O despertador toca às 5h. Uma hora depois, Gabryella Corrêa, 38 anos, está no crossfit. Treino feito, ela volta para casa, toma banho e pontualmente, às 8h, está na sede da Lady Driver, empresa atualmente avaliada em R$ 50 milhões, que criou para solucionar um problema comum às mulheres: assédio em aplicativos de transporte.
“Eu fui assediada por um motorista. Fiquei pensando em quantas mulheres já tinham passado por isso. Em quantas deixam de sair, de encontrar as amigas ou de usar determinadas roupas porque se sentem inseguras. Têm medo de ir e vir. Foi então que eu decidi: poxa, deveria existir um aplicativo só com motoristas e passageiras mulheres”, contou.
Segundo a CEO e fundadora da Lady Driver, somente 6% dos motoristas de aplicativos são do sexo feminino. Na opinião de Gabryella, um número que traduz bem os desafios que a mulher enfrenta, seja por temer a violência ou porque o mercado automotivo ainda é predominantemente machista e masculino.
“Eu amo dirigir e sei que há muitas mulheres que também gostam de carro. Embora a mulher seja a motorista da casa, indo fazer compras ou levar os filhos à escola, o carro, muitas vezes, está sempre atrelado ao homem. Então, a Lady Driver também veio para mostrar que as mulheres são excelentes motoristas, porque elas têm muito mais sensibilidade e cautela no trânsito”, declarou a empresária.
E os fatos comprovam que Gabryella está certa. Um deles é o seguro de carro e moto que para mulheres pode ser até 20% mais barato, uma vez que as operadoras consideraram que o número de ocorrências envolvendo o público feminino é menor. “Já sofri preconceito no trânsito, mas não ligo. Me apego às estatísticas que mostram que as mulheres dirigem melhor”.
Atualmente, o Lady Driver está disponível apenas para a região de São Paulo com 58 mil motoristas cadastradas e mais de 1,3 milhão passageiras usando o serviço. Em fase de expansão, o aplicativo já recebeu cerca de R$ 10 milhões em investimentos, incluindo aportes vindos da região da RM Vale.
“Esses números ainda vão crescer bastante, pois vamos levar o serviço para outras cidades do Brasil, como São José dos Campos e Taubaté. Nossa meta é estar em 50 cidades nos próximos dois anos”, contou Gabryella.
Quebra de padrão. Em seu escritório, a empresária trabalha diretamente com 20 mulheres que, segundo ela, têm o DNA da empresa e trabalham em prol do público feminino, inclusive no que diz respeito à entrada das mulheres no mundo dos negócios.
“Ainda existe muito preconceito. Não é comum mulheres terem negócios disruptivos e tecnológicos. O que é esperado é que a mulher monte um café, abra um salão de beleza ou uma loja de roupa. Quando ela tem uma ideia que foge disso, muitas vezes, ela não é vista com seriedade porque ainda duvidam muito da capacidade feminina”, disse.
Por esta razão, ela defende que mulheres com propostas inovadoras e disruptivas estejam dispostas a provar, pelo menos duas vezes, que aquela ideia funciona e irá fazer a diferença na vida de milhares de pessoas.
“As empresas que mais geram lucros são geridas por mulheres. Por outro lado, mais de 90% do dinheiro do mundo, investido em novos negócios, está nas mãos de homens. Quando você chega com algo que vai beneficiar mulheres, falta empatia para entender a necessidade do serviço. Por isso, eles acabam não investindo e perdem uma grande oportunidade.”
Inovação. Solteira, sem filhos, tia de um menino de 7 e de uma menina de 3, Gabryella se prepara para lançar mais um projeto ambicioso, até o fim do ano, também pautado no universo feminino. Trata-se do Lady Nanana, o primeiro serviço legalizado do Brasil para o transporte de crianças.
Inspirada em duas startups dos Estados Unidos, que ganharam mercado neste segmento, a Zum e a Hope Skip Drive, a empresária vai oferecer o serviço no Brasil, com plataforma formada somente por motoristas mulheres, para auxiliar pais e responsáveis na missão de organizar a mobilidade dos filhos com as atividades do dia a dia.
“A pandemia acelerou a demanda desse serviço, pois os transportes escolares são ambientes de aglomeração. Se a criança tiver esse transporte individual para voltar da escola, do futebol ou do balé, o risco de contágio já diminui bastante”, finalizou.