Pachorra

Por Rubinho Vitti |
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Por Rubinho Vitti

No dicionário Priberam da língua portuguesa, “pachorra” é uma palavra feminina que vem do espanhol e significa “capacidade de tolerar contrariedades, dissabores ou incómodos com calma ou resignação”, sendo relacionada ainda à falta de pressa, lentidão e fleuma. Mas no dia a dia ela ganhou outro significado.

“Pachorra” nada mais é que cara de pau, no pior dos sentidos. Ou seja, quem tem “pachorra”, tem a coragem esdrúxula de dizer algo, de expressar ideias tortas ou falar asneiras, por exemplo.

Dito isso, preciso dizer que “pachorra” deve ter sido o termo que mais utilizei neste ano a cada vez que ouvia ou lia uma nova frase estúpida dita pelo presidente da República. “Como ele tem a pachorra de falar isso?”, indaguei-me infinitas vezes.

Afinal de contas, o que Bolsonaro diz por aí é de um nível alto de ignorância e difícil de superar, apesar de haver quem concorde -- o que, para mim, é ainda pior.

Mas concordar com uma pessoa tão vulgar é ser conivente -- e diria, cúmplice -- de suas ideias bizarras. Foi assim com falas de Bolsonaro sobre os mortos pela Covid-19, as vítimas de tortura da ditadura militar, os índios, os LGBTQIA+, os quilombolas, sem-terra, sem-teto, e por aí vai.

A última “pachorra” de Bolsonaro foi a respeito do jornalista inglês Dom Phillips e o indigenista pernambucano Bruno Pereira, que desapareceram na floresta Amazônica, no início de junho, enquanto trabalhavam junto na apuração de fatos para um livro-reportagem investigativo que estava sendo escrito pelo britânico.

Antes mesmo de qualquer pista, na ânsia de expressar sua falta de empatia, Bolsonaro os responsabilizou por qualquer que fosse o desfecho.

"Realmente… Duas pessoas apenas, em um barco, em uma região daquela, né, completamente selvagem, é uma aventura que não é recomendável que se faça. Tudo pode acontecer. Pode ser um acidente, pode ser que eles tenham sido executados", afirmou. Depois, mentiu, dizendo que não houve autorização da Funai para que eles estivessem ali. “Acontece, as pessoas abusam, né”, disse.

Não suficiente, Bolsonaro ainda culpou o jornalista inglês por ter feito “uma excursão” em uma região onde “não seria bem visto” por fazer matérias “contra garimpeiros”, que, aliás, são defendidos por integrantes deste governo.

Bruno era um dos mais experientes indigenistas da região amazônica e um dos maiores especialistas em povos isolados do Brasil. Ele conhecia bem a área onde estavam navegando. Phillips foi correspondente no Brasil de vários jornais britânicos por mais de 15 anos e era especialista em meio-ambiente.

Nenhum dos dois estava se aventurando a nada. Eles estavam fazendo um trabalho de denúncia e de defesa da floresta, dos povos indígenas e, por que não, do Brasil. Afinal, na ausência de pessoas como Bruno e Phillips, como saberíamos sobre as barbaridades que acontecem no Brasil profundo?

O mínimo que Bolsonaro poderia fazer era se calar, mas como chefe do Executivo, o que era esperado, em uma situação onde existe alguém apto a sentar na cadeira da presidência, eram condolências e que atitudes mais rígidas fossem tomadas para que aquela região fosse mais protegida.

Porém, enquanto as famílias e amigos de Bruno e Dom sofriam, na esperança de encontrá-los com vida, Bolsonaro teve a pachorra de dizer tudo isso e mais um pouco, com a incapacidade de compaixão que só ele tem.
 
Não me espantaria se ele fosse diagnosticado com alexitimia ou até mesmo uma sociopatia aguda, mas acho que é mesmo só maldade e falta de caráter.

E então, neste importante ano de 2022, vocês ainda terão a pachorra de manter este indivíduo no poder?

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