A Maré

Por José Faganello | 22/04/2021 | Tempo de leitura: 3 min

                “A maré deve atingir seu nível mais baixo antes de mudar” (Provérbio Chinês)

Esta é nossa esperança. Ao estudarmos história somos envolvidos por seus episódios. Alguns, embora saibam que os fatos ali narrados foram consumados há muitos séculos, chegam a tomar partido, a torcer como se possível fosse reverter o desenlace eternizado na narrativa.

Acompanhar o processo do nascimento, desenvolvimento e apogeu de uma civilização acaba por envolver muitos, a ponto de sentirem-se coparticipantes do fato.

A história da civilização, com a sucessão de impérios e governos, presenteia-nos com episódios fascinantes e ao mesmo tempo provoca em nós espanto, ao tomarmos conhecimento de como impérios, aparentemente sólidos e imbatíveis durante séculos, repentinamente iniciam um processo erosivo e inestancável, até destruir sua liderança e, muitas vezes, fazer com que seus feitos pareçam meras lendas.

Os refluxos, que suas histórias nos apresentam, assemelham-se às marés de Lua Cheia, ao reerguerem-se espetacularmente, em episódicos casos..

Nosso país costuma receber dois refrãos contraditórios: - “O Brasil é o país do futuro”; “O Brasil está à beira do abismo”.

O primeiro a afirmar a excelência da terra foi Pero Vaz de Caminha, o escrivão da armada de Cabral: “A terra é em tal maneira graciosa que em se querendo dar-se-a nela tudo”. De lá para cá não faltaram ufanistas a cantar-lhe hosanas: Gonçalves Dias; José de Alencar; Afonso Celso: “Porque me ufano de meu país”; Olavo Bilac: “Criança, não verás nenhum país como este./ Ama com fé e orgulho a terra que nasceste”; Stefan Zweig: “Brasil, o País do Futuro”; Cassiano Ricardo: “E o Brasil ficou sendo/ o que é, liricamente./ E o Brasil ficou tendo a forma de uma harpa, geograficamente, e o Brasil é este poema/ menino/ que acontece na vida/ da gente... e, atualmente na TV, o redundante Galvão Bueno, com seu BRASIL,BRASIL,BRASIL.

Quanto ao cair no abismo, tudo indica que este abismo é muito menor do que o país. Desde “Retrato do Brasil” de Caio Prado Jr., não faltaram escritores pessimistas a carregarem nas tintas ao analisarem nossas mazelas. Para eles, este país, aparentemente com invejáveis trunfos para vencer, teima em bordejar o abismo num ziguezaguear de ébrio suicida.

Se os chineses conseguem formular pensamentos de extremada sabedoria e concisão, devemos, não obstante a longa espera de 521 anos, acreditar que o futuro radioso, tantas vezes cantado em versos e prosa, não vai demorar a chegar. Esta conclusão parte da premissa inicial, ou seja, o provérbio chinês do começo deste artigo. Jamais nossa maré esteve tão baixa.

Após a desilusão do que os 3 poderes oferecem está secando, não apenas a praia das nossas esperanças e do nosso bem estar, mas também nossa credibilidade no governo. O Estado brasileiro, a cada dia que passa mais se assemelha ao Leviatã de Thomas Hobbes: insaciável, sempre querendo arrecadar mais impostos, sem, em contrapartida, preocupar-se em dar um retorno justo. Eles somem pelos desvãos da corrupção, dos desperdícios e dos privilégios. Este Leviatã, embora jorrem contra si denúncias numa profusão inacreditável, consegue manter-se impávido e até admirado por parcela de suas vítimas.

As denúncias, verdadeiras e falsas, misturam-se numa quantidade tal, que é difícil separá-las. Provocam, no entanto, uma crescente descrença no poder e na validade deste governo, maculado por tantas acusações que nossa morosa justiça consegue deixar prescrever a maior parte.

Percebo que Sol forte, sombras, maré baixa e eterna espera de um promissor futuro são prerrogativas inerentes ao nosso carma, desde o descobrimento em 1500.

Se a sabedoria chinesa está certa, resta-nos a esperança, que essa maré baixíssima sinaliza uma mudança para melhor.

A responsabilidade está nas mãos de nosso povo, que não pode mais aceitar os descasos de nossos poderes federais, estaduais e municipais.

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