São quase dois anos de sofrimento, dor e recuperação, mas sobretudo de vontade de viver.
João Henrique Thomaz Ferreira quase perdeu a vida após um grave acidente em Dublin, na Irlanda, em outubro de 2023. Um policial irlandês jogou um carro em cima de João, que precisou amputar parte da perna direita em função da lesão.
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Após o acidente, João passou 55 dias internado em um hospital da Irlanda, passando por 18 cirurgias. Começou a sua lenta recuperação até conseguir colocar uma prótese pela primeira vez.
No começo de julho deste ano, ele fez uma cirurgia reparadora no Hospital Municipal de São José dos Campos, para corrigir falhas na amputação feita na Irlanda. A intervenção lhe permitirá andar sem muletas, apenas com a prótese. Ele agora se recupera na cidade, ao lado da família.
Cada detalhe dessa jornada foi compartilhado por João Henrique e sua mãe, a primeira-dama de São José dos Campos, Sheila Thomaz, em participação de ambos no podcast Superação, novo quadro do OVALE Cast.
“Todos os dias eu agradeço só por estar vivo”, disse João Henrique, em momento de pura emoção no bate-papo exclusivo.
“Agora a noiva também veio. Ficaram noivos. Então assim, está todo mundo em casa agora. Todo mundo embaixo da asa da mãe”, disse Sheila sobre a presença de João Henrique em casa, após o drama da Irlanda.
‘Perdi a perna’.
João Henrique recorda-se do momento exato em que foi atingido por um carro da polícia da Irlanda, o que lhe custou a amputação de parte da perna direita.
Ele detalhou os trágicos momentos em que foi atingido pelo veículo, afirmando que tinha certeza de que havia perdido a perna. Ele estava consciente e chegou a discutir com o policial que o atropelou.
Na ocasião, João fazia parte de um grupo de entregadores de moto que estava tentando recuperar o veículo roubado de um colega. Ele foi um dos primeiros a chegar à rodovia M50, em Dublin, na Irlanda, após descobrir que os ladrões estavam sendo perseguidos pela polícia. Foi ali que o policial o atingiu.
“Eles foram parados pela polícia e foi quando eu cheguei. Fui o primeiro a chegar nesse local. E aí foi uma coisa muito rápida. Quando eu parei a moto, desci e estava indo em direção à moto [que havia sido roubada] e foi quando ele me acertou. Eu estava passando bem do lado do guard-rail”, contou João.
A perna dele foi prensada no equipamento da rodovia pelo carro do policial. “Eu caí no chão, eu meio que tentei me levantar, vi que a perna não respondia, coloquei a mão na perna e vi que não tinha muita coisa ali. Tinha a calça, mas eu conseguia sentir que não tinha nada muito sólido e comecei a discutir com ele”, recordou.
“Ele desceu do carro e começou a discutir comigo. Eu fiquei acordado o tempo inteiro. Fiquei acordado até o bombeiro chegar, depois de uns 20 minutos. Depois ele me deram um sedativo.”
Dramática, a lembrança ainda provoca emoções em João Henrique e na mãe Sheila Thomaz, que viajou para Dublin assim que soube do acidente do filho e acompanhou toda a recuperação dele, na Irlanda.
“Ali eu já sabia que tinha perdido a perna. Eu perguntei para um amigo que estava junto, o Guilherme. Pedi para ele ser sincero, e falei: ‘Minha perna já era?’ Aí ele disse: ‘Já era’. E aí ele fez o torniquete na hora”, disse João.
‘Não vai morrer’.
Sheila viveu os piores momentos na vida em outubro de 2023, quando soube que o filho havia sofrido um grave acidente em Dublin.
As primeiras informações não evidenciavam a gravidade do acidente. Avisaram Sheila pelo telefone de que João havia sofrido um acidente. Ela pensou que ele poderia ter quebrado a perna, mas a verdade é que ele teria de amputá-la. A verdade só veio à tona quando a namorada de João ligou do hospital, minutos depois do acidente numa rodovia em Dublin.
“Quando chegou ao hospital, ela me ligou de vídeo ao lado dele na maca, e ele completamente alucinado de tanta morfina que tinham dado. Ele falou ‘Se eu morrer, fala que eu amo todo mundo’”, contou Sheila no podcast Superação.
Foi nesse momento que o coração da mãe teve que suportar o pior baque da vida, silenciando a própria angústia para acalentar a esperança do filho.
