ARTIGO

Falar e calar

Por André Salum | 17/02/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Detentores da habilidade da fala, a qual nos possibilita expressar ideias, ideais e sentimentos, ainda somos relativamente inconscientes, portanto inconsequentes, quanto à força criativa da palavra. Pelo poder intrínseco que carrega, a palavra pode construir tanto quanto destruir, o que nos confere a responsabilidade pelo que proferimos e pelas consequências daí advindas.

Nossas palavras são energias ofertadas aos outros, ao mundo e à vida, portanto somos responsáveis pelos efeitos, diretos ou indiretos, ostensivos ou sutis, imediatos ou de longo prazo, que venham a produzir. Estamos longe de compreender o papel que nos cabe no emprego de dom tão valioso quanto o da fala, pois temos, como humanidade, degradado seu uso, tanto quanto o dos demais recursos que a vida nos disponibiliza.

Usar a palavra como ferramenta para a difusão do bem é uma arte ainda pouco compreendida e menos ainda praticada por nós, como evidenciam os conteúdos de nossa comunicação habitual. Ainda se nos afigura difícil falar apenas o que for bom, ou permanecer em silêncio, pois sentimos uma necessidade compulsiva de falar, expressar opiniões, exteriorizar pontos de vista, manifestar desejos pessoais, comentar sobre a vida alheia.

Frequentemente falamos mais do que deveríamos, de modo nem sempre ponderado, respeitoso ou construtivo, razão pela qual ainda carecemos de correta educação no uso de bem tão precioso. Se fôssemos coerentes com as crenças religiosas que afirmamos professar, utilizaríamos a palavra para ensinar, perdoar, motivar, pacificar, curar e abençoar, o que se mostra distante de nossa condição atual. Tal fato não deve nos desmotivar, mas pode ser estímulo às transformações que podemos e devemos realizar nos mais diversos setores de nossa vida, dentre eles o da fala.

É conhecido nas tradições espirituais o poder das palavras, tanto que nelas existem, além das orações, as bênçãos, que são votos de felicidade e proteção espiritual formulados em favor de alguém, e os mantras – conjunto de sons utilizado para aquietar e estabilizar a mente, elevar a consciência, louvar, orar, dentre outras finalidades. Qualquer que seja o uso religioso ou ritual das palavras, só terá valor se realizado com reverência e pureza de intenções, obedecendo a propósitos elevados, já que, tão importante quanto o que se diz é a intenção por trás daquilo que se verbaliza, pois a intenção permeia com energias correspondentes aquilo que se diz.

Em qualquer fenômeno de comunicação, som e silêncio complementam-se, e mais difícil do que falar é saber calar. Silenciar conscientemente requer equilíbrio emocional, autocontrole, vigilância e compreensão. Fazem-se necessários sabedoria e bondade para calar críticas, julgamentos, comentários depreciativos, preconceituosos ou maledicentes em relação a quem quer que seja, principalmente quem não nos partilha o modo de ser, pensar e agir. Além disso, saber calar, verbal e psicologicamente, para dar espaço ao outro, é necessidade vital de qualquer convívio saudável.

Os indivíduos sábios e amorosos mais calam do que falam e, quando o fazem, oferecem pela palavra algo benéfico e proveitoso a quem os ouve. A fala de quem despertou a consciência espiritual contém ensinamentos úteis e é permeada de energia amorosa e curativa, portanto benéfica a quem se disponha a ouvi-lo. A conquista de tais seres é exemplo vivo de que valorizar o dom da palavra, comunicar o bem e construir através do verbo é possível a todos os que se disponham a fazê-lo.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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