A primeira tarefa da Educação, diz o filósofo, deveria ser ensinar a ver. Sentir e ver. Ver e sentir.
Quando pequeno envolvido pelo Amor de Deus, pouco ou nada entendia da finitude da vida, condição humana essencial. Acreditava que meus pais, por exemplo, seriam eternos, supondo, também, que as pessoas consagradas, por vocação e fé, a Ele se igualavam. Ledo engano.
Sorte permitir iluminar-me pelo conhecimento e pela leitura ao descobrir o erro contido nestes pensamentos e em tantos outros que me ocuparam a mente.
Quanto a meus pais, não nego, certificar-me de que não eram imortais, causou-me mágoa profunda, sentimento de orfandade e solidão. Pais, os que são como flores do campo, perfeitos na simplicidade, alma translúcida, fenecem? Não deveriam. Quando fui obrigado a experimentar esta dor, revivi aqueles sentimentos da infância e pude sentir quanto ferem a alma.
A maturidade não abrandou o incômodo. Acendeu a esperança. Ler muito trouxe luz e entendimento, permitindo repetir o poeta quando, sem hesitar, baixou lei - “Mãe não morre nunca!” – que serviu a mim e a ele para reconhecer a pequenez e as muitas limitações da condição humana.
A vida nos permite compreender, com pesada tristeza, a ação do tempo. Ajudou-me nisso, de modo efetivo, João XXIII, papa que deu à Igreja visão moderna humanizando o divino ensinamento.
Olhar e ver. Ver além dos olhos. Valer-se dos sentidos. Hoje, quando, com rapidez incomum a idade me devora, ter a oportunidade de ver Francisco liderando com humildade e precisão, acerto e modernidade as transformações dá-me júbilo.
Sinto que pode, por nas ações e em sua estreita ligação com a espiritualidade, fazer o catolicismo – e, por que não – as demais religiões – se encherem de Luz e avançarem, não no tempo, mas no comportamento social que o tempo exige.
Por isso repeti o nome do Pavilhão da Santa Sé na Bienal de Arte de Veneza, neste texto. Francisco esteve lá referendando uma vez mais arte e vida ao discursar sobre a vida. Visão extemporânea de arte nascida no coração humano e culto de Bergoglio, o notável cardeal argentino, conduzido à condição papal pelo Espírito do Amor de Deus.
Só mesmo um personagem como Francisco, admirador de João XXIII, visão de mundo incomum, sacerdote de alto nível, sábio e humilde, poderia encontrar numa atitude comum sentido extraordinário. Sempre assim em tudo que faz, que fala e vê, já que vê além dos olhos.
Poucos como ele seriam capazes de comprovar a ambiguidade do olhar e agradecer, ao final da visita, como Jó, o visto, afirmando com prazer: “Meus olhos viram!” Minha alma sentiu!
Antes, João XXIII. Agora, Francisco. Deus soube prover a Igreja com alguém capaz de, com alegria, sabedoria e luz, apresentar as manifestações da presença real de Deus na fala, na ação e nos gestos além dos sentidos, brotada na alma.
O artista, diz Francisco, vê "com seus olhos, olha e ao mesmo tempo sonha, vê mais profundamente, profetiza, anuncia uma maneira diferente de entender as coisas. A Arte é a voz dos sonhos e das angústias humanas. E por isso age ‘como consciência crítica da sociedade’".
O verdadeiro cristão, se vir além dos olhos, aceita e aplaude, mesmo não concordando. Age com elegância e prudência e dá, ao que vê, em Francisco e em seus atos, a dimensão exata de respeito e amor.