Mais velho entre três irmãos, nascido em São Paulo, mas morador de Piracicaba há 23 anos. Luiz Roberto Xavier, de 65 anos, é psicólogo clínico, terapeuta sexual e de casais. Também é ligado aos esportes, pratica paraquedismo, ciclismo, vôlei e natação. Ao Jornal de Piracicaba, Xavier, conta um pouco da sua história e como ajuda as pessoas a enfrentarem transtornos, traumas, estresse e demais situações que interferem diariamente em suas vidas.
Conte um pouco da sua história até aqui
Graduei aos 21 anos em Filosofia pela PUC/MG. Aos 23 anos prestei concurso e entrei na Caixa Federal onde permaneci por 20 anos. Entrei num programa de demissão voluntária (PDV) em 2000 e me aposentei, para ficar atuando apenas no em consultório. Aos 29 anos comecei o curso de Psicologia me formando aos 34 anos. Fiz algumas especializações: Psicodrama, Análise Transacional, duas pós-graduações em sexualidade (Terapia Sexual e outra em Educação Sexual pela Faculdade de Medicina do ABC). Fui membro e delegado regional da SBRASH – Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana. Tenho formação de Técnico em Enfermagem, mas nunca exerci. Atuei por 17 anos, como voluntário, na Rádio Educativa de Piracicaba. A cada 15 dias escrevo numa coluna do JP. Sou paraquedista, ciclista, pratico vôlei e natação.
O que o levou a escolher a psicologia clínica e a terapia sexual como carreira?
Algumas pessoas acreditam que, e eu sou uma delas, a profissão encontra a gente. Sempre gostei da área de Humanas. A escolha pela Psicologia foi curiosa: no início era apenas prá estudar um pouco mais. Ao longo do curso percebi que eu “levava jeito prá coisa” (rs). Depois da graduação levei a sério profissão com cursos de aperfeiçoamento e especializações dentro da área. O tema sexualidade sempre me causou curiosidade desde a infância. Quando fiquei sabendo que existia pós nesta área fui atrás e me formei no melhor curso que havia na época.
Quais são as questões mais comuns que seus pacientes trazem para a terapia?
São temas, assuntos, dores, sofrimentos, angústias, questionamentos, dúvidas as mais diversas possíveis, tudo que é inerente ao ser humano! Casos de depressão são muito comuns, dificuldades nos relacionamentos afetivos, familiares e profissionais, disfunção sexual, baixas da própria estima, etc.
Quais são as abordagens terapêuticas que você mais utiliza e por quê?
Além das técnicas em terapia sexual, a minha linha mestra de trabalho na clínica é a Análise Transacional e a Terapia Cognitiva Comportamental (TCC). Gosto de trabalhar mais no aqui e agora. Como sou psicodramatista também, isso me facilita trabalhar com grupos e em grupo.
Quais são os maiores desafios que você enfrenta ao tratar questões sexuais?
De uma forma geral, todos os casos são um desafio: uns maiores, outros nem tanto! No entanto, um desafio comum é quando, por conceitos morais e/ou religiosos rígidos, os pacientes mostram resistência em admitir e mudar determinados comportamentos que prejudicam o exercício da sua própria sexualidade.
De que maneira os problemas sexuais podem afetar a saúde mental de uma pessoa?
Não diria afetar a saúde mental, mas a saúde emocional pode ser comprometida, por exemplo, por culpa em excesso no exercício da sexualidade.
Quão importante é a comunicação entre parceiros para a saúde sexual e emocional?
Ela é fundamental para lubrificar o relacionamento emocional e afetivo entre os parceiros e, consequentemente, ter um bom desempenho sexual.
Temos visto com bastante frequência casais assumirem o relacionamento aberto. Essa é uma tendência ou sempre ocorreu, mas de forma mais reservada?
