Para sempre

Por Marisa Bueloni | 10/12/2020 | Tempo de leitura: 3 min

Há coisas belas demais e que não podem nunca ser descartadas. São caixas cheias de saudades, guardados que dizem respeito somente a nós e ali permanecerão, até que, depois da nossa partida, os filhos ou um irmão querido venham a nossa casa fazer a limpeza de praxe… Temo por este momento. Assim, mantenho tudo em rigorosa arrumação, pois quero que encontrem ordem e organização nos meus armários e gavetas.

Há muito a ser preservado enquanto vivemos. A mesa da sala de jantar e sua história de décadas. A abençoada bandeja de inox que serviu tanto e continua tendo sua utilidade no universo doméstico. Nossas toalhas de Natal, os pratos e as taças. Todos os retratos na parede, todas as fotos em branco e preto, ainda não emolduradas.

Guardei algumas coisas do meu lindo. Guardei a carteira com os documentos e até a carteirinha do plano de saúde. Guardo algumas coisas essenciais. Para tocar e sentir na pele a saudade, a força de um tempo que, se não volta mais, pelo menos é revivido na memória como pequenas joias de afeto e beleza.

Onde mais guardar, senão no coração, estes tesouros que cada um conhece muito bem? O coração é a casa do amor, a profunda morada do bem e da bondade. É nele que repousam as nossas relíquias mais importantes, tesouro inestimável.

Ao longo da vida, algumas coisas vão se despedindo de nós, deixando de existir, por diferentes motivos. Um dia, tivemos um bem material que nos foi muito caro. Uma bicicleta com marchas com a qual nos divertimos muito, uma casa muito bem decorada e cheia de quadros, livros, livros e mais livros. Colchas bordadas, porcelanas, muitas malas, bolsas e sapatos.

O tempo passa e já não precisamos de muita coisa. Diminuímos visivelmente os objetos à nossa volta. A casa passa a se chamar “aconchego” e nela cabe o necessário. Tudo o mais, está guardado no coração. Já nem tenho mais a cristaleira majestosa na sala, alvo de lindos suspiros e comentários.

Assim é a vida. Tempo de juntar e tempo de lançar fora. Tempo de rir e tempo de chorar. Tempo de compreender que as lembranças são nossa maior riqueza, sobretudo se a sorte de uma vida bonita foi o mais belo presente de Deus.

Então, guardemos essa vida no coração. Guardemos os anos 60, a margarida, os festivais de música, as guitarras agudas e os hinos libertários dos nossos ídolos.

Com respeito e amor, guardemos.

Guardemos um tempo que foi puro sonho. Este cenário dourado que aparece na nossa frente, toda vez que nos reportamos ao passado. Tudo foi precioso demais, e o presente é uma eterna recordação. Sobretudo agora, que nos mantemos isolados em nossas casas, como é bom abrir aquele pacote amarrado com fita vermelha e reler velhos textos.

Sim, guardemos. Que nossa história de vida seja nossa mais grata lembrança. Tudo bem arrumado numa caixa perfumada, com pétalas secas de rosas entre algumas cartas sagradas e todo o amor do mundo em cada letra sublime.
Guardemos a pantalona colorida, o chinelo de couro, a blusa de gola rulê canelada e os livros da faculdade. Guardemos o início da vida profissional, o primeiro emprego, o noivado, o casamento, os filhos e a dívida de viver.

Honradamente, guardemos no coração. Para sempre.

Leia Mais:

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.