Pretendo usar de um silogismo que, de antemão, sei ser falso. Mas acredito nele. E, portanto, lá vai a lógica que ora me convence:
“Todo homem apaixonado emburrece. Lula está apaixonado. Logo, Lula emburreceu.”
Posta, pois, tal sabedoria de botequim, dela uso para reconhecer que desisti. Desisti de acreditar em que Lula esteja em condições de governar; desisti de esperar que o casal Lula/Janja se lembre de ter assumido a presidência da República; desisti de aguardar que acabe o assanhamento de uma lua-de-mel que, até agora, parece não ter fim.
Pode ser até inveja de minha parte, admito-o. Pois eu também ficaria muito feliz com poder ficar dia e noite namorando, por meses e meses a fio, com todas as despesas pagas por uma população paciente e generosa como a brasileira. Um povo de com compreensão e tolerância ilimitadas. Mas, seja o que for, desisti. E – admito também – passei a ter implicância em relação à dona Janja. Caramba, por que tanto ri ela? Por quê e do quê ri sem parar? Parece que pode acabar o mundo – como acabou para milhões de pessoas desempregadas e famintas – que Dona Janja continua rindo.
Ataca-me a tentação de estender à classe política, a governantes algo que, na vida de artistas e pensadores, é referencial: a criação mais verdadeira alimenta-se de carências, de sofrimentos, de ausências. Quando se está satisfeito, alegre, temporariamente feliz, tudo o que se cria se mostra leve, algo como um sonho bom. Pode ser a comédia, quem sabe? Mas – na angústia, na tristeza, na dor – a obra criada parece nascer de corações sangrando. E o drama da vida surge em sua face trágica. Deve ser por aí...
Insisto: estaria, o escriba, com inveja de Lula e Janja? Até pode ser, uma invejazinha que faz recordar outros momentos da vida. O escrevinhador, porém, não é presidente do Brasil e – ai que tristeza! – nem, pelo menos atualmente, está apaixonado. Em lua-de-mel, que casal irá se lembrar da miséria, de desemprego, de violência, de injustiças? Reconheço não saber se dona Janja fica ao lado do presidente em suas horas de trabalho. Em não ficando, porém, imagino Lula chegando de volta ao palácio residencial, sendo recebido pela amorosa esposa: “Ai, querido. Quase morri de saudade. Você não pode dar atenção mais ao Brasil do que a mim.” E, comovido, Lula responderia: “Minha querida, meu amor, meu docinho de coco. Nada, em todo o universo, é mais importante do que um simples sorriso seu, ó, vida minha!” E, então, ela sorriria ainda mais, mais ainda.
Não consigo explicar, mas, em dona Janja, vejo atitudes que me lembram, ainda que vagamente, algumas antigas primeiras damas deste país “abençoado por Deus e pela natureza”. A referida senhora, por exemplo, nada tem a ver com as antecessoras Darcy Vargas, Sarah Kubitschek, Ruth Cardoso. Dona Janja – e me desculpo se estiver equivocado – lembra-me algo de Maria Tereza Goulart, de Yolanda Costa e Silva, de Dulce Figueiredo, de Rosane Collor e, até mesmo, de Michelle Bolsonaro. Foram primeiras damas que mostravam ora belezuras cativantes ora mandonismo invencível. Insisto com mais ênfase no meu pedido de desculpas caso, ainda outra vez, o escriba esteja errado. Mas, em dona Janja, vejo tais belezuras e tal mandonismo. Bonita, mas mandona.
Enfim, pode ser apenas implicância – ou decepção – de alguém cansado de esperar acontecer aquilo que, enjoativamente, se entoa em nossa história: “Brasil, país do futuro.” Caramba, há mais de 80 anos espero a chegada desse futuro. Que, pelo visto, já chegou para Lula e dona Janja, um casal feliz de dar gosto.
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