Nascida no Paquistão, na cidade de Rabwah, Anila Zafar está no Brasil desde 1994. Formada em Artes pela Girls College de Rabwah, já foi corresponde da Comunidade Ahmadia em Sindh (1988 – 1989) e em Lahore (1989 – 1990) e secretaria de Educação da Comunidade em Rabwah (1990 – 1994). Em 1998, se tornou a primeira presidente da Associação das Mulheres da Comunidade Ahmadia do Islã no Brasil, situada em Petrópolis, no Estado do Rio de Janeiro, onde atua até hoje.
Em uma visita feita ao Jornal de Piracicaba, ela contou sobre as distorções que são feitas da mulher islâmica pelo mundo, esclarecendo os seus direitos e como atos terroristas mancham não somente a imagem das mulheres, como de toda a religião do Islã. A presidente ressaltou sobre os choques culturais e o preconceito, que ainda faz com que as pessoas tenham medo de se aproximar dos muçulmanos.
Anila afirma que a comunidade está aberta à todas as mulheres que tenham interesse em saber como o Islã, de fato, é de verdade.
Qual éocompromisso e como a Associação das mulheres atua dentro da comunidade?
A Associação tem o compromisso de espalhar a mensagem do Islã para todos entenderem como é. Também educamos as crianças, as mulheres, ensinamos as orações, sobre o Sagrado Alcorão e como devemos ajudar as pessoas. Dentro da organização, que foi fundada em 1922, as mulheres são divididas em dois grupos: de 7a15 anos e dos 15 acima. Fazemos atividades, reuniões e jogos. É tudo separado dos homens.
A comunidade está aberta para mulheres brasileiras?
É uma religião universal, então há mulheres islâmicas, brasileiras, mulheres que nasceram aqui no Brasil e outras que se converteram. Muitas entram sem vínculo à religião.
Hoje em dia há um preconceito com a religião. Aqui no Brasil, ainda sente que as mulheres muçulmanas sofrem preconceito?
Acho que já está mudando. Eu já senti mais, mas agora as pessoas já conseguem entender melhor. Ainda tem, mas melhorou bastante. Eu não sabia falar português e ficava com medo de sair, as pessoas também ficavam olhando e às vezes ficamos constrangidas. Muitas pessoas não se aproximam porque a imagem do Islã está espalhada pela mídia de forma negativa. Eles dão uma notícia de um ser humano terrorista, mas é importante ressaltar que em todas as religiões há pessoas boas e ruins. Se uma pessoa é católica, por exemplo, e faz algo ruim, não é mencionado a religião. Isso faz com que as pessoas fiquem com medo de se aproximar. Muitas têm dúvidas e não perguntam. Sempre é bom perguntar para esclarecer, ou então sempre haverá a dúvida.
Quais são as maiores diferenças culturais entre as mulheres brasileiras e islâmicas?
Aqui no Brasil, as pessoas têm a imagem de que a mulher islâmica não pode estudar, trabalhar, dirigir um carro, não pode sair e deve ficar presa. Mas não é nada disso. As mulheres saem, dirigem seus carros, fazem o seu trabalho e estudam. Na época do santo profeta, as mulheres já iam junto para ajudar na guerra e no dia a dia. Isso nunca foi proibido. Aqui tem uma imagem errada. O Islã já deu esse direito há muito tempo.
A mulher pode trabalhar e ter o seu dinheiro. Mas, por exemplo, se ela tiver crianças, ela pode trabalhar, mas o foco principal é cuidar das crianças para que quando eles cresçam se tornem cidadãos. O que a mãe ensina a um filho, os outros não podem educar porque a mãe tem amor por aquela criança. A professora se não receber o salário fará a greve, mas a mãe pode fazer?
Ela também tem direito à educação, a trabalhar fora de casa, mas sempre importante manter a dignidade. Além disso, no Alcorão diz que as mulheres devem evitar homens. Quando você sai na rua, não sabe se é perigoso ou não, então podendo evitar é melhor.
A mulher tem o direito de escolher o marido e, se por acaso não combinarem, pode acontecer o divórcio. É permitido, mas não é recomendado. Assim como também ela poderá casar-se novamente.
