas não estão atendidas. Toma então contato, por acaso, com William Forrester, grande e famoso escritor que somente havia publicado um único best-seller em sua vida e vivia retirado, solitário e amargurado num apartamento cheio de livros. Forrester vence sua misantropia e passa a estimular o talento literário do jovem negro, que obtém uma bolsa de estudos numa escola particular de alto nível, que desejava tê-lo como aluno apenas para reforçar seu time de basquetebol e também não lhe dá grande valor como estudante. Na nova escola, ainda mais se sente socialmente deslocado e cada vez mais dramática se torna sua crise existencial, até que, no fim, consegue superá-la e vencê-la de modo surpreendente.
Esse filme, de grande profundidade filosófica e psicológica, mostra bem como a superdotação, longe de garantir uma vida serena e sem dificuldades, muitas vezes é causa de não poucos sofrimentos existenciais. Frequentemente a “superdotação” numa área produz desajustes no convívio e, por vezes, causa problemas internos na própria pessoa. Longe de simplificar a vida do “superdotado”, muitas vezes é causa de dissabores, de problemas de relacionamento e até mesmo de crises existenciais.
O sistema educativo brasileiro prevê dois tipos de ação aplicáveis a alunos com altas habilidades/superdotação (AH/SD): a aceleração dos estudos e o enriquecimento curricular. Em certos casos, é permitido que o aluno seja transferido para uma sala de alunos mais velhos até, conforme o caso, dois anos. Essa transferência normalmente significa, para o aluno, um poderoso estímulo e, muitas vezes, é suficiente para ele superar os problemas de relacionamento que antes sentia com os companheiros de sala. Com os mais velhos (e ao mesmo tempo mais próximos da sua idade mental), ele terá maior facilidade para relacionar-se e sentir-se “enturmado”.
Já o enriquecimento curricular se pode processar em dois locais distintos. Pode ser na sala de aula regular, mediante a proposição, pelo docente, de projetos de pesquisa, pela indicação de leituras ou de sites da internet que despertem a curiosidade dos alunos, ou pela apresentação de desafios. Isso pode ser feito na sala comum, para todos que queiram, mas o docente procurará sempre fazer com que o aluno de AH/SD sinta aquilo como pessoalmente dirigido a ele - para estimulá-lo a realizar seu potencial naquela área de seu especial interesse. Se outros alunos também se interessarem pelo projeto, será natural que o AH/SD tome a dianteira e se destaque, contribuindo assim para melhorar seus problemas de isolamento psicológico em relação à turma. O enriquecimento curricular pode também ser feito em outro local, numa sala de recursos especiais adequada, com um professor especializado que possa dedicar ao aluno atendimento mais individualizado.
Segundo cálculos da OMS, de 3 a 5% da população mundial apresentam algum tipo de altas habilidades. Seu potencial é imenso, mas muitas vezes nem sequer é notado pelos demais e, assim, não se desenvolve. Em nível individual é grande o prejuízo, pois seus talentos não se revelam e ficam estéreis. Socialmente, ainda o é muito mais, pois deve-se considerar que os talentos individuais têm, também, uma função social e devem ser desenvolvidos e exercidos para o proveito da coletividade.
É tendo em vista esses pressupostos que a atual legislação educacional brasileira considera os alunos AH/SD como necessitados de uma educação especial, assim como o são, a um outro título, os portadores de deficiência visual, auditiva ou motora. Todos são alunos especiais, que requerem tratamento diferenciado.