ERICK GOMES

A importância da indústria para o desenvolvimento de Piracicaba

Por André Thieful | 05/04/2024 | Tempo de leitura: 15 min

Divulgação

Erick Gomes é presidente do Simespi
Erick Gomes é presidente do Simespi

Erick Gomes nasceu em São Paulo, em 17 de janeiro de 1976. Casado com  Beatriz e pai de um adolescente de 15 anos e uma pré-adolescente de 12. Graduado em Administração de Empresas pela Unimep, tem MBA em Comércio Internacional pela FIA-USP e extensão na Universidade Pierre Mendes(França), MBA em Gestão Financeira, Auditoria e Controladoria pela FGV. Aos 40 anos, ingressou no curso de Direito da Unimep, formando-se em 2020.

Conte um pouco da sua história de vida e como começou a sua atividade profissional.

Falar da minha vida profissional é poder relembrar bons momentos, especialmente para alguém que, na minha idade, ou está no meio da vida, ou já iniciou o segundo tempo do jogo. Meu primeiro emprego com carteira assinada (depois de trabalhar como entregador de carne e serviços gerais em um dos colégios que estudei) foi na antiga Delphi Automotive Systems. Se nos recordarmos o ano 1998, lembraremos que o mercado automotivo estava passando por um boom nas vendas e, por conta disso, as indústrias de autopeças estavam fazendo horas extras demais, ultrapassando os limites impostos na lei. Por conta disso, o Sindicato dos Metalúrgicos e a Delphi criaram um sistema chamado “2x5”. Ou seja,  as empresas poderiam contratar funcionários que estivessem frequentando universidades para trabalhar aos sábados e domingos. Eles ocupariam o lugar dos trabalhadores regulares, sem fazer com que estes perdessem seu descanso legal. A produção se mantinha, já que sempre teria uma parte da equipe regular e uma parte de estagiários que aproveitariam para aprender mais sobre seu ofício. Trabalhei na sala de óxido, no chão de fábrica.

Fiquei seis meses na Delphi até conseguir, por meio do programa de estágio da Unimep, uma oportunidade em uma empresa de Limeira, na época conhecida como Freios Varga (posteriormente ela teve seu nome alterado para TRW e hoje é conhecida com ZF Automotive). Trabalhava como atendente comercial de 0800 na área da franquia Varga Serviços, tínhamos uma unidade aqui em Piracicaba. Eu fazia todo o atendimento comercial daquela rede via telefone, já que n época era estagiário e, por regras internas, não podia visitar os clientes, a não ser com um funcionário já efetivado. Fiquei por nove meses como estagiário e, por conta de uma vaga ter sido aberta, fui efetivado pelo meu gestor. Comecei a visitar pequenos distribuidores de autopeças e continuei a atender a rede. Naquele período a minha vida mudou bastante, pois comecei a visitar filiais de autopeças no Brasil inteiro, o que fazia com que eu tivesse que focar mais nos objetivos de vida, pois tinha que estudar (ainda não era formado), namorar (já estava com a Bia, que sempre foi uma baita companheira e, se cheguei aonde estou, ela e meus pais têm uma parcela gigantesca de mérito) e trabalhar. Quantas e quantas vezes chegava direto de uma viagem para outro estado e ia direto para a faculdade... Bons tempos.

Um dos meus companheiros na área de vendas nacional pleiteou uma vaga como gerente da área de exportação e conseguiu o cargo. Naquela época, eles precisavam de uma pessoa que falasse inglês para desenvolver um projeto com a filial da Ásia (Cingapura) e, como esse gestor sabia que eu me virava no idioma, me convidou para trabalhar com ele; resolvi aceitar o desafio e lá fomos nós. Durante um ano, desenvolvi este projeto e, após terminar, como recompensa fui convidado para integrar a equipe de vendas exportação, onde fiquei por três anos, viajando quase toda semana a América do Sul inteira, sem falar nada de espanhol. Lembro-me até hoje: minha primeira reunião de vendas foi no Chile e não consegui entender 80% do que o cliente falava (risos). Acredito que ele também não me entendeu muito, mas ao final saiu um excelente negócio.

Entre o final de 2004 e início de 2005, eu já estava à procura de novos desafios, quando passei em um processo de seleção na Continental Pneus, empresa sediada em Jundiaí. A vaga era também para exportação, aceitei o desafio, continuei morando aqui e, quando não estava em viagem, estava na estrada, ia e voltava todo dia para Jundiaí. Lá também fui responsável por vendas exportação, mas uma área maior de responsabilidade, toda a América do Sul, Caribe e América Central. Passava mais tempo em avião do que em casa (risos).

