Garimpando algumas anotações encontrei este artigo interessante que uma colega de profissão me passou há algum tempo atrás. Acompanhem!
“Será que a imagem do gordinho simpático e engraçado que está presente em nosso imaginário estaria mudando? Essa questão me ocorreu uma vez após ouvir o relato bastante curioso de uma adolescente. A garota dizia que a mãe e os irmãos a faziam passar por um verdadeiro terrorismo, e tudo por causa do seu sobrepeso. Os questionamentos feitos por essa adolescente e todos aqueles que apresentam (ou apenas pensam ter) algum sobrepeso e se sentem motivo de vergonha para a família, são muito profundos.
Em todo mundo, vemos pessoas em busca de alternativas imediatas para o excesso de peso. As motivações variam: algumas vezes é motivo de saúde, muitas vezes desejo de possuir um corpo perfeito. De fato, a obesidade não está apenas na cabeça das pessoas, mas ela está também no corpo, de fato. O excesso de peso tem sido tratado como doença ao mesmo tempo em que a mídia exibe corpos esculturalmente magros.
Uma curiosidade: a comida em excesso passou a ser bem vista na Europa na passagem do século VIII para o XIX, quando a ascendência da burguesia tornou a gordura um símbolo de riqueza e distinção social em oposição ao povo comum. A partir da década de 60, no entanto, o aumento na oferta e no acesso aos alimentos aumentou o peso da população como um todo.
O processo terapêutico pode ajudar no emagrecimento: na maioria das vezes uma pessoa vai ao consultório após várias tentativas frustradas de dieta.
No setting terapêutico, queremos saber do vazio, da angústia daquela situação, da insatisfação por trás da comida. Procuramos entender o que acontece no inconsciente daquela pessoa que busca sempre a mesma forma de conforto, mesmo a vida oferecendo um leque vastíssimo de opções para o apaziguamento da dor, tais como trabalhar, criar, se divertir, se relacionar, entre muitas outras.
O obeso acaba se acostumando a não falar do seu peso, daquilo que o incomoda de forma verdadeiramente íntima. É como se estivesse em permanente castigo, adiando a própria vida: faz planos para quando emagrecer. E enquanto o peso ideal não chega, ele não ‘pode’ viver (adiar a vida gera ainda mais angústia).
A terapia é um espaço para que o paciente obeso fale da dor de não conseguir fazer aquilo que lhe é imposto.
Ao longo das sessões, vão aparecendo as relações interpessoais, o incômodo em viver numa sociedade onde prevalece a valorização exacerbada da aparência, as crises profissionais num mundo extremamente competitivo. Enfim, questões tão comuns na contemporaneidade e que acabam por gerar nas pessoas as mais variadas compulsões, tais como consumismo desenfreado, alcoolismo, drogadição, e também a compulsão alimentar. As angústias que aparecem na maioria das pessoas são vividas, pelas pessoas obesas, como um vazio a ser preenchido pela comida.
Durante o tratamento terapêutico é oferecida a possibilidade de trabalhar com as causas que geram esse vazio, com os sentimentos de desamparo, fraqueza, e de que maneira isso conduz a uma falsa solução, a comida.
O processo terapêutico conduz a uma percepção que pode gerar escolhas importantes frente aquilo que incomoda o paciente. A ideia é perceber que conviver com a ‘falta’ e olhar para ela é um meio de se buscar as faltas reais, pois buscar prazeres menos fugidios do que o alimento, não traz consistência e nem satisfação a longo prazo.”
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