Leila Paes

Estar só e o mal

Por Leila Paes, pastora e psicóloga | 26/05/2022 | Tempo de leitura: 3 min

Mais um jovem entrou em uma escola, e matou 19 pessoas, 17 delas crianças, que ele não conhecia, de maneira gratuita, tendo antes atirado em sua avó, a qual o criava... Lendo brevemente no site de noticias CNN, o que ressaltam é que era uma pessoa sozinha, fortemente atacada por bullying, da qual as pessoas “não gostavam”, embora ninguém saiba exatamente por que. 

A tragédia é enorme. Nós imaginamos a dor desses pais e famílias, e nosso coração chora com eles. Há complexidades imensas em relação a acesso a armas, e a estruturação de mecanismos de segurança. Mas o fenômeno de pessoas atiradores está aumentando, e isso é muito triste.

Estou procurando, em reflexão, pensar no que nós mesmos produzimos nas pessoas. Não estou dizendo que alguém em particular tenha culpa, mas que nós, no coletivo, temos produzido também no coletivo, algo que pode afetar muito e profundamente pessoas no particular, transformando seu modo de ver a vida e em consequência, como reagem a ela.

As pessoas precisam de pessoas. Mas com tudo que construímos, e no tipo de sociedade que temos hoje, somos capazes de “invizibilizar”, ou de tornar invisíveis, pessoas ao nosso redor.... O fenômeno das cidades produziu uma situação na qual andamos para lá e para cá com muitos ao nosso redor, mas ao mesmo tempo, com ninguém. Estudamos, trabalhamos, estamos no transporte coletivo todos os dias com pessoas as quais muitas vezes nem ao menos cumprimentamos... Há a complexidade da segurança, mas o fato é que pessoas precisam falar, ser ouvidas. Aparentemente estamos parando para ouvir muito pouco. Dificilmente investimos tempo em escutar a historia de alguém longamente. Sem ter com quem falar, quem as escute, as pessoas vão se sentindo cada vez mais solitárias. E esse estar profundamente só, sem ser ouvido, acaba dando lugar a algo de mal que contamina e domina um coração sozinho. As Escrituras falam com verdade dos nossos dilemas. Há um trecho que diz que “um abismo chama outro abismo” (Salmo 42.7) e isso de fato se mostra no nosso viver, de vez em quando exclamamos que nenhuma desgraça vem sozinha....

No entanto, elas também dizem que “as palavras agradáveis são como um favo de mel, são doces para a alma e trazem cura para os ossos” (Provérbios 16:24).

Quantas palavras agradáveis já falamos para alguém hoje?  Temos nos importado e temos sido receptivos, para falar com bondade, mas também para ouvir?

Existe algo verdadeiramente terapêutico em alguém contar de si, do que acontece, do que está vivendo, do que viveu e alguém genuinamente ouvir.  Não se arrependa de chamar um amigo que lhe veio em mente para perguntar, com verdade, como essa pessoa está e ouvir. Não se arrependa de convidar alguém para um lanche e sentar, conversando e ouvindo. Precisamos nos juntar, precisamos nos conectar, precisamos ouvir. Isso dá trabalho, mas é muito necessário. Vamos lutar por um mundo onde o olhar e o ouvir seja cada vez mais intencional. Estar conectado faz bem, conectar faz bem, e o inverso é também verdadeiro: desconectar-se e estar sozinho não é bom. Alguém disse que se não podemos mudar o mundo todo, podemos pelo menos mudar o mundo de alguém, fazendo a nossa pequena mas importante parte.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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