Em 2006, tomei uma das mais importantes e melhores decisões da minha vida, que foi me casar. Obviamente que a partir daquele momento, meu desejo era passar mais tempo com a minha esposa; as viagens que chegavam a durar quase um mês, se tornaram cansativas, precisava ter uma referência de “casa”, que eu já tinha perdido. Comecei a procurar emprego, quando um pessoal com quem havia trabalhado lá no começo, quando era estagiário na Varga Serviços, me indicou para uma vaga em uma empresa em São Paulo. Comecei a passar pelas etapas do processo seletivo. Mas (sempre tem um mas!), naquela época a fábrica DanPower estava começando a funcionar e meu pai me convidou para trabalhar aqui em Piracicaba. E lá se vão bons 17 anos trabalhando em Piracicaba.

Como criou e qual o perfil da sua empresa, quantos empregos gera?

A empresa foi criada pelo meu pai, que está até hoje no comando e espero que fique por muitos anos ainda. Quando cheguei na DanPower, em 2007, tínhamos pouco mais do que 20 funcionários, um barracão de 2.500 m² e muita vontade. Apliquei tudo o que aprendi nas empresas multinacionais e em casa na DanPower. Dou valor ao trabalho em grupo, em que todos temos importância no processo, respeito ao próximo e o ouvir, ouvir sempre. No começo não foi fácil! Conseguir funcionários era dificílimo porque não conheciam a empresa. Quem iria se arriscar a sair das grandes empresas aqui presentes para trabalhar em uma empresa nova?  Acredito que fizemos um bom trabalho. Levamos aos nossos colaboradores todos os desafios colocados pelo mercado e compartilhamos nossas decisões. Posso dizer, sem sombra de dúvidas, que a DanPower só se tornou uma empresa de médio porte e passou por todas as inconstâncias do mercado, por conta da sua equipe! Hoje somos pouco mais de 300 funcionários, com uma área de produção de 20 mil m².

Quais os principais desafios enfrentados pelo empresário do setor industrial? 

Os desafios são incontáveis. A indústria brasileira tem muitos “custos” intrínsecos à sua operação, o que não nos permite concorrer, como por exemplo, com a China. Fala-se muito no “Custo Brasil”. E o que seria isso? São os custos que pagamos por uma malha rodoviária sem manutenção, o tempo exagerado que um transporte fica aguardando para uma licença/permissão para rodar, taxas e mais taxas cobradas para termos permissão de trabalho, falta de ensino e treinamento para nossos colaboradores, insegurança jurídica que hoje está muito forte em nosso país, todos estes quesitos que fizeram com que a indústria em geral perdesse sua participação no PIB. Só para se ter uma ideia, em 1980 a indústria representava quase 30% do PIB , em 2018, a participação foi de 11,3%. Por mais que o Brasil tenha um banco que deveria ser focado no desenvolvimento social, o famoso BNDES, poucas empresas de médio e pequeno portes têm acesso às suas linhas de crédito.

Hoje, temos em Piracicaba uma indústria relativamente forte, mas precisamos tomar cuidado. Por muitos anos fomos negligenciados, e poucos dos nossos políticos entendem que, ao negligenciar uma indústria/empresa está negligenciando seus colaboradores, pois atrás de um CNPJ há milhares de CPF que dependem desta empresa para pagar suas contas. Deixo aqui uma pergunta: alguém conhece uma cidade de relevância econômica que não tenha uma indústria forte? Fica aqui para os leitores refletirem. 

Como presidente do Simespi, o senhor lidera um segmento fundamental para a economia da cidade. Quais os principais desafios a frente da entidade?

Os desafios são gigantes, mas posso dizer que, apesar de estar como presidente, temos uma diretoria competentíssima e que se entrega à solução dos problemas, é um verdadeiro trabalho de equipe. Sempre estamos antenados ao que vem ocorrendo, especialmente em Brasília, que pode vir a nos prejudicar, sem falar na nossa equipe executiva, que nos apoia.

Seria hipocrisia dizer que a posição do presidente não tem relevância, mas nossa conduta de trabalho é o respeito, como aplico na empresa que administro. A experiência de vida de nossos diretores é enorme, cada um com a sua história, mas o que é importante salientar é que estamos sempre trabalhando em prol das empresas, e não de um nicho de empresas

Mais do que negociar acordos coletivos com o Sindicato dos Metalúrgicos, desde 1995, o Simespi tem a missão de disponibilizar todas as ferramentas e recursos possíveis para o aprimoramento da gestão pelas associadas, para a formação e capacitação da mão de obra necessária ao funcionamento da indústria, para a troca de experiências e de informações por meio dos grupos de network e de estudos; para o encaminhamento das demandas do setor ao poder público em todas as suas esferas; e, também, para atuar em prol da comunidade em suas mais diversas causas. Por sua representatividade crescente, o Simespi torna-se uma entidade cada vez mais fundamental ao setor e à sociedade de um modo geral.

