Por Érica Gorga
Não é despropositado dizer que todos os cidadãos brasileiros hoje correm o risco de serem interpelados por agentes da polícia federal por emitirem opiniões, críticas, ou até simples curtidas em tom de ironia, humor, deboche, decepção ou até irritação momentânea em comunicações privadas em seus aparelhos celulares.
A rigor, pela Constituição Federal brasileira, todos deveriam ter o direito de manifestar o seu pensamento livremente. Rege o artigo 5?, inciso IX, do diploma constitucional que, no Brasil, “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.”
Nesta semana conhecidos empresários brasileiros foram alvo de operações da polícia federal, com tomada de depoimentos e imposição de bloqueio de bens, quebra de sigilo bancário e bloqueio de redes sociais, ações autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro. Tudo por questionarem a segurança das urnas eletrônicas e a lisura do processo eleitoral brasileiro em grupo privado de WhatsApp e supostamente terem defendido medidas inconstitucionais (suposto golpe). Ocorre que não havia vestígio de nenhum planejamento ou ato concreto que pudessem caracterizar ameaça real à democracia brasileira por parte desses empresários.
A questão central é que, independentemente de se concordar ou não com o teor das comunicações travadas no grupo de WhatsApp, não é, juridicamente, sustentável que o STF tenha expedido mandados contra pessoas que não têm foro privilegiado, no caso, empresários que, na hipótese de terem infringido a Lei, deveriam ser processados pela primeira instância, tal como o foi o ex-presidente Lula. Os mandados são inconstitucionais, pois o STF não tem competência constitucional para emiti-los.
O mesmo STF que libertou Lula após recursos em todas as instâncias judiciais (primeira, segunda instância e Superior Tribunal de Justiça, que caracteriza a terceira instância de revisão) agora suprime o direito constitucional de brasileiros comuns de serem processados em PRIMEIRA INSTÂNCIA. Assim, a indagação a ser feita é: por que Lula pôde ser processado em primeira instância e esses empresários não podem? É evidente o contraste que mostra que as normas processuais, isto é, as regras do jogo, não estão sendo respeitadas pelo próprio juiz da partida.
Ao que parece, supremas autoridades da República, em nome da justiça, estão acabando com a liberdade de expressão no Brasil, cerceando pessoas em suas comunicações em grupos privados sem observação do rito processual previsto no ordenamento jurídico brasileiro. Estamos vivendo hoje o período mais sombrio da história brasileira desde o AI-5 do regime militar.
Além disso, autoridades brasileiras responsáveis pela justiça estão deturpando o papel da própria polícia, colocando-a para perseguir pessoas comuns por suas meras palavras ou curtidas em redes sociais, ao invés de buscarem prender os bandidos, assassinos e narcotraficantes do país. E - pasmem! - todo esse circo está sendo custeado pelo dinheiro dos pagadores de impostos brasileiros, inclusive dos próprios empresários atingidos.
Muitos reclamam que a advocacia brasileira está silente, sem se posicionar expressamente contra tais desmandos inconstitucionais. Na nua e crua realidade, a advocacia se encontra de mãos atadas, calada e acuada por uma simples razão: o risco de retaliação nos processos que defendem perante os juízes das cortes superiores. Em todo esse contexto, não é compreensível que os advogados temam retaliação a seus clientes caso tomem posição de afrontar o ministro togado?
Urge que o Congresso Nacional assuma a sua função constitucional de preservar a democracia brasileira, que não se trata de supremocracia.
LEIA MAIS