Estamos em abril, este mês outonal, de grande suavidade e beleza. Venho celebrando as tardes de abril, ano após ano, e não me canso de cantar esta estação magnífica. Abril tem sabor de um mel infinito, colo de mãe, véspera de Natal, viajar de trem para ver a madrinha, uma nota 10 em matemática e um sonho realizado.
Vivemos a Semana Santa, que para mim é feita de amor. Consigo amar mais as pessoas, me doar mais, compreender mais. Milagres pequeninos que se agigantam nas suas consequências. Vivo-a intensamente, meditando nos mistérios da Paixão do Senhor. Recolhimento profundo, contrição, humilde inspiração espiritual para viver com intimidade e fé e o mistério da Cruz. A loucura da Cruz. O amor da Cruz.
Páscoa é luz, é paz, é ressurreição. É passagem para vida nova. Quero tratar um pouco das nossas ressurreições diárias, depois de uma mortezinha de três dias, pelos quais muitos de nós passamos. Quem já não morreu assim? Quem já não se deitou na sua cama para morrer um pouco, em silêncio, luto e dor?
Quantos não choram o fim de um casamento, de uma paixão? Quantos enlutados pela perda de um ente amado. A tristeza mortal de um adeus à beira do caixão. A dor de perder o emprego. O desespero diante de um diagnóstico sombrio, a dolorosa luta pela saúde. Um acidente, uma notícia ruim, uma depressão.
As nossas mortes diárias nos fazem renascer e ressuscitar, num ciclo de regeneração e vitalidade, em que nos sentimos mais fortes e determinados. As direções se dividem à nossa frente. Sair da agonia mortal, do túmulo funéreo, para enfrentar o dia luminoso é a grande graça do mistério pascal.
Salutar e necessária lucidez! A saída do sepulcro nos faz compreender que há tanta vida lá fora, como uma onda no mar. E que nada será de novo como já foi um dia. A linda canção tem o poder de nos organizar. Vida que segue. O que temos de verdadeiro? Apenas este momento, o agora. O instante que estamos vivendo. O passado está lá atrás e não pode ser modificado. O futuro é uma incógnita. Mas se existe um tempo favorável, é o presente. Nele podemos intervir, mexer, mudar, transformar.
Penso nesta mensagem pascal. Ressuscitar de nós mesmos, dos nossos sonhos, e explorar nossa inteligência, nossa vontade e realizar algo que nos traga felicidade. Usar as taças e os cristais, a toalha de renda, o vestido guardado para uma ocasião especial, aquele perfume, o sapato dos dias de festa. Todo dia é uma festa! Visitei uma amiga e ela me mostrou pilhas de lençóis de linho, fronhas bordadas, tudo rigorosamente guardado numa gaveta, sem uso.
Abra-se, desabroche como desabrochou para nós a luminosa manhã de Páscoa! Ela se abriu como a mais bela rosa, para acordar nossa alma a tempo de lembrar que a vida é esta que conhecemos. E que viver algo de especial pode ser a fonte de uma experiência arrebatadora.
Declare seu amor aos seus amados, seu pai, sua mãe, seus irmãos, seus amigos. Declare seu amor ao seu cônjuge. Declare. Não espere estar num leito de morte para dizer que ama, que amou e que vai amar para sempre.
“Para sempre” é algo improvável, nós sabemos. Às vezes, nossas certezas se tornam frágeis e desmoronam na nossa frente. Mas construímos outras, novas e fortes, cheias de ressurreição, de espírito pascal, de passagem das trevas para a luz. É esta a mensagem da Páscoa sempre tão misteriosa e tão profunda!

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