O Sindicato reúne quantos empresários? 

São mais de 230 empresas associadas, um número que, graças a Deus, cresce de forma constante e sustentável. São empresas de todos os portes, desde pequenas oficinas a grandes companhias brasileiras e multinacionais como Dedini, ArcelorMittal, Caterpillar, CNH, Hyundai, entre outras. Todas muito importantes para o fortalecimento da entidade e do setor metalmecânico.

O Simespi atua também na formação de jovens com o projeto Indústria do Amanhã. Qual avaliação faz da iniciativa até aqui?

O Projeto Indústria do Amanhã, idealizado conjuntamente com o Sindicato dos Metalúrgicos, completou um ano e é uma experiência extremamente bem-sucedida sob vários aspectos. Primeiramente, pelo alcance social, já que formou e capacitou 95 jovens de comunidades carentes, sendo que mais de 30 já estão empregados. O projeto continua este ano e vamos formar, só neste semestre, mais de 90 jovens em cinco cursos profissionalizantes. Outro aspecto positivo do projeto é a união de parceiros incríveis como o Exército de Formiguinhas, a Diocese de Piracicaba e o Senai, onde acontece a formação profissional dos participantes do projeto.

Qual a avaliação o senhor faz da política econômica brasileira, atualmente?

Sendo realista, temos visto uma situação parecida com os governos anteriores do presidente Lula, ou seja, gasto maior do que a receita. Imaginemos esta situação em nossas residências: se gastarmos mais do que arrecadamos, teremos que buscar dinheiro em bancos, em alguns casos usamos o famoso “crédito consignado”, obviamente o governo se financia de outras formas, mas concorre com o setor privado, o capital é sempre o mesmo. Quando isso acontece, o custo para o setor privado aumenta, inviabilizando os projetos de melhoria e investimento das empresas de médio e pequeno portes, que são as que mais empregam em nosso país.

Além disso, temos visto uma certa falta de coordenação nas decisões econômicas como a questão da desoneração da folha de pagamento que ocorreu ao final de 2023, uma decisão tomada pelo Executivo e que foi rechaçada pelo parlamento. Esses são apenas alguns exemplos aos quais recorro neste momento. São tantas situações que não teríamos “linhas” suficientes para discorrer sobre o assunto nesta entrevista.

Piracicaba terminou 2023 entre as cinco cidades que mais exportam no Estado de São Paulo. Como mensurar a importância dessa posição para o município?

Veja bem, temos que analisar este número. Quando falamos em exportação, temos uma multinacional que exporta para as outras unidades da própria empresa, o famoso intercompany, outra que vende para as suas concessionarias da América Latina, outra que vende commodities (açúcar). Juntas somam quase 85% destas vendas, ou seja, empresas piracicabanas exportam muito pouco pelo seu potencial. Somos uma cidade que tem em seu DNA a competência para construir outras fábricas. Piracicaba cresceu graças a uma família que foiàa frente do seu tempo e deixou um legado fantástico! Muitas das empresas existentes aqui surgiram por conta da abertura do mercado de energia que esta empresa iniciou lá no século 19. Para Piracicaba, é importante exportar, com certeza! Isso é um fato, mas precisamos reduzir o Custo Brasil para que sejamos um jogador mundial na questão de venda de produtos com valor agregado, que não sejam as commodities.

Quais medidas o senhor sugere aos governos das três esferas, para fomentar o setor?

Neste quesito, temos que ser bem cuidadosos ao falar sobre o tema, pois muitos podem achar que queremos voltar a uma fase da história das relações trabalhistas não cabem mais, mas acho que a sociedade precisa efetivamente ser ouvida, na esfera federal estamos vendo neste momento a questão da regulamentação dos motoristas de aplicativo. Pelo que entendi, eles não querem a regulamentação, mas sim a flexibilização das leis trabalhistas, pois muitos usam isso como segunda renda. O que quero dizer é que o governo não os ouviu antes de fazer uma mudança na lei. Isso é certo ou errado? Quem pode dizer? Mas até onde aprendi, todo poder emana do povo. Como, se ele não é ouvido?

Na esfera estadual, precisamos de mais agilidade em certas questões burocráticas, assim como uma atualização nas questões fiscais estaduais (ICMS). São muitas regrinhas criadas no milênio passado que não cabem mais hoje.