Já a poligamia é permitida, mas não é ordenado. Mas há condições: o homem precisa pedir a permissão da primeira mulher para casar-se com outra. Normalmente, eu não vejo isso. Na minha família não houve ninguém. Os direitos precisam ser iguais: se dá uma casa para uma, a outra também precisa ter. Cada um tem que pensar bem antes de casar de novo.
Eu acho engraçado por aqui no Brasil as pessoas falam de poligamia, mas sabemos que há aqui também. O homem tem esposa em casa e na rua tem outras, porém, na maioria das vezes, a mulher não sabe. No Islã, a mulher já sabe o que está acontecendo.
Qual o maior choque cultural que sentiu quando chegou ao Brasil?
O primeiro foi de mulheres grávidas que mostram a barriga e fazem chá de bebê. Foi estranho para mim. No Islã há uma certa timidez em relação a isso. Falar nesse assunto é algo muito pessoal, as mulheres usam roupas soltas para que outros e até membros da família não percebam.
O código da vestimenta é realmente algo forte lá?
Sim. Mas há certo fanatismo também. Quando as mulheres são agredidas ou mortas, o Islã não permite isso. Nosso ensinamento é de amor e tratar as mulheres com respeito, não de agredir. Os exemplos que vemos na mídia, não são ensinamentos do santo profeta. Se eles estão fazendo, estão fazendo uma coisa errada e manchando o Islã. A palavra “Islã” literalmente significa paz. Costumamos falar “Que a paz de Deus esteja com você” e respondem “Que a paz de Deus esteja contigo também”.
Quando vemos notícias de mulheres ou homens bombas é a representação do fanatismo. Isso é suicídio e, dentro do Islã, é pecado. Ele se mata e mata outros também. No Islã, isso é ilegal. O suicídio não é permitido em nenhuma das religiões porque a vida é um presente de Deus. Quando a vida é tirada, é o mesmo que não querer esse presente. Eles fazem em nome do Islã, mas o santo profeta nunca permitiu isso. Durante a Guerra, ele nos deu o ensinamento para não matar nenhuma mulher e nenhuma criança, e assim deixá-los em paz.
O que fazem é contra o Islã e não são todos que já leram o Sagrado Alcorão, então as pessoas não sabem como é.
Quais são as consequências de quando esse código é quebrado? A mulher sofrerá alguma retaliação?
Não. Eu morei no Paquistão e há mulheres que não usam o véu. Há muitas mulheres que usam calça jeans e blusas. E está tudo bem com isso. A roupa faz parte da religião e o ensinamento é: usar roupa e construir casa, hoje em dia é ao contrário, é tirar roupa e desconstruir casa.
Cada profeta veio e deu um ensinamento que aquele povo poderia entender. Nós acreditamos que o santo profeta veio por último e deu aquele ensinamento no Sagrado Alcorão, que é completo.
A doutrina não tem um castigo físico, mas às vezes eles acusam mulheres de adultério e, para isso, é necessário trazer quatro testemunhas. E, se a acusação não for verdade, há castigo para quem acusou. Isso também serve para as mulheres que acusam um homem.
A questão é: se você estiver dentro de uma religião, deverá respeitá-la. Porém, infelizmente, os fanáticos estão aplicando castigo e punições. Isso é contra o Islã.
Hoje há mais de 40 países islâmicos no mundo e nenhum há fábrica de arma. Então, o que está acontecendo? São os poderes do mundo. Eles dizem que querem estabelecer a paz, mas fornecem uma arma.
Quais são os principais ensinamentos do Alcorão?
Em geral é ensinamento de paz e amor. Lá é permitido apenas fazer uma defesa, mas porque se não houver isso, nenhuma religião será defendida. É o ensinamento de ajudar o próximo, respeito com pais e amor pelos filhos, para que seja uma sociedade calma. Quando um filho é criado com amor e carinho, ele passará isso para os outros. Uma pessoa sem amor não é boa para a sociedade. O Islã traz muito essas questões. Também é cuidar do próximo. Quando uma pessoa está doente, você precisa visitá-la e rezar para ela.
No Alcorão os homens e mulheres nasceram de um ser e isso significa que não há diferença, o que muda são as responsabilidades. A mulher pode dar à luz, mas o homem não. Já o homem é mais forte fisicamente, a mulher não. O Islã tem todos os direitos.