Vaidade

Por José Faganello | 10/02/2021 | Tempo de leitura: 3 min

“O que nos torna a vaidade dos outros, insuportável, é que ela fere a nossa” ( La Rochefoucauld)

Saadi, em “Jardim de Rosas” conta que um rato esfaimado girava em torno de uma noz cobiçando-a. Do interior da noz um verme disse:

Não me leve! Eu comi toda a polpa deste fruto, e tu te arrependerias de tocar nele.

O rato interrogou:

És gordo ou magro? E o verme, vaidoso:

Sou gordo, e nada mais quero da vida.

Muito bem, disse o rato. Espero que tua gordura tenha sabor de noz.

Roeu a casca, tirou o verme e o devorou.

Imita o sábio, que mesmo na opulência, permanece modesto, aconselha Saadi.

É muito difícil atingir este grau de sabedoria. A vaidade é uma exacerbação de nosso amor próprio. E o homem, vivendo em sociedade, está em constante disputa. Como há poucos e verdadeiros sábios, a modéstia não prevalece no meio social. Como a mediocridade valoriza aquilo que não possui real valor, aquilo que o vaidoso estima e engrandece, geralmente é fútil e vão. Os efeitos da vaidade são múltiplos; a vaidade de adquirir preparo físico infunde, em muitos, uma energia incansável, fazendo-os não olharem para os custos nem para o esforço a ser exigido. A vaidade de serem amados torna-os galantes e pacientes, a vaidade de reputação, consegue fazer, de muitos, virtuosos. Os vaidosos mais invejados são aqueles que, de fato, possuem motivos para sua vaidade.

Se não tivéssemos vaidade e não desejássemos aparecer mais do que os outros, não nos importaríamos com a ostentação alheia.

Há aqueles que usam de pessoas ou objetos para se engrandecer. Cornélia ficou na história romana como uma admirável matrona. Em uma época, em que a elite de Roma primava pelos desregramentos e as mulheres contavam não os anos de vida, mas os maridos e amantes que colecionavam, ela destacava-se pela retidão de caráter e pela dignidade. Filha de Cipião, o Africano, vencedor de Anibal, foi casada com Tibério Semprônio Graco, pretor na Espanha, censor e por fim, cônsul. Morrendo o marido aos 41 anos de idade, ficou com dois filhos pequenos. Renunciou, então, a todas as vaidades e conforto pessoal, para educá-los para a vida pública. Um deles, Tibério Graco, como tribuno do povo, foi um incansável batalhador para aprovar a lei da reforma agrária. Exemplo do político consciente, embora rico, defendeu a plebe, isto é os pobres; por esse motivo foi assassinado. Seu irmão Caio Graco deu continuidade a luta do irmão. Tornou-se tão incômodo aos magnatas que foi obrigado a deixar-se matar por um escravo para não cair nas mãos de seus adversários, que haviam colocado sua cabeça a prêmio.

Cornélia não foi imune à vaidade. As outras romanas, amantes da ostentação, andavam cobertas de jóias; ao perguntar-lhe, onde estão suas jóias? Chamou os dois filhos e, abraçando-os, vaidosamente afirmou: “Aqui estão elas”.

De lá para cá, a ostentação exibida por aqueles que valorizam as coisas materiais continuou, ou melhor, teve oportunidade de manifestar-se de maneira mais visível e abrangente. Magníficos carros, colunas sociais, aparecimento constante na mídia eletrônica massageiam o ego dos vaidosos. Eles, no entanto, não se acanham de suas vaidades e costumam justificá-las dizendo: “O que me faz vaidoso, não faz vaidoso qualquer um”…

O grande problema do vaidoso é que a sociedade costuma ser impiedosa com as pessoas – se fracassam recebem o menosprezo; se vencem, inveja e ódio.

Aqueles que sentem volúpia pela evidência, não admitem que um homem cheio de si seja sempre vazio. O castigo deles será descobrir que o sucesso social é feito de uma infinita capacidade de enfadar-se, cansar-se e afligir-se e, atualmente, como o rato da fábula, ser assaltado e seqüestrado…

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