Ninguém que tenha aprendido a pensar como Cristo ensinou pode criticar quem o chamou a desfilar na avenida, respeitada a razão que levou os mangueirenses a tributar-lhe homenagem. Aproximou-se de seu povo sofrido. Fez-se reconhecer como homem do nosso tempo, clamando por justiça e liberdade.

Sentiu assim? Vivenciou isso? Ou toda esta beleza mora tão somente no meu coração?

Em Mangueira a poesia é feito um mar. Se alastra. Chega espalhando verdades. Parece até mesmo que no ritmo do samba, na beleza do tema, na grandeza de Deus que tudo acolhe em seu Amor, já se anunciava a campanha da fraternidade, semeando vida, diferente do que se tem visto até aqui. Vida com esperança de fraternidade e paz.

Todo ano, neste período, sempre me conforta ser católico, não pelo que propõe o catolicismo, mas pelo que faz. Ação concreta, real, solidária, ao ver a vida ameaçada. Conclama por coragem, ensina a ter compaixão, a acercar-se, a cuidar. Sou também evangélico. Ou todas estas lições não estão no evangelho de Jesus Cristo? O Cisma se deu não por outro motivo senão por razões de fácil entendimento e de justa razão. Espírita – por que não? – se me recosto no Espírito grandioso de Deus? Caminho, sem medo, guiado por seu Espírito. Fiel seguidor de Francisco, o Papa, escolha de sua Luz bendita, aprendi com ele a peregrinar na paz pela unidade. Se todos seguimos a mesma lição do Mestre, se todos nascemos com Ele na Estação Primeira de Nazaré e brotamos do seu Amor suportar como o desabafo sincopado, sufocado, das cidades e a humilhação a que submetem semelhantes? Semelhantes estes ou aqueles? Estes, pobres coitados, dessemelhantes, abandonados. Aqueles, Pilatos, foi quem os lançou à miséria e à fome, levando a dores extremas as Marias do Brasil!!!

O samba-oração quando, respeitoso de seus matizes e moldado em versos de fraternidade e esperança, ensina no verso e na canção, justiça, igualdade, respeito à vida. Se há compaixão, sentimento piedoso de simpatia para com a tragédia pessoal de outrem, acompanhado do desejo de minorá-la, nosso samba é reza capaz de revelar impulso de ternura para com o sofredor.

Fácil? Não. Difícil, muito difícil. Ou haverá quem acredite que escolher a aceitação, o perdão, o respeito, seja tranquilo e fácil? Com tantos limites impostos por uma sociedade como a nossa, lidar com o amor de modo a não estabelecer fronteiras, é batalha diária. Falar em Deus pode ser fácil. Estar com Ele parece ser cada vez mais difícil.

Encontrar no samba motivo de reza já não é impossível. O Espírito de Deus manifesta-se em todo seu esplendor na cadência da canção entoada com espontânea simplicidade por mestres-salas e porta-bandeiras. Deus, muitas vezes, deve fugir de hábitos, batinas e trajes variados de paramentos religiosos para aquecer seu Espírito entre pobres e humildes que clamam por ele com verdade e fé.

Deus não estabeleceu locais nem limites para o bem, para o amor. Sua Luz realça de forma exuberante na escuridão, na reza que reza, com fervor, esperança e fé, no samba e no coração de quem segue o compasso cadenciado pelo passo de Deus batucando uma única palavra: amar.

Basta de intolerância, de divisão, de desesperança. Destruamos os muros da separação, rompamos o elo que fortalece a inimizade e revigoremos nosso passo desfazendo distâncias e descobrindo a beleza da vida. É o que pede a reza, no batuque do samba.