ARTIGO

Cateterismos


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Ela realizara a rotina convencional numa avaliação de dor torácica. Revelara-se a probabilidade pré-teste ergométrico moderada, ou seja, possuía considerável chance de o exame que procura indícios de doença cardiovascular se revelar positivo. Seguiu-se uma série de exames que sugeriam, fortemente, a presença de coronariopatia. Fazia-se necessária a realização do cateterismo cardíaco. Rosimeire Aparecida Vilalta, com 57 anos, temia o exame. Ficara extremamente apreensiva e tentara barganhar comigo.

Seu temor justificava-se. Vira o pai, aos 48 anos, morrer subitamente de infarto, no quarto de um hospital, durante um jogo da seleção brasileira, enquanto aguardava a realização do cateterismo.  O Sr. Orildo Vilalta fumara na juventude. Rosi tinha apenas 15 anos. Alguns anos mais tarde, Orildo, o irmão mais velho, com o mesmo nome do pai, e que assumira a função paterna no cuidado dos três irmãos, viajara em segredo, com a esposa Ana, a São Paulo. Submetera-se ao cateterismo que resultou numa cirurgia de revascularização miocárdica, também conhecida por cirurgia de ponte de safena. Só contaram aos demais quando voltaram a Piracicaba. O fator de risco familiar revelou-se tão intenso e avassalador que até a meia-irmã Catarina, por parte de pai, fora acometida da doença arterial coronariana. Falecera, aos 46 anos, durante a realização da cineangiocoronariografia — nome técnico do cateterismo cardíaco. Rosimeire enfrentou o medo, fez o exame e não fugiu à regra da família: possuía obstrução em três artérias coronárias, uma delas crítica, o que necessitou de intervenção, por meio da angioplastia e de implantes de stents. Rosi é ex-fumante. Consumira cigarros por doze anos, dos 18 aos 30.

Tivera um casal de filhos do primeiro casamento, que durara apenas sete anos: Sarita e Rafael. Naquela época, fumava muito – 40 cigarros por dia. Comprava-os aos pacotes e deixava os maços por todos os cômodos da casa, nas gavetas da mesa de trabalho, na bolsa e no porta-luvas do carro. Após a separação, resolveu procurar trabalho para cuidar dos filhos. Mesmo sem ter finalizado os estudos, fora recepcionista e telefonista na empresa RKM e, depois, trabalhou no departamento de recursos humanos e também no financeiro. Lá conhecera Paulo, o atual marido, que a incentivava a abandonar o tabagismo, distraindo-a. Livrou-se dele, mas não das suas consequências. Por sorte, entendeu a importância da otimização do tratamento, por meio do controle rigoroso da pressão arterial e do colesterol e das mudanças no estilo de vida, que incluíram atividades físicas regulares, controle do estresse por meio de consultas com psiquiatra e de sessões de psicoterapia e perda de peso — ela emagreceu 20 quilos. 

Centralizadora e acolhedora, Rosi ajudou a criar, em sua casa, o primeiro neto, Leo, quando a filha engravidara aos 17 anos; também cuida da mãe, com 96 anos, que demanda dedicação integral. Em sua casa, acolheu Rafael, após o divórcio do filho, e ajudou-o na trabalhosa criação das duas netas gêmeas, Bela e Betina. Com três anos, as meninas ainda não falam — são autistas. Mas Rosi consegue encontrar tempo para o casal: quando viajam, a mãe idosa fica aos cuidados da outra filha, Marilda, e eles podem sair rodando pelas estradas na motocicleta BMW GS 1200. Frequentam o Motoclube Free Rider e, com ele, já conheceram as estradas do Rio do Rastro, em Santa Catarina —uma das estradas mais impressionantes do mundo com trechos de subidas íngremes, de curvas fechadas e de mirantes espetaculares entre penhascos e montanhas; a estrada do Corvo Branco, também na serra catarinense  e a estrada do Rastro da Serpente, no Paraná — paraíso dos motociclistas amantes das curvas sinuosas, onde se sentem  como cobras a serpentear. Até Caldas Novas, em Goiás, rodaram. Antes, logo após saber o diagnóstico, vivia preocupada. Nos passeios de moto, ia e vinha, na garupa, rezando, com medo de morrer. Passaram-se seis anos do cateterismo e Rosi, agora mais tranquila, conseguiu tomar as rédeas ou, melhor, o guidão da própria vida. 

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