A palavra entusiasmo traz na sua etimologia a ideia de inspiração divina e significa, dentre outras acepções, alegria e encantamento. Esse estado pressupõe uma comunhão interior com o divino, por isso a pessoa entusiasmada, diante das dificuldades e problemas, enfrenta-os com alegria e otimismo, pois conta com os recursos interiores nos quais confia. Possui, igualmente, a capacidade de se encantar, enriquecendo o cotidiano com beleza, quando admira uma poesia, se enleva com uma música, contempla o nascer ou o pôr do sol, a chuva, as folhas levadas pelo vento, o canto dos pássaros, uma flor no caminho, o espontâneo sorriso de uma criança, os mais variados e ricos espetáculos da Natureza…
Infelizmente, nosso modo de vida tem se tornado tão sobrecarregado, ansioso e tenso que não nos permitimos experimentar a contemplação da beleza sequer por alguns instantes. Excessivas preocupações, ambições e temores, ao lado de uma rotina escravizante, limitam-nos as percepções a ponto de tolherem a sensibilidade às coisas mais simples e belas que estão diante de nós.
O modo de vida predominante em nossa sociedade agressiva, competitiva e consumista perverte a sensibilidade humana, desencorajando a percepção e a apreciação da beleza. Disso decorre a necessidade de nos conectarmos com nossa essência mais profunda, ao mesmo tempo com a fonte da vida que nos sustenta, a fim de nos sentirmos permeados por ela, tornando-nos capazes de perceber a beleza com os sentidos mais aguçados. Essa sensibilidade nos permite escolher aquilo que seja benéfico a nós tanto quanto aos demais, por exemplo em relação à arte que contemplamos, consumimos e compartilhamos, seja literatura, música ou filmes, a fim de que evoque o que existe de melhor em cada um e desperte a consciência para níveis mais elevados e puros. Sem esse estado de atenção e consciência, tendemos a reproduzir padrões deteriorados, os quais têm causado imensos danos, individual e coletivamente, destruindo e corrompendo valores, pervertendo a sensibilidade, condicionando gostos ao que seja perverso e degradante, induzindo ao vício, ampliando a alienação mental e expandindo as sombras sobre este mundo tão saturado de dores e sofrimentos.
Cremos que se torna, portanto, necessidade inalienável o reconhecimento, o cultivo e a valorização do belo como aquilo que promove harmonia e elevação, não permitindo que a sensibilidade seja destruída pela brutalidade predominante. Sermos sensíveis ao belo e ao sublime nos torna igualmente aptos a reconhecermos o que seja grosseiro e degradante, naturalmente evitando-os. Isso nos permite selecionar os estímulos que acolhemos e a que damos força, colaborando, com a parcela de responsabilidade que nos cabe, na melhoria da qualidade de vida mental e emocional da humanidade de que somos parte.
Se o mundo exterior, apesar de tantas mazelas, degradações e problemas, pode oferecer belezas e encantos a quem tenha capacidade de contemplá-los, que dizer do universo interior, infinitamente mais rico e belo, segundo aqueles que mergulham nele mais profundamente? Desenvolver e purificar a percepção torna-se, desse modo, processo valioso, pois possibilita a cada um experimentar a beleza externa ao mesmo tempo que expressa a própria beleza interior através daquilo que oferece ao mundo, permeando-o, assim como os relacionamentos, com energias capazes de lhes trazer novo colorido e harmonia, tão necessários quanto benéficos.
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