Não amo ninguém

Por Rubinho Vitti | 21/08/2021 | Tempo de leitura: 3 min

Outro dia estava pensando sobre o amor. Piegas, eu sei. Mas sou assim, fazer o quê? A palavrinha de quatro letras -- assim como love, em inglês -- está mais impregnada em nós do que qualquer Sars-Cov sonhe estar.

Ela é usada em nove a cada dez hits do momento, em quatro a cada cinco páginas de um roteiro de novela e na grande maioria dos filmes e séries de televisão.

A gente explora o amor como explora a dor com suas disparidades e semelhanças, que vão muito além da rima clichê.

Mas se o amor está em todo lugar, o verbo amar pode ser bem mais difícil de encontrar, principalmente na ação que os dicionários descrevem: "adorar; possuir afeição por; demonstrar adoração por; apreciar; demonstrar estima; gostar exageradamente de…"

Você conhece alguém que ama, já amou ou sabe realmente amar? Talvez Fernando Pessoa, aquele que não conhece nenhuma outra razão para amar senão amar. Ou os que fazem cartas de amor ridículas. Ou seriam ridículos os que nunca escreveram uma carta de amor? Responda-me, Álvaro de Campos.

E se amar for mesmo um verbo intransitivo, como diria Mário de Andrade? Afinal, alguém pode só amar sem um complemento bem definido? É possível amar, assim como chorar e sorrir?

Talvez, a ideia de amar seja algo de quem ainda tem o coração macio. Quando jovem, a gente se apaixona fácil, não é mesmo? Basta virar a esquina e dar de cara com alguém e… boommm!!! Aquela bomba de ansiedade explode na barriga a ponto de sentir os caquinhos cutucando a boca do estômago.

Mas se está aflorado na ficção, no entretenimento e nas propagandas de perfume, amar tem sido um verbo difícil de encontrar no dicionário de um balzaquiano como eu.

Com o passar dos anos, as experiências vão sendo marcadas no corpo como tatuagens e as borboletas no peito começam a voar para fora do corpo, e parece que nunca mais vão voltar.

Vai ficando cada vez mais difícil impulsionar tal sentimento na máquina de ferro que é nosso coração leviano.

Não posso dizer dos mais velhos, mas para aqueles que como eu trafegam entre os 35 e 40 anos de idade, eu pergunto: Como é que se diz eu te amo, mesmo? Se nem Renato Russo soube responder, quem nos dera.

"Amor sem sexo é amizade", como diria Rita Lee, e não é desse tipo que falo. Amo meus amigos, meus pais, meus bichinhos, amo até você, caro leitor… Mas é sobre amar de forma carnal, espiritual, emblemática, com intensidade e afeto, com tolerância e afago, respeito e carinho, com aquele ar "que seja eterno enquanto dure". "Ama, sofre, chora" como a Pabllo Vittar.

Creio que não estou sozinho nessa. Não venha mentir e me dizer que você também não tenha pensado no amor ultimamente. Apenas espero que concordem! Nunca pensamos tanto em amar sem nunca termos amado tão pouco.

Do contrário, não haveriam tantos músicos sertanejos ricos, cantando sobre amor e cachaça. Tantos lencinhos úmidos no sofá após um domingo de Netflix, só você e suas comédias românticas. Ou espaços do celular super reduzidos após tantos aplicativos de relacionamento instalados.

Desculpe a insensibilidade ou a falta de tato para falar de um assunto tão nobre e tão vil ao mesmo tempo. Mas só eu e meus lençóis sabemos que quando vou dormir todo encolhido, agarrando uns quatro travesseiros, eu lembro que eu não amo ninguém, parece incrível, eu não amo ninguém e é só amor que eu respiro.

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