Sempre ocorreu. Alguns pares, vez por outra, fazem esta escolha de forma reservada ou explícita. Porém, eu não vi, até agora, uma relação aberta que perdurasse muito tempo. Há sempre o risco de acontecer um vínculo paralelo por uma das partes.
Existe um momento certo para um casal discutir o relacionamento aberto?
É importante deixar claro desde o início do relacionamento a proposta de relação aberta. Isso vai muito da maturidade de cada um. Uma coisa é fundamental: não haver ciúmes.
Qual é a sua abordagem ao trabalhar com casais que estão explorando ou já estão em um relacionamento aberto?
Como disse antes, é fundamental que não exista uma ponta de ciúmes. E há a necessidade de um diálogo constante, transparente, objetivo e, acima de tudo, respeito à individualidade de ambos.
Qual é a sua opinião sobre o impacto da tecnologia, como aplicativos de namoro, na sexualidade e nos relacionamentos?
Vieram para facilitar, aproximar e agilizar os relacionamentos. No entanto, estes aplicativos mostram uma realidade cada vez mais crescente: a dificuldade de se manter uma conversa com conteúdo e riqueza de vocabulário. Fora as tentativas de golpes muito mais prá cima do público feminino.
Como a educação sexual pode influenciar positivamente a saúde sexual e emocional dos indivíduos?
Sempre afirmei que educação e orientação sexual são fundamentais para a saúde sexual e para o exercício de uma sexualidade saudável e plena. E também para se prevenir abuso sexual infantil. Gosto de citar o resultado de uma pesquisa que fizemos com adolescentes na época em que me pós graduava: foi provado que quanto mais informação a respeito de sexo e sexualidade, os adolescentes “atrasavam” o início das relações sexuais em até 2 anos (em média). Ou seja, quanto mais informação séria, sem preconceitos e correta, menos necessidade de buscar respostas na prática.
Como as preocupações sexuais mudam ao longo das diferentes fases da vida?
Em termos de preocupações, eu diria de uma forma bem simplória e resumida que, basicamente, as mais frequentes e recorrentes são: abuso sexual de crianças, gravidez na adolescência e medo de falhar na hora H. Uma situação curiosa. Hoje em dia fala-se muito de sexo e sexualidade em todo lugar: em rodas de conversas, mídias televisivas, radiofônicas, jornais, revistas, igrejas, condomínios, botecos, internet, músicas de duplo sentido, etc., etc. Mas, o que temos observado é que ainda permanece muita desinformação ou informação errada e preconceituosa a respeito do tema.
Como você aborda questões relacionadas à identidade sexual e orientação sexual em sua prática?
A identidade sexual é a percepção que a pessoa tem sobre o seu gênero. É apenas uma das partes que formam a sexualidade e, não necessariamente, reflete o sexo do nascimento. Por exemplo, uma pessoa nascida biologicamente do sexo masculino pode se identificar sexualmente como feminina. Orientação sexual é a percepção que a pessoa possui de si, independente do sexo biológico. É a compreensão da pessoa sobre ela mesma, como ela se vê e deseja ser reconhecida.
Quais são os problemas mais comuns que casais enfrentam e como você os ajuda a superá-los?
São os mais diversos possíveis. Mas, o mais comum é o não respeito à individualidade do(a) parceiro(a). Fomos educados que, uma vez casados, temos que fazer tudo junto o tempo todo. E quando queremos ou precisamos fazer algo fora do olhar o outro, temos que pedir permissão para tal. Sempre brinco com os meus pacientes dessa forma: fidelidade 100% sim, sinceridade 100% não... rsrs. Tem pessoas que sentem a “necessidade/obrigação” de prestar relatório de como foi o seu dia. Porém, nem sempre o outro lado está a fim de ouvir. Vez por outra, tudo bem, mas...Temas que aparecem com frequência: ciúmes, traição, disfunção sexual por uma das partes, baixa autoestima, forma diferente de educar os filhos, família de origem interferindo no casal, etc.
Quais são alguns dos mitos comuns sobre sexualidade que você gostaria de esclarecer?
