Já é um clássico. Pelo menos uma vez na semana eu pego o elevador com destino ao supermercado. Abro a porta do prédio e vou andando pela rua. Chego até a esquina de casa e… putz… esqueci a máscara. E lá vou eu voltar todos os passos para pegar esse objeto precioso de volta.
Se lá em março de 2020, a gente tinha meio receio de usar esse pedaço de pano no rosto -- e por que não dizer vergonha -- hoje, sem ele, a gente não pode fazer atividades básicas como pegar um ônibus, comprar um pão na padaria ou trabalhar em escritórios fechados.
Aqui onde moro, na Irlanda, não é obrigatório o uso de máscaras nas ruas e locais ao ar livre. Mas a orientação é usá-la em espaços centrais muito abarrotados de gente. De qualquer forma, sua obrigatoriedade existe em todos os ambientes fechados.
No trabalho, por exemplo, é preciso usá-la o tempo todo. Encontrando as pessoas pelos corredores, são os olhos que se expressam. E nisso, sempre que se cruzava com uma de minhas colegas, abria um sorriso largo ao dizer "bom dia"… mas de máscara, claro.
Eis que uma certa manhã ela me pergunta, preocupada: "está tudo bem contigo? Sempre que lhe vejo você parece triste". Passei a buscar no Google: "como sorrir com o olhar". Até treinar no espelho eu treinei! Mas meus olhos de Capitu parecem não aprender.
A saída foi a expressão pelo enrugamento da testa que também pode ser um "oi, tudo bem?". Basta usá-lo para um cumprimento, subindo rapidamente as pestanas de modo que se denote algum sinal. Até cancelei uma aplicação de botox para que a comunicação pudesse fluir melhor nesses tempos de pandemia.
Mas se a expressão facial se tornou difícil com o uso de máscaras, o pior talvez seja falar ao telefone. A voz já abafada do aparelho encontra a barreira do pano e embola-se tudo. Se a comunicação é em inglês isso pode ser ainda pior, creia.
Dos desafios de usar a máscara também está tossir e espirrar. Os micropelos sempre me fazem cosquinhas em minhas narinas e irritam a garganta. E como a função da máscara é justamente proteger os outros das nossas microgotículas, o espirro e a tosse têm que ser mascarados e o "atchim" molhado fica ali naquele universo entre a boca e o nariz.
Não sou muito de usar tipos estampados, mas certa vez, sem uma opção para entrar em um estabelecimento o qual eu precisava muito, emprestei uma máscara (limpa, diga-se de passagem) de uma amiga, toda cor-de-rosa e com florais. Me senti com uma melancia no pescoço. Ou melhor, era como se eu usasse uma saia rodada. Olhares matadores são mais fáceis de identificar do que os sorridentes!
Até 2020, era impossível que histórias como essas pudessem ser contadas. Usar máscara passou a ser um dever do cidadão -- e até mesmo uma obrigação, sujeita à multa. Mesmo com alguns desafios, percalços e certas humilhações básicas, a máscara foi, ainda é e possivelmente será no futuro uma forma de higiene imprescindível para a vida em sociedade.
O trauma causado pela Covid-19 não vai passar assim tão em breve e a gente vai querer se proteger sempre. Além disso, a máscara ajuda na prevenção de muitas outras doenças que são transmitidas pelo ar.
De qualquer forma, que no futuro a gente olhe para trás e tenha histórias para contar sobre usar máscara e rir de tudo disso. Use máscara!
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