Garoa, Sai dos Meus Olhos

Por David Chagas | 28/01/2023 | Tempo de leitura: 4 min

Faz-me um bem enorme esta cidade que amanhece trabalhando e conta, agora, 469 anos, em plena ebulição. Estando nela sinto as vibrações das canções de Rita Lee, a mina de Sampa, ela e outras, como ela, branquelas, porque sua praia é o Ibirapuera e entre noite e dia há sempre uma garoa fina embranquecendo tudo.

Para mim, São Paulo é o que Rita faz e diz: “Gosto às pampa! As mina de Sampa estão na moda, na roda, no rock, no enfoque!” Com Rita, a mais completa tradução de São Paulo, genial, visão de mundo sempre à frente de seu tempo, impossível não sentir a metrópole em toda sua grandeza e graça.

Dos 400 anos, quando, ao lado de meus pais, lá estive, na memória, a voz jovem e marcante de Inezita Barroso contando histórias de uma São Paulo calma e serena, pequena, mas grande demais, papéis prateados lançados sobre todos, a Banda da Polícia Militar, impecável, revelando, desde então, a qualidade do Barro Branco e uma multidão que, se comparada aos aglomerados de hoje, era nenhuma.

Os papeizinhos ao vento revelavam, no brilho e na cor, o sol da cidade. Guardou-se, por anos, um papelote daqueles para que as crianças entendessem o valor disto. Crescidos, pudemos saber, no formato (o mapa de São Paulo) e na cor, a importância de ser paulista.

Confesso ter pelo Brasil o mesmo sentimento de amor. São Paulo, no entanto, de uma forma ou de outra, recebe afeto e respeito distintos aos que ofereço a outros brasis da minha pátria. Onde estive e estou, impossível não sentir o pulsar do coração ao revisitar lembranças deste chão, terra de manhãs de terra rocha adornada pela soldadesca verde que salta morros na distância iluminada.

Se na cidade, minha alma se junta à sua alma. Revisito parques, jardins, alamedas, e me envolvo no ir e vir pelos bairros. Caminhar em ruas e avenidas, por entre arranha-céus e casas. Os locais onde vivi anos de minha vida, Vila Madalena, Bela Vista, Jardins, Santa Cecília, como os conheço! Rever a Cidade Universitária e perambular por caminhos de saber e de liberdade.

Gosto de São Paulo!

Cidadão do mundo, sempre tenho, pelo local onde estou, gratidão sem limites. Ter sabido reconhecer neste mundão de Deus, em cada local, meu naquele instante, o pão nosso onde Deus dá, é lição aprendida em São Paulo, terra de todos e para todos, sem distinção alguma.

Entender, respeitar e reconhecer diferenças, reconhecer no outro sua imagem, semelhança sua, entre milhões trançando pelas ruas, sem perder jamais a referência é sentir, em si, a grande cidade grande aninhada no coração.

“Garoa do meu São Paulo, / -

Costureira de malditos – / Vem um rico, vem um branco, / São sempre brancos e ricos...”

“Garoa, sai dos meus olhos...”

Por vezes roguei a Deus que a cidade onde estava copiasse São Paulo, não na velocidade em que caminha, mas na forma como acolhe quem está nela, valorizando talentos, reconhecendo a comunhão com o outro, na maioria das vezes, sentindo o palpitar do futuro em cada passo.

Não verei, bem sei, os quinhentos anos de São Paulo, mas sonho. Por certo, não mais papéis prateados sobre a multidão. Haverá, espero, o reconhecimento, a remembrança de José e Guita Mindlin, Antônio Cândido, Cassiano Ricardo, Zé Miguel Visnick, Paulo Vanzolini, Tomie Otake, Pelé, Renato Teixeira, Adoniran Barbosa, Volpi, Portinari e outros tantos. O acervo de seus Museus, o despertar da ciência no Butantã, nas Universidades, a beleza do Ibirapuera, do Trianon. O Marco Zero, o pátio do Colégio, o Largo de São Bento. O Edifício Copan. O Conjunto Nacional.

Tomara não haja mais, nos quinhentos anos, miséria, fome. Nem tormenta. Nem falsas notícias que políticos, no plantão da vida pública, costumam difundir. Tomara Júlio Lancelotti, seguidor inigualável da verdade de Jesus Cristo, tenha conseguido abrir os olhos de muitos mais, amealhando seguidores para caminhada na trilha da Verdade e da Vida.

São Paulo há de avançar com humanismo. Pujante como sempre soube ser, provocando mudanças de comportamento sem deixar o progresso, sem perder o sentido pleno da vida.

Que meu bom desejo e minha esperança se esparramem pelos municípios paulistas, do litoral ao interior, e suas regiões sejam moldadas por homens dignos, capazes, bem formados por Educação de qualidade.

Este meu sonho é fruto, por certo, do que seu patrono, Paulo, o Apóstolo, registra com igual esperança, nas cartas que escreve. Pretensiosamente faço aqui, na expectativa de que me leiam e entendam como aconselhamento pelo bem comum dos paulistas, tendo como base, a justiça.

Ver São Paulo sem embaçamento. Ouvir São Paulo, em especial, o timbre triste de martírios. Vestir-se com suas cores, incorporar seu jeito, alargar ainda mais o coração da cidade, para acolher sem distinção. Respirar fundo e repetir o mantra: “alguma coisa acontece no meu coração que só quando cruzo a Ipiranga e a Avenida São João.” Em São Paulo!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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