Por André Salum
Desde a infância, a partir de quando tomamos consciência de nossa individualidade, começa um processo de identificação com diversos aspectos do nosso ser. Na sociedade predominantemente materialista, imediatista e consumista em que vivemos essa identificação se dá com nossos aspectos mais superficiais. Somos estimulados pelas demais pessoas, pela sociedade, pela mídia e pela propaganda a nos identificarmos com o corpo físico, a aparência e as funções que exercemos, com atividades familiares, profissionais, sociais, religiosas. A não ser que estejamos em atenta busca de nos conhecer em profundidade, nos identificamos de modo crescente com tais condições.
Além da identificação com a forma física e tudo o que dela decorre, podemos nos identificar com padrões de pensamentos, de reatividade, com ideologias e preconceitos, o que, em determinado ponto da jornada evolutiva, precisa ser transcendido. Nossa mente, com suas ideias, crenças, preconceitos, temores e ambições (muitos dos quais herdados de passado remoto e cristalizados) vai sendo moldada, muitas vezes sem que nos apercebamos do quanto reproduzimos aquilo que atende a interesses diversos, muitas vezes indignos. Ao nos submetermos a tais condicionamentos, limitamos nossa expressão anímica e passamos a apresentar comportamento formatados segundo padrões e influências nem sempre nobres ou saudáveis.
Precisamos de um certo nível de percepção livre e lúcida para que possamos enxergar os fatos, compreender as relações e o que existe além das aparências e perceber, tanto quanto nos seja possível, as lições e os aprendizados intrínsecos a cada situação da vida.
Da mesma forma que devemos cuidar da integridade e da saúde físicas através de movimento, repouso, alimentação e higiene, torna-se necessário cuidar da higiene emocional e mental.
Em certa fase do desenvolvimento consciencial, a mente racional torna-se incapaz de resolver muitos dos complexos problemas existenciais. A atuação da mente certamente é necessária, desde que funcione com lucidez e clareza, porém não é suficiente, pelas suas próprias limitações, pois são necessárias outras percepções e diferentes ferramentas que provêm do interior, como a intuição. A verdadeira intuição (não as fantasias nem a simples projeção das próprias ideias) que brota do mais profundo do ser trazendo percepção clara e aguçada traz respostas que a mente convencional é incapaz de proporcionar.
À medida que nossa percepção interior se torna mais aguçada, retiram-se sucessivamente os véus, primeiro os mais grosseiros, permitindo-nos acessar, reconhecer e valorizar dimensões cada vez mais sutis da vida e de nós mesmos.
Através dessa jornada interior vamos nos descobrindo, tanto quanto aos demais, como vida e consciência, e por essa percepção e compreensão mais profundos as barreiras que nos separavam, criadas por nossa própria ignorância, gradualmente se desfazem, perdendo o sentido e o poder que até então lhes atribuíamos.
O reconhecimento desse processo e a consequente libertação que proporciona podem ser compreendidos como sendo de natureza religiosa, permitindo-nos ver mais claramente nossa realidade espiritual, despertando e fortalecendo um genuíno senso de fraternidade e consequentemente de compaixão, respeito, paz e harmonia, cooperação e celebração da vida, o que é ao mesmo tempo educativo e curativo, ao erradicar do nosso coração o tanto de egoísmo que ainda nos impede de conviver como irmãos da imensa família humana.
LEIA MAIS