ARTIGO

Cristiano Zanin: Tenho esperanças

Por David Chagas |
| Tempo de leitura: 4 min

Acompanhei pari passu a entrevista do agora Ministro Cristiano Zanin. Torci por seu sucesso. É da terra e, tomara, ao longo de seus estudos tenha conhecido, ao menos, a ação de Antônio, nosso Santo Padroeiro. Declarou-se católico e se tem, nas sábias lições de Francisco, o Papa, modelo e exemplo, entenderá minha torcida. Se não leu, tomara leia, agora, o Sermão aos Peixes escrito há mais de trezentos anos pelo padre Vieira.

Guardei muito de sua fala. Apraz-me saber que afirma e reafirma estar subordinado à Constituição que muitos desobedecem e desrespeitam. Não bastasse, sua atuação como advogado é digna de apreço.

Ler e guardar comigo recortes que me norteiem os dias, em especial quando dito por magistrados, é velha prática minha. Nunca soube explicar a razão disto. Terá sido quando, na adolescência remota, por ter acalentado o sonho de mergulhar fundo na ciência do Direito? Ou por entender que, ao guardar textos e falas, poderia conferir se iluminados por seus textos atenderiam na ação a verdade ditada por sua própria consciência?

Ao despertar a palavra “que dorme na sombra de um livro raro”, diz o poeta, atente: ficará sendo sua, a palavra.

Conheci juízes notáveis. Aqui, inclusive. Um deles, desde a infância. Diplomata com quem trabalhei, afirmava: “não é a profissão a que nos dedicamos que nos faz, mas a mão que nos embalou o berço. Depois o exemplo de quem nos ensinou o caminho por onde andar”. Verdade!

Deste jovem magistrado, até o fim de seus dias precocemente interrompidos, o chamava pelo apelido da infância e, conhecendo a mão que o embalou e a forma como traçou a vida, sentia pulsar nele a grandeza de ser humano que era.

Juiz, levava consigo o sério compromisso de realizar o desejo de todo cidadão por uma sociedade justa, comprometida com direitos básicos, educação, saúde, trabalho e, sobretudo, acesso à justiça.

A leitura me permitiu saber mais e mais da vida. Jamais sonhei com vida fácil, como tantos, distantes das qualidades impostas por caráter e dignidade.

Neste país, tantas desigualdades impostas por dinheiro, cor, credo. Há quem se alimente destas injustiças movido por modelos sociais que conheço, mas discordo.

Quantos se valem disto para oferecer orientação diversa do que daria a cada um caminho digno, minimizando, assim, tamanha desigualdade entre tantos.

A dignidade se manifesta no respeito às diversidades culturais, à promoção do desenvolvimento social e à prática da justiça social que, no Brasil, não encontra forma de consolidar-se. Para mim, direito essencial é a educação. Em milhões e milhões de brasileiros quantos dispõem dela? Quem tem acesso? Os que alcançam este privilégio lutam para que os seus usufruam disto sem importar-se jamais com o outro.

Sei que alcançar este patamar não é fácil, em especial num país onde este e outros tantos temas fogem do conhecimento da maioria da população. O modelo de comportamento político é, sem dúvida, a forma mais severa de opressão. Raymond Radiguet, escritor francês morto aos vinte anos, pôde ditar que “o poder só se revela quando utilizado com injustiça”.

Desmond Tutu, bispo sul-africano, Prêmio Nobel da Paz, a quem pude conhecer um dia e com quem troquei conversas que me permitiram atentar com clareza ainda maior aos desenganos do mundo, ensina que “a opção pacífica perde o sentido se não tem possibilidade de ser eficaz. A violência é inquietante e inaceitável. Não há lugar para neutralidade. Quando você diz que é neutro em relação a uma injustiça ou opressão, decidiu apoiar o status quo do injusto. Não queremos ser amados por sermos bons. Somos bons porque somos amados”.

Assim temos vivido. Valendo-me, ainda, de Desmond Tutu, aceitar injustiças com neutralidade, silêncio ou estimulando o silêncio do oprimido afirmando antecipadamente que de nada adiantará fazer alarde de erros e injustiças cometidas, é chover no molhado, tapar sol com peneira, porque decisão, quem toma, são os poderosos, nem sempre alinhados ao bem-comum, prova evidente do lado escolhido.

Assistir a todo tipo de violência, de mentiras, de injustiças celebradas como se virtuosas fossem, e calar-se diante disto, postura neutra e condenável, apequena a condição humana e destrói a porção divina concedida.

 “A neutralidade, maneira cômoda, talvez, mas hipócrita, de esconder a opção adotada. Ou será medo de acusar a injustiça? "Lavar as mãos" em face da opressão é reforçar o poder do opressor, é optar por ele”.

Até aqui, do que vejo e sei, o jovem Ministro Cristiano Zanin parece conhecer seu país e acreditar, senão na possibilidade de mudança, na verdade, na correção da palavra, na justiça.

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