ARTIGO

Escravidão e liberdade – 2

Por André Salum |
| Tempo de leitura: 3 min

A busca de liberdade é anseio compartilhado por todos, e cada um a seu modo, segundo sua história de vida, valores, propósitos e ideais, empreende a jornada existencial segundo o rumo escolhido. Ocorre que, por diversos motivos, certas escolhas, atitudes e comportamentos conduzem a armadilhas, labirintos e prisões psíquicos, dos quais, em algum momento, torna-se necessário sair, a custa de significativos esforços. Durante esse processo de mudança de trajetória existencial é preciso desvencilhar-se de aspectos comportamentais indesejáveis, disfuncionais ou degradados, após o que abrem-se possibilidades de se experimentar mais ampla liberdade.

Devido à predominância da personalidade em nossa vida, quando alimentamos o ego, satisfazendo-lhe desejos, ambições e caprichos, sentimos transitória e aparente satisfação, geralmente sucedida por frustração, temor ou ansiedade, ao lado do desejo de novas formas de satisfação, em círculo vicioso que conhecemos bem. Por outro lado, ao nos decidirmos, a partir da consciência espiritual, a restringir o domínio egoico, apesar de podermos sentir algum desconforto, internamente sabemos haver procedido corretamente ao transcender a predominância personalista. Nesse processo, sob uma estreita e superficial apreciação, podemos nos sentir inicialmente menos livres, ao nos submetermos à disciplina, obediência, purificação e educação dos nossos impulsos, condição que, enquanto o novo estado não se torne espontâneo, requer de nós um esforço inicial, até rompermos as resistências, cristalizações e condicionamentos. Essa submissão do ego, por paradoxal que nos pareça, é mecanismo libertador. Quem transcende a tirania do ego e age a partir de seu centro mais profundo, permitindo que as qualidades anímicas emerjam e se expressem mais livremente – como amor, sabedoria, criatividade, harmonia e paz – certamente conquista um outro patamar de liberdade, ao despojar-se de tudo o que constitui obstáculo a novas e mais amplas conquistas existenciais.

Se usarmos nossa relativa liberdade para escolher algo que nos degrada, limita ou vicia, estaremos construindo, mediante tais escolhas, as grades invisíveis da prisão em que nos prenderemos, até que, mediante novas decisões, seguidas de esforço, perseverança e ação correta, consigamos romper tais limitações.

Por outro lado, quando optamos pela disciplina, pela obediência aos ditames da consciência, privando-nos de satisfações egocêntricas que alimentem vaidade, orgulho e egoísmo, saberemos estar abrindo mão do que nos limita, cerceia e escraviza, tornando-nos aptos a receber bens maiores e mais duradouros.

Um processo consciente de autoconhecimento e autoeducação possibilita-nos uma gradual desidentificação com o ego (reconhecendo-o como a parte mais superficial e transitória do nosso ser) e uma progressiva abertura à consciência espiritual. Deixa-se, desse modo, de estar refém dos condicionamentos e insaciáveis desejos do ego, criando espaço interior para que a existência seja preenchida pela luz da alma, com seus atributos curativos e libertadores. Essa comunhão consciente com os níveis mais profundos do ser traz serenidade, harmonia e paz desconhecidos do ego. Essa paz interior tem sido anunciada pelos instrutores espirituais que nos convidam a experimentá-la, desse modo libertando-nos de conflitos, desarmonias e aflições. Paz interior tão almejada quanto necessária, especialmente nos tempos atuais.

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