A Ilha

Por José Faganello | 15/12/2021 | Tempo de leitura: 3 min

“Antigamente a cidade era o mundo, hoje o mundo é uma cidade” (Lewis Munford)

Sem dúvida nenhuma, o ser humano, desde seu aparecimento, não só conseguiu sobreviver às imensas dificuldades que encontrou pela frente, como evoluiu de forma inegável. De lá para cá, alguns acontecimentos alavancaram substancialmente esta evolução. O primeiro deles, chamado de Primeira Revolução, foi a descoberta da agricultura. Ela possibilitou ao homem abandonar o nomadismo e determinou a formação dos primeiros núcleos urbanos. Neles, a interação foi incrementada, provocando uma aceleração cultural e as primeiras grandes civilizações. Outro marco foi a inacreditável exuberância cultural da Grécia. O legado que ela nos transmitiu é inestimável. A Revolução Industrial provocou uma guinada de 180° na economia. A burguesia, que emergiu a partir do século XI, aproveitou-se, mormente na Inglaterra, da oportunidade e acabou por conquistar imensa riqueza e o poder político. O capitalismo estruturou-se e, seguindo sua diretriz intrínseca, passou a acumular capital e a desenvolver tecnologias para aperfeiçoar cada vez mais esta acumulação. Como é inevitável, se alguém acumula, outro é defraudado; alguns poucos passaram a explorar enormes massas. A reação não tardou - ideólogos, preocupados com a situação, inicialmente começaram a alertar, depois, a combater o capitalismo com idéias socialistas. O socialismo chegou a ameaçar o capitalismo, mas não conseguiu, onde foi implantado, concretizar os sonhos que prometia. A derrocada do socialismo reavivou o liberalismo. Como o neoliberalismo parece estar sendo mais perverso, estamos assistindo a impressionante acúmulo de capital, fusões de empresas, redução de empregos e de salários. O acontecimento marcante no momento é a chamada globalização. As fronteiras nacionais tornam-se cada vez mais incapazes de deter influências externas. A cultura nacional, invadida pela avassaladora força da mídia, perde sua identidade e assume comportamentos, modismos, gostos, que, não mais aos poucos, mas rapidamente, estão desestruturando-a e apagando-a da memória dos cidadãos. A economia sofre o impacto da concorrência com tecnologia superior e recursos incomparáveis. Sem um mercado interno com grande capacidade de consumo e, pautando-se pelo figurino neoliberal, com importações supérfluas e predatórias, o país é incapaz de manter uma indústria nacional forte. Como vimos, os grandes avanços da humanidade estiveram ligados às conquistas culturais e nos países que conseguiram apossar-se e integrar à sua cultura conquistas alheias. Sem modificar o ensino, valorizando os mestres, tornando as escolas verdadeiros centros de formação humanística e cultural, o país estará, erroneamente, acreditando que é possível manter-se como uma ilha, isolado, do resto do mundo. Se antes a cidade era o mundo, hoje o mundo é uma cidade. Influências externas serão cada vez mais sentidas. Desenvolver cidadãos, com capacidade crítica e capazes de sintetizarem conhecimentos de domínio geral gerarem novas idéias e engendrarem novas conquistas, é fundamental. No campo econômico a situação reflete e ao mesmo tempo determina o panorama de nosso ensino. Sem empresas fortes nenhum país torna-se desenvolvido. Enquanto a maioria dos países tentam retardar dentro de suas fronteiras a parte deletéria da globalização impondo medidas protecionistas, nossas empresas são obrigadas a competir em desigualdade de condições. Ilha de Vera Cruz foi o primeiro nome dado pelo descobridor português. Vislumbrou, talvez, a cruz que nosso povo teria de carregar - governos míopes, insensíveis, incapazes de projetarem uma nação com tantas possibilidades, mantendo-a como uma mera ilha, cercada de incompetência.

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