Por Cecílio Elias Netto
Seria profundamente enriquecedor se olhássemos as candidaturas de Simone Tebet e Mara Gabrili muito mais como um ato de alta significação política e não apenas eleitoral. E por Política – além de outros entendimentos – refiro-me ao conceito aristotélico que a vincula ao direito e à moral, investigação em torno do bem. As duas ilustres mulheres dizem-nos mais do que uma teoria de Estado, mais do que uma arte e ciência de governo. E mais, também, do que uma ação feminista. Simone e Mara falam-nos de uma reviravolta humanitária pela qual o mundo reclama nestes tempos brutalizantes.
São duas mulheres exemplares que enfrentaram preconceitos quase que eternos nas disputas de políticas de governo, demonstrando competência e responsabilidade. Está evidente que, nesta campanha eleitoral, elas não serão vencedoras. E, mesmo que viessem a sê-lo, teriam imensos empecilhos para governar. Em especial, Mara Gabrili, heroína tetraplégica, que tem dado extraordinários exemplos de participação e de eficiência. O respeito por elas aumenta se olharmos tais candidaturas pela óptica de uma busca universal. Pois o mundo reivindica a retomada do princípio de tudo: a Mãe Terra, a generosidade da mulher, o cuidado feminino.
Desde os 1960, as mulheres retomaram lutas antigas por seus direitos e pela dignidade humana. Muito já se conquistou. Mas longe estamos, ainda, para devolver à Mulher o lugar especial que foi seu desde o início da aventura humana. Pois, ainda hoje – e nestes anos de loucura presidencial em Brasília – há clara evidência da misoginia oficial que parece comprovar, ainda, a sobrevivência do espírito das trevas, da caça às bruxas. O que aconteceu no século XIII até o XVIII– a Inquisição, a loucura do livro “Malleus Maleficarum”, a vinculação da mulher ao diabo – ainda repercute em contextos e métodos diferentes.
Brasília tem medo da mulher. Parece estar viva a crença de que mulher deve limitar-se à tríade casa-cozinha-igreja. Tanto assim é, que o espaço feminino tem sido ocupado por pastoras, evangelizadoras, evocando antigas profetisas. O espírito militarista em governos aferra-se à concepção masculina de combate, de confronto, de segurança. Quando dois militares se candidatam à presidência e à vice, confirmada fica a aversão a governos civis.
Ao questionar-se sobre suas origens, o ser humano viu, na mulher, a doadora da vida, símbolo da fertilidade também das colheitas e dos animais. O macho sequer sabia possuir um sêmen que fecundava a fêmea. Ela, a mulher, era o princípio da vida. Por constar, no Gênesis, que Eva nasceu de uma costela de Adão – e de uma costela torta, dizem! – os inquisidores concluíram que “nenhuma mulher pode ser reta”. Está lá, no “Malleus Maleficarum”.
Há – creio nisso – uma nostalgia do matriarcado na humanidade. O patriarcado ainda se apega à pretensa primazia do poder, do conhecimento, o que conduz à manipulação, controle, violência. O mundo – agoniado – está, porém, em busca da paz, da confraternização, do retorno à natureza.
Simone Tebet e Mara Grabilli não têm qualquer possibilidade de chegar ao governo da Nação. No entanto, suas candidaturas são um clamor perturbando o silêncio dos comodismos. Ora, quem cuida da casa? Quem cuida dos filhos? Quem mantém a união da família? É a mulher. O Brasil é nossa casa comum, o povo brasileiro somos uma família. Há, sim, nostalgia da Mãe Terra, do feminino em nossas vidas.
Encerro com as palavras da pensadora Marilyn French: “No princípio, era a Mãe. O Verbo veio depois”.
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