Sheila falou para João: “Não, você não vai morrer, cara. Para com isso. Imagina. Eu estou indo para aí. Me dá 12 horas que eu estou chegando e quando eu chegar a gente vai conversar. Você vai aguentar até a mãe chegar”, disse ela. “Eu ia a pé, nadando, eu ia fazer qualquer coisa, entendeu. Mas eu tinha que chegar”.
As primeiras horas após saber da real situação de João Henrique foram as mais dramáticas na vida de Sheila. Ela mobilizou o médico Danilo Stanzani, ex-secretário de Saúde de São José, para orientá-la, além de providenciar a viagem a Dublin.
“Liguei para o doutor Danilo Stanzani, que é o meu anjo da guarda, não tenho como agradecer o que ele fez. Ele achou dois médicos, amigos dele, traumatologistas também, ortopedistas. Um estava em Londres e um em Abu Dhabi. Eles fizeram contato com a equipe médica que estava com João no hospital”, disse Sheila.
“E ele falou: ‘Está dentro do prazo de amputação e não sobrou material, não sobrou o suficiente. Nem que quisesse fazer um enxerto. Não tinha mais’. Ele é jovem, um menino saudável, então o corpo vai aguentar, vai resistir. É melhor terminar a amputação e ele ganhar com uma prótese depois.”
Segundo Sheila, o que salvou a vida do filho foi o torniquete improvisado que os amigos dele fizeram no momento do acidente.
“O que salvou a vida dele, estancou o sangramento na hora, foi o primeiro torniquete. Foi o que o menino fez. Eu falo que ele foi um anjinho que Deus colocou, porque salvou a vida dele. Totalmente. É um menino que nunca fez um negócio desses na vida. Não é brincadeira. Eu nunca vou ter como pagar esse menino. Não tem dinheiro, oração, nada que eu te deseje que recompense isso, você salvar a vida do meu filho. Então é absurdo. Deus mandou esses três anjinhos”, afirmou.
Cirurgias.
Após ser atingido pelo carro e perder parte da perna direita, João Henrique passou por 18 cirurgias no período em que esteve internado no hospital na Irlanda.
“[Quando cheguei] ele estava bem, estável, em coma induzido na UTI. É uma cirurgia muito grande. Foram nove especialidades que se reuniram para ver como é que ia ser feito isso, porque rasga muito os tecidos, é complicada a cauterização de tudo isso. Leva-se tempo. Ele fez 18 cirurgias ao longo do período que ele ficou lá. E cada uma foi corrigindo, botando dreno, bem complexo. Foram 55 dias até o fim dessa internação”, disse Sheila em participação no podcast Superação, novo quadro do OVALE Cast.
Segundo ela, os médicos irlandeses salvaram a vida do filho, mas o tratamento teria sido diferente se João fosse europeu. “Eles têm ótimas instalações físicas. Eles têm os melhores equipamentos, eles têm os melhores medicamentos. Tudo deles é de ponta, é de muita qualidade. Os profissionais, aí eu ouso dizer que os nossos aqui dão de 10 a 0”.
“Eu os achava muito inseguros nesse aspecto. Eles estavam fazendo o limite deles. Não é ruim. Mas, assim, você sente que podia ter sido feito muito mais. 18 cirurgias e agora que foi corrigida toda a parte óssea com a pele sintética que eles colocaram. Aqui no Brasil”, contou a mãe.
Policial.
Após ser violentamente atingido pelo veículo, João Henrique discutiu com o policial que o atingiu. “Mas ali na hora [do acidente], eu estava um pouco lúcido, eu fiquei discutindo muito com o policial. Eu tentei levantar justamente para discutir com ele. Eu falava que ele tentou me matar, e ele falava: ‘Não, foi um acidente, foi um acidente’. Eu falava: ‘Não, você tentou me matar, eu sei que você tentou me matar’”, disse João.
“A única coisa que ele falou é que foi um acidente. Era a única palavra que ele conseguia falar. Não tinha uma explicação, era só isso. Ele só falava assim: ‘Calma, foi um acidente’”, completou.
Sheila disse que outros policiais colocaram o colega dentro do carro e o levaram embora, após ele ter atingido João Henrique. “Era para tirar do flagrante. A primeira coisa que apareceu depois foi um atestado médico de 90 dias de afastamento para ele, porque ele estava muito chocado”.
Atualmente, o policial envolvido no caso responde a um processo judicial e pode ser até preso, caso seja condenado. Sheila e João Henrique acompanham as audiências pessoalmente e enfrentam as diferenças do sistema judicial em outro país.
