Avaro o pensamento. Mesmo assim, obrigo-me a pensar que, do nascer ao pôr do sol, o dia insiste em resumir a vida. Quem fui? O que foi? Sou? Como será?
“De manhã escureço/ De dia tardo/De tarde anoiteço”. De noite… Ardo? Sem licença do poeta amado, uso seu verso de forma distinta da criada por ele: “meu tempo é quando!”
Em vinte e quatro horas! Quantos notarão? Há quem não se aperceba sonhando ser eterno. Prosseguir perseguir o que dita o tempo em espaços os mais diversos. Ao final, somar cada dia aos dias já contados.
Ao escrever observo: o espaço onde me encontro, já não mais existe. É outro. Também sei quantos já não estão. Outros que desconheço, nasceram. Quantas mudanças em torno de mim? Meu Deus, no passado tudo o que há pouco, conheci.
Este instante de agora, as cores, os tons, a luz, desfalecida. Tão diferente. Sou o mesmo? Sigo sendo. Não me reconheço no rosto de agora, mas é como estou. Não me dei por esta mudança em mim.
Anima-me a expectativa de estar outra vez desde o início da jornada do sol assistindo ao tecer de minutos, de horas, até completar-se o dia. Há, por sorte, espaço para sonho e nisto cabe fluxo e refluxo da vida.
Dia por dia, o dito cujo pensamento obriga a rever tempo decorrido e buscar forma de sentir, sem sofrer, novos acontecimentos. Suportar? Não é fácil, mas é preciso. “Eu, porque me conheço/ me separo de mim/ e penso.” Separar-se para entender e assimilar a trajetória. Todo o correr do dia, um espelho.
Como um só dia pode resumir o conjunto deles, querendo demonstrar, ao por do sol, para quem já passou por tantas e distintas etapas, ter encontrado referência para sua própria vida.
Se assim é, imitar a serenidade e a calma que o instante revela. O sol posto, metáfora perfeita para o envelhecimento, sugere o comportamento de modo límpido. Hora de entender e aceitar definitivamente o fim.
No ocaso, o outro lado espera a luz do sol. E a nós, o que nos espera? O que ensina o sol ao despedir-se? Não fazer este instante demorado. Fraquejar na luz, mas persistir com ela. Cor. A mesma. Outro tom.
Separar-se causa estranhamento. Até para o sol, permanente na luz. Serenidade, no entanto. Que tempo este! Houve, por certo, outros que foram iguais, senão piores, e contam suas histórias.
Não perder a coragem para prosseguir. Enfrentar com garbo situações diversas e, mesmo angustiado, a outras tantas que registrem e obriguem registrar acontecimentos
Importante é saber do tido, reconhecer o ido e reconhecer que os detentores do poder causam o mal, pobres coitados que são. Na verdade, inseguros, agem assim porque precisavam dos outros e, por não se darem conta disto, exigem o que não exigem de si mesmos ou não suportam neles. Incapazes, a grande maioria. Miseráveis! Sequer entendem o sentido profundo desta palavra que os caracteriza.
Se o Planeta Azul não se desmoronou, sobrepôs-se a dores diversas, a acontecimentos infelizes. Eles nada fizeram. Ao contrário, destruíram ainda mais com guerras, desmatamentos, bombas. Incapazes foram de alimentar-se do bom e do belo, das alegrias, de seguir na caminhada sufocando tristezas e dores.
Antes mesmo que a peste do século matasse o genial ator, ele decretara ser o riso um ato de resistência. Infelizes, não gostaram da ousadia e gritaram e gesticularam e tentaram projetar-se sobre muitos com brilho tremeluzente, fraco.
Se parece pouco claro o domingueiro causo que lhes conto, se apercebam ao menos que os pósteros hão de reconhecer como se enredou em dificuldades o momento em que aqui estivemos. Impossível dissuadir de espaço e tempo, em seus aspectos metafísicos e epistemológicos para entender.
Gostaria de explorar sonho ameno, destes que desenham sorriso no rosto do leitor ao saber do canto harmonioso dos pássaros e da vontade incontida do menino ao ver subir pipa no azul do céu tocada pela brisa recém-chegada do sul. Aqui, o sonho é outro. Tampouco hesito em palavra que permita entender as etapas e os limites por que passa, no meu tempo, o conhecimento humano com uma geração devotada à tecnologia e aos objetos que criou.
Tudo avança muito rapidamente. A humanidade? Bom deve orgulhar-se destes avanços todos, se com eles encontrar velocidade que revele iguais favores em razão do homem.
Por favor, olhe em redor. Veja. Sinta. Conclua. Não se esqueça de que “o tempo é a medida do movimento segundo o antes e o depois”. Não vá fundo demais em busca do entendimento, porque o presente carece de espaço. As coisas passam num momento. A sensação do presente persiste, porque a atenção perdura. Assim como o futuro que, na verdade, não existe. O que existe, isto sim, é a expectação dele.
Semelhante, as lembranças que insistem em fazer o passado perdurar. Sentiu como um dado momento presente é, ao mesmo tempo, presente e passado?
Melhor seguir o poeta: meu tempo? É quando!
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