Também há resposta para o meu nome.Há sempre uma razão para cada nome. Nesta terra de Santo Antonio, onde o peixe para à espera do verdadeiro semão, talvez poucos saibam que, antes mesmo do David Chagas, há um punhado de nomes escolhidos, que me levaram à pia batismal para que sal, óleo, água e luz me animassem à vida. Sou José Antonio. Sem nenhuma razão literária como Marcus Vinícius da Cruz de Mello Moraes.
Meus pais não hesitaram em dar-me o nome de José. Razões divinas?. Mais fortes que estas, as humanas falaram mais alto. Meu avô paterno era José, para minha honra, o célebre jornalista José David, designado Major pelo Imperador, o Segundo dos Pedro. Um irmão de meu pai, também José, morto aos nove anos, vitimado por cobra, quando, ao lado do irmão, caminhava pelas terras onde viviam e de onde se tem, até hoje, preservada a beleza do lugar ao revelar o Morro Azul em todo seu porte e a Serra de Santa Maria, moldada, vestida em azul, exibindo-se. José, o tio, morreu ali maldado pelo veneno. Antonio, me veio de Fernando, o Santo português, por quem tinham, pai e mãe, especial devoção. Carlos, o Chagas, explica a razão. Certa nobreza para um pobre plebeu.
Fernando, nascido em agosto, conhecido no mundo todo, taumaturgo, de sobrenome Bulhões, doutor da Igreja, aclamado por quem teve notícias dele desde os séculos XII e XIII, quando viveu, canonizado um no depois de sua morte, deixou seu nome aos herdeiros. Honro-me, por ser um deles. Franciscano, soube falar aos peixes.
Toda vez que se aproxima sua festa, me lembro disto, dos tempos em que, vivendo em Lisboa, a serviço do governo brasileiro naquele país em prol da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, caminhava pelas ruas da velha cidade nas festas antoninas e mergulhava fundo em sua história tentando descobrir detalhes que me permitissem entender bem a razão de figurar com o Menino Jesus ao colo. Nestes dias como o de hoje, no país todo, as cidades viviam festas inesquecíveis em honra do santo de Lisboa e de Pádua.
Como foi bom estar lá. Viver lá, saber que podia visitar o local onde viveu Fernando António, visitar seus aposentos e sentir, como se conversasse na distância dos séculos,. e pudesse manter com ele um diálogo próximo. A proximidade foi tanta que percorri caminhos em busca de Pádua,seguindo pari passu os passos dele,tentando sentir em cada estação iguais emoções. Em Guimarães, berço histórico da civilização portuguesa, vi igrejas celebrarem de diferentes maneiras sua trajetória. Naves ornamentadas com azulejos capazes de relatar sermões pregados pelo jovem franciscano, em especial quando, cansado de ensinar aos homens, optou pelos peixes, tema de que se valeu de forma brilhante, em 1654, em São Luís do Maranhão, o Padre António Vieira.
“Vós sois o sal da terra!” conclama o sacerdote no exórdio de sua obra chamando a atenção dos pregadores para que ajam como sal, na terra, obedecendo, com isso, a Palavra de Jesus Cristo em seu Evangelho, de quem falam tanto, esquecidos de agir como Ele. O que deseja o padre, neste tempo, é o mesmo que desejaria hoje em relação aos políticos: mostrar que a corrupção corre solta, a injustiça impera, que é preciso repreender soberba e oportunismo, distanciar-se de vícios e não propalar o nome de Deus se não for para exaltar o bem, a verdade, a vida.
Um instante para lembrar que o século XVII quando Vieira, em plena Inquisição, pregou, o momento de exceção era dos mais violentos e ele, com coragem, enfrentou de forma extraordinária este clima de horror na defesa de indígenas.
O sacerdote não hesitou em propalar. Coragem não lhe faltou. Fé, tampouco. Repete Santo Antonio fazendo da imagem criada pelo santo quando pregou aos peixes, para falar aos homens, acusando-os de maltratarem os vulneráveis.
«Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à doutrina e ao exemplo, o que se lhe há de fazer, é lançá-lo fora como inútil para que seja pisado de todos.»
“Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga. E à terra que se não deixa salgar, que se lhe há de fazer? Este ponto não resolveu Cristo, Senhor nosso, no Evangelho; mas temos sobre ele a resolução do nosso grande português Santo António, que hoje celebramos, e a mais galharda e gloriosa resolução que nenhum santo tomou.”
Francisco, o Papa, tem sido aviltado por conta desta nobreza de princípios. Cumpre, a duras penas, sua condição de sal na terra e luz do mundo. Apresenta, propala, divulga, sem temor algum, todos os erros que podem estar escondidos por trás da falação sacerdotal e política.
O leitor faz, comigo, o raciocínio necessário para nossos dias? Os tempos são outros, a vida tem outros paradigmas, mas os princípios são os mesmos. Num país que preconiza ser cristão e tem, em seus dirigentes quem, em púlpito, em aparições públicas, em presença de pastores, fala em nome de Deus.
Falar é fácil. Difícil é ser sal, na terra, e Luz, no mundo.
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