Continuando nosso tema sobre ciúmes, apresento agora a reflexão da colega Thays Babo, psicóloga clínica. Acompanhem:
"Como ciumento sofro várias vezes: porque sou ciumento; porque me reprovo de sê-lo, porque temo que meu ciúme machuque o outro; porque me deixo dominar por uma banalidade: sofro por ser excluído, por ser agressivo, por ser louco e por ser comum" (Roland Barthes - Fragmentos de um discurso amoroso).
“Ao ler esta breve descrição, a pessoa pode até se sentir compreendida e aliviada. Pode, por vezes, se assumir mais com tal ‘defeito de fabricação’ e, inclusive, reconhecer o quanto está errada, como é ridícula sua situação, ainda que com isto também assuma o quanto sofre.
Barthes descreve as ambiguidades vivenciadas: o ciumento sabe que é ridicularizado e que, portanto, não é desejável o ser; sabe que o ciúme provoca sofrimento ao outro e mesmo assim, o ciúme o corrói por dentro.
‘Sabe-se’ uma coisa e ‘sente-se’ outra. O racional briga com o emocional e pode limitar: ‘já que sinto ciúmes, não vou ter uma relação estável para não sofrer nenhuma traição’. Se o emocional ganha e o ciúme assume as rédeas, a vida a dois fica insuportável.
Por que o ciúme pode magoar tanto? Porque pressupõe que o outro não é confiável: ‘se eu não vigiar, ele/ela vai me trair’. Em alguns casos, também pode estar querendo dizer que ‘ele/ela é tão especial e eu sou tão medíocre que, é claro, serei traído/a. Assim, fica claro que o ciúme anda de braços dados com a insegurança.
A mensagem implícita pode ser: ‘se eu não (acredito que) tenho valor, serei rejeitado, serei excluído, serei traído’.
Há estudiosos do assunto que dizem que uma certa dose do ciúme, além de ser normal, é até bom, podendo inclusive ser estimulante para o relacionamento.
Para alguns, o ciúme é tido como prova de amor, como ‘tempero’. Mas, como qualquer tempero, em excesso, o sabor fica desagradável.
Para a corrente evolucionista, o ciúme foi construído ao longo dos milênios, por fins econômicos. Segundo esta ótica, há diferenças entre o ciúme feminino e o masculino: a mulher ciumenta teme que o homem tenha um envolvimento afetivo com outra mulher, levando a abandoná-la com a prole – o que dificultaria a sobrevivência da família. Já o ciúme do homem estaria mais ligado ao sexo, pois o homem se preocupa com a possibilidade de criar filhos de outro homem.
Mesmo com todos estes pontos de vista, o sentimento básico que está por trás da pessoa ciumenta é o de insegurança e uma falta enorme de confiança em si mesma".
"A liberdade é tão necessária ao amor, ao relacionamento com outros seres, quanto o ar que respiramos. Quando conhecemos alguém e por ele nos encantamos, encontramo-lo tal qual ele é - livre, dono de si e de suas vontades. Porém, muitas vezes, após estabelecer-se o vínculo afetivo, aprisionamos o ser amado, sufocando-o. Não sabendo lidar adequadamente com a força de nossas emoções, acabamos inseguros, deixando aflorar o sentimento de posse e o consequente medo da perda, desaguando no ciúme. Tornamos então cativos o objeto de nosso afeto. Criamos uma ‘realidade’ imaginária, fonte de tortura. Esquecemos de ver o outro como companheiro de jornada, espírito imortal fadado a muitas existências em busca do progresso; limitamos nosso horizonte ao imediatismo e, nesse afã, semeamos sofrimento em nós mesmos e naqueles que nos cercam, pois o ciumento deseja tornar-se o dono, possuir integralmente o móvel de seu desejo e para tanto não mede esforços ou percebe limites"
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