“O Ministério Público deles, com a promotoria deles, é que tem que processar o policial. É o que está acontecendo agora. Depois disso, desencadeia para ele [João], que é a vítima. Para eu conseguir entrar nesse processo, eu tive que contratar um advogado irlandês. Eu não podia contratar um internacional, nem um brasileiro. Tem que ser irlandês. Eu não posso ter acesso”, disse Sheila.
“Se eles quiserem fazer um acordo amanhã com ele e liberar, acaba tudo. Não tem nenhum respaldo. Eu vou falar muito claramente. A Irlanda, o governo irlandês, não me ofereceu absolutamente nada. Nunca nos procuraram. O Brasil faz isso, a nossa assistência social. Inclusive com estrangeiros. Então assim, nós temos todo um acolhimento que eles não fizeram. Não deram a mínima”, afirmou a mãe no podcast Superação.
“Chegou um ponto que eles começaram a vir querer me segurar porque não queriam que eu falasse para as redes públicas. Não queria que eu fosse para a internet. Não queria que eu desse entrevista, porque eu estava manchando a imagem da Irlanda como um país não seguro”, completou.
Em setembro, os dois retornarão à Irlanda para acompanhar audiência do processo judicial do policial que atropelou João. O agente público pode ser preso caso seja condenado. OVALE acompanhará o julgamento, diretamente de Dublin.
Carinho.
Em meio à dor e ao sofrimento, João Henrique também experimentou a solidariedade e o carinho das pessoas.
“Infelizmente não consegui responder todas as mensagens. Foram inúmeras no meu celular. Quando eu peguei estava travado de tanta mensagem. Veio mais de 8.000 mensagens em um único dia. Eu não tenho noção até hoje da proporção que isso tudo levou”, afirmou.
“É uma coisa realmente muito louca quando a gente sai na rua, o carinho que a pessoa tem, a pessoa que nunca me viu na vida me abraça com carinho, me deseja tudo de bom. É uma coisa que não tenho como contribuir, só desejando que Deus abençoe muito, agradecendo sempre”, disse João.
Recuperação.
Sheila revela que o primeiro dia que viu o filho de pé com a prótese “foi uma emoção”. “Saber que teu filho vai ter autonomia. Ele vai poder se virar sozinho. Eu não sou eterna, mas assim, eu quero deixar ele numa situação que ele consiga ter a vida dele sozinho, ele consiga se virar, ter a casa dele, fazer a comida, cuidar de si, cuidar dos seus”, disse.
Ao lado do filho, Sheila contou que, ao receber a ligação da namorada dele dizendo que João Henrique havia perdido a perna, ela entrou em “modo Matrix”.
“Acabou tudo, meu chão, saiu tudo, eu fiquei suspensa. Eu não saí desse momento ainda. Eu acho que eu só vou sair quando acabar tudo”, afirmou.
Sheila afirmou que ainda não desligou o “modo Matrix”, as que isso vai acontecer, e rápido. “Eu vou descansar, vou tirar um mês que eu vou sumir, respirar e eu vou poder chorar também, porque até hoje eu não consegui chorar. Eu fui passando mal, mas perto dele eu nunca chorei. Chorava no banheiro escondido. Eu preciso botar tudo isso para fora. Eu preciso respirar tudo isso. E vai acontecer”, disse.
Moto.
E se depender de João Henrique, a recuperação plena vai acontecer mais rápido que a mãe espera. Tanto que ele já começa a ter uma vida cada vez mais normal.
Tão normal que os pais começam a ficar preocupados com a “independência” do filho, que já planeja voltar a pilotar motos.
“Ele está tentando dirigir moto. Ele está pensando num jeito de adaptar uma rodinha na moto. Ele quer me matar, ele quer me matar de nervoso”, disse Sheila, aos risos.
O bom humor da mãe aparece depois de muito tempo de preocupação com a recuperação de João Henrique, que passou por 18 cirurgias na Irlanda, nos 55 dias que esteve internado em Dublin. Agora, ele garante que reconquista sua liberdade de movimento.
“Graças a Deus, consigo fazer basicamente tudo que eu gostava de fazer antes. Uma coisa que me preocupava era a questão de dirigir. Eu não sabia se eu ia conseguir dirigir ou não. Isso eu ficava me perguntando. E hoje eu dirijo só com o pé esquerdo. Então é tranquilo. Dirijo para cima e para baixo”, afirmou João Henrique. “Estou andando de bicicleta também com meu pai, eu consigo ir à academia com meu amigo”.
Superação contou com apresentação do jornalista Tiago Bezerra. O podcast na íntegra está disponível no Youtube e no Spotfy, além do site e das redes sociais de OVALE.