No âmbito municipal, precisamos de uma infraestrutura muito melhor do que aquela que temos hoje. O melhor distrito industrial da nossa cidade hoje é o Uninorte, que foi concebido pelo setor público, mas administrado sempre pelo setor privado. Eu mesmo o administrei por quatro anos, passando pela crise de 2018 e, mesmo assim, conseguimos dar a manutenção merecida a ele, que é um dos melhores do estado até hoje. Este ano temos eleições. Para o senhor, qual a importância do pleito municipal?

Precisamos entender que estas eleições são tão importantes quanto a de presidente, afinal de contas, a vida acontece no município, certo? O que eu tenho visto é que temos uma chance ímpar de mudança neste pleito, Piracicaba vem de uma casta política antiga, que está no comando da cidade há muito tempo e que, na minha visão, já prestou o serviço necessário à nossa cidade. Precisamos de outras perspectivas, a visão dos últimos prefeitos nos trouxe ao que somos hoje. O momento atual do nosso país e da nossa cidade necessita de uma pessoa que trabalhe em equipe, que conheça de fato a vontade da população após ouvi-la. Todos nós sabemos dos problemas de nossa cidade: desperdício de água (um problema abordado há, pelo menos, duas eleições), desvalorização do funcionalismo público, problemas de filas na saúde, transporte público ineficiente, falta de vaga em período integral nas creches, entre vários outros problemas que, com vontade e planejamento, podem sim ser resolvidos, talvez não totalmente em quatro anos. Só para se ter uma dimensão do problema, Piracicaba, segundo o site do Semae, tem mais de 1.500 quilômetros de rede de água; não podemos achar que isso será resolvido em quatro anos, mas se tivesse começado há alguns anos, hoje estaríamos desperdiçando muito menos que os 48% que desperdiçamos hoje.

Temos que entender que Piracicaba tampouco é comparável a outras cidades da região. Gerir cidades menores não capacita ninguém a gerir Piracicaba. É preciso conhecer não só a periferia, mas também o Centro, o comércio, a indústria, a saúde...  Enfim, nós munícipes temos que parar de ser saudosistas... Se um dia tiramos alguém da cadeira de prefeito é porque não estava agradando. Por que agradaria agora?

Vejo que é a hora de uma nova direção, não mais focada em uma pessoa, mas em uma equipe, Piracicaba merece ser mais bem cuidada, espero que o cidadão piracicabano pesquise quem é quem nesta eleição, quem não tem processo, quem já fez algo pelo município efetivamente e voluntariamente, ai veremos quem realmente ama a cidade e quem quer chegar lá simplesmente por pretensões pessoais.

Ainda na área política, Piracicaba tem três deputados estaduais, mas nenhum deputado federal. Em sua visão, qual o principal problema da falta de representatividade política em Brasília?

O grande problema de não termos conseguido eleger um deputado federal (e é o mesmo de alguns políticos que buscam ser prefeito) é o ego, pessoas que somente pensam em si. Veja quantos candidatos federais tivemos na última eleição. Sejamos sinceros: todos vereadores com mandato. Isso é correto? Temos que fazer uma grande coalização para elegermos um deputado federal. Se realmente nos uníssemos, teríamos feito, pelo menos, dois, mas infelizmente muitos se lançaram ao pleito simplesmente para deixar seu nome vivo na memória da população. Assim como um deputado estadual, o candidato a federal precisa ter relevância regional, ser conhecido em outras cidades, visitar, entender, enfim.

Enquanto não tivermos um projeto de uma Piracicaba melhor, em vez de projetos políticos pessoais, estaremos sempre na mesma situação e não teremos representação federal

Para o jovem brasileiro, qual a mensagem que o senhor gostaria de passar, em especial aquele das classes sociais menos ?

Sendo bem sincero nesta questão, acho que a minha geração deve pedir desculpas aos jovens. Temos complicado demais as coisas hoje em dia, julgando demais o nosso próximo, enquanto deveríamos estar nos unindo em busca de um país melhor. As divergências de opinião sempre existiram e existirão, mas não podemos perder o respeito, o amor pelo próximo. Vemos discussões em famílias, até briga pelo quê? Por política! Tá tudo errado!!! Precisamos nos respeitar mais, e se não concordamos com o rumo do pais, nos candidatemos, tomemos a rédea do nosso futuro e, sinceramente, espero que os jovens não cometam o nosso erro, de não se envolverem nas decisões do nosso país e depois ficar reclamando em rede social. Infelizmente é o que minha geração fez até o momento. Espero que isso mude, ainda dá tempo, e os jovens também precisam se envolver. Política pode parecer ruim, mas é ela que mostra o caminho de nossas vidas.

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