Os mitos surgem em função da falta de informação, ou pior, por informação errada a respeito da sexualidade. Citando alguns: tamanho do pênis – quanto maior, melhor; transar durante a gravidez vai “furar” a bolsa do líquido amniótico e vai machucar o bebê; se a mulher tiver orgasmo durante a gestação o bebê pode nascer naquele momento; não se pode transar durante a gravidez com a mãe do meu filho (no jargão dos psicólogos e médicos chamamos isso de síndrome de Nossa Senhora: pureza e santidade – como se a prática sexual durante a gravidez fosse algo impuro); coito interrompido: transar sem camisinha e, antes de ter o orgasmo, retira o pênis de dentro da vagina prá não engravidar (é o método contraceptivo mais falho que existe); e por aí vai...
Como traumas passados podem afetar a vida sexual de uma pessoa e como você trabalha com esses casos?
Dependendo do que aconteceu, da forma e da frequência do acontecido, e também de como a pessoa lidou com a situação, pode ser instalado o trauma e afetar diretamente a vida sexual na adolescência ou na idade adulta. Os traumas podem ser físicos ou informações morais e/ou religiosas muito rígidas a respeito da sexualidade gerando culpa, medo e não permissões para se realizar sexualmente. Apenas dois exemplos para ilustrar: abuso sexual e quando a criança ocasionalmente viu os pais transarem (também neste rol inclui-se crianças que dormiam no mesmo cômodo em que os pais dormiam). Situações como estas podem apresentar disfunção erétil, vaginismo, ejaculação precoce (rápida), etc. Cada caso é trabalhado numa linguagem própria, com muito tato, com técnicas específicas para cada disfunção e de acordo com o que o paciente (ou o casal) vai se permitindo.
Quais são os transtornos sexuais mais comuns que você encontra em sua prática e como são tratados?
Não diria transtornos, mas disfunções sexuais. As mais comuns são disfunção de desejo, de excitação e de orgasmo. Como eu disse para cada disfunção existem técnicas específicas. Lembrando sempre que, a maioria dos casos de disfunção sexual são de origem psicogênica, por isso, além das técnicas, abordamos principalmente os aspectos emocionais envolvidos na vida da pessoa/casal: crenças religiosas, estresse, mandatos parentais, depressão, preocupação financeira da família, obesidade, baixa autoestima, ansiedade, além das doenças de origem psicossomáticas, etc. Um dado importante e significativo é que os casais são muito pobres em fantasias sexuais. Não fantasiam situações, cenas, vontades, preferências em termos de sexo. E o pior, não comunicam à(ao) parceira(o) sobre ideias, fantasias, posições sexuais, por vergonha ou medo de serem mal compreendidos.
Como o estresse e a ansiedade podem afetar a vida sexual de uma pessoa e quais são as estratégias para lidar com isso?
O estresse e a ansiedade andam praticamente juntos! Essa dupla afeta negativamente diversas áreas da vida. inclusive a sexualidade. Aliás, boa parte das disfunções sexuais são consequência de ansiedades. Além do acompanhamento psicoterápico, tenho sugerido práticas de relaxamento, meditação, yoga, exercícios físicos ao ar livre, caminhadas em parques, atividades esportivas (dentro do limite de cada um).
Qual é a sua opinião sobre a eficácia da terapia online para questões sexuais e relacionamentos, especialmente após a pandemia?
A técnica de atendimentos online veio para ficar. Ela é eficaz, sim. Eu prefiro e sugiro que os atendimentos sejam presenciais, mas sabemos que “nos corres” da vida diária o tempo e a locomoção ficam um pouco limitados. Quando se trata dessa modalidade de atendimento faço sempre por vídeo chamada. Mesmo sendo terapia de casal onde, às vezes, os parceiros estão em locais diferentes. Por exemplo, tenho pacientes que, por necessidades profissionais, estão em trânsito ou residindo em outros Estados e/ou países.
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