Ideias

América Latina: um solo salgado

Por Marcos MeirellesJornalista |
| Tempo de leitura: 2 min

Voltei ao Peru, país que eu havia conhecido em breve passagem há 18 anos.

Muita coisa mudou por aqui desde aquela época, especialmente em Lima. A cidade surpreende com seus belos jardins, com a limpeza das ruas, com o centro histórico bem cuidado.

Pouca coisa mudou em essência, no entanto. As favelas se multiplicam pela periferia, assim como os pedintes nas ruas. O trânsito caótico insiste em denunciar o caos urbano, acentuado aqui pelas buzinas.

Escalei a serra, rumo a Cuzco, patrimônio mundial.

Aqui, as coincidências de viagem me fizeram conhecer um evento único, uma grande feira natalina na Praça de Armas. Foi de uma beleza triste e perturbadora observar milhares de quéchuas, todos oriundos das cercanias, ocuparem a Praça com os seus produtos típicos e, ao mesmo tempo, com todo o sofrimento e miséria estampados em suas faces e trajes.

A feira acontece na mesma praça onde, 239 anos atrás, foi executado pelos espanhóis o líder Tupac Amaru II, bisneto do último imperador inca e líder da primeira grande rebelião pela independência nas colônias da América Latina. Rebelião que se deu 8 anos antes da Inconfidência Mineira.

Tupac Amaru é tratado em Cuzco como um herói longínquo, que ajudou a despertar o sentimento pela independência do Peru. Seu ideal tem sido conspurcado, no entanto, por quase três séculos de desigualdade, golpes de Estado e corrupção. Com um desempenho econômico superior ao Brasil nos últimos 10 anos, o Peru segue mais latino do que nunca e tem hoje 2 ex-presidentes presos, outros dois sob risco de prisão e um quinto que se matou para fugir do cárcere.

O resumo da ópera é simples: a América Latina segue política, social e economicamente inviável. E tudo isso tem a ver com o destino de gente como Tupac Amaru, Tiradentes e Zumbi dos Palmares.

A sentença contra Tiradentes mandava destruir sua casa e salgar a terra para que dela nada brotasse. O que brota, desde esses tempos, na América Latina, é a visão odiosa dos Pizarros..

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