PAPA DO FIM DO MUNDO

‘Por meio de gestos, papa testemunhou sua missão’, diz CNBB

Por Da redação | Brasília
| Tempo de leitura: 8 min
Reprodução / A12
Papa acolhe menino no Santuário Nacional de Aparecida
Papa acolhe menino no Santuário Nacional de Aparecida

A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) lamentou a morte do papa Francisco, anunciada pelo Vaticano nesta segunda-feira (21), e disse que o pontífice testemunhou sua missão no mundo não apenas por mensagens e documentos, mas por seus gestos e atitudes.

Clique aqui para fazer parte da comunidade de OVALE no WhatsApp e receber notícias em primeira mão. E clique aqui para participar também do canal de OVALE no WhatsApp.

“Em seu pontificado, o papa Francisco realizou gestos que traduzem e reforçam suas mensagens para a Igreja e a humanidade inteira. Não só com palavras e documentos, ele apontou para uma Igreja em saída, misericordiosa, que cuida da criação, vive o amor na família e promove a fraternidade humana”, diz mensagem da CNBB.

A Conferência dos Bispos do Brasil listou alguns dos “inúmeros gestos” que marcaram o pontificado de Francisco e ficaram “registrados nas memórias, corações e na história da Igreja”.

Papa junto do povo.

Logo após ser apresentado ao mundo, na sacada central da Basílica São Pedro, o papa Francisco surpreendeu os milhares de fiéis que lotavam a praça ao saudá-los com um simples “boa noite” e, em seguida, inclinar-se pedindo orações por sua missão à frente da Igreja Católica.

Em 8 de julho de 2013, Francisco fez a primeira viagem de seu pontificado: à ilha de Lampedusa, no extremo sul da Itália. No local, o pontífice quis manifestar sua proximidade aos migrantes que tinham conseguido atravessar o Mediterrâneo e chorar por aqueles que morreram na travessia. O gesto deu início às diversas iniciativas em vista de acolher, proteger, promover e integrar os migrantes.

Em julho de 2013, Francisco fez sua primeira viagem apostólica, durante a Jornada Mundial da Juventude, no Brasil. Na ocasião, vários momentos marcaram a memória daquele primeiro contato do pontífice em outro país junto com o povo. Um exemplo foi o abraço no menino Nathan de Brito, à época com 9 anos, no Santuário Nacional de Aparecida. O menino conseguiu furar o bloqueio e partilhar com o papa seu desejo de ser padre.

Em várias ocasiões durante seu pontificado, Francisco saiu do Vaticano para fazer visitas surpresas na periferia de Roma. Famílias, instituições que atuam com jovens ou com pessoas que enfrentam problemas mentais foram visitadas pelo pontífice, e receberam palavras de apoio e incentivo. Essa presença também ocorreu nas paróquias da periferia da diocese de Roma, escolhidas por Francisco para encontros com o clero.

Globalização da esperança.

No dia 28 de outubro de 2014, o papa reuniu-se com os movimentos populares, que realizavam, em Roma, o seu primeiro encontro mundial. Em audiência, proferiu um discurso que poderia ser definido como “programático”, indicando os três Ts (terra, teto e trabalho) ponto fulcral da ação destes grupos que atuam em nome da dignidade humana, da justiça social, do desenvolvimento dos mais pobres e dos descartados. O pontífice voltou a encontrar os movimentos em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, em 2015, e dirigiu-se a eles nos encontros seguintes.

Na Bolívia, Francisco afirmou: “a globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres, deve substituir esta globalização da exclusão e da indiferença”.

Em 2015, Francisco convocou o Jubileu Extraordinário da Misericórdia. ‘Misericordie Vultus’ foi o título da Bula de Proclamação. Na época, o Ano Santo foi oportunidade para contemplar o mistério da misericórdia, “fonte de alegria, serenidade e paz”. Para essa ocasião, Francisco marcou o início adiantado do ano jubilar na África. A primeira Porta Santa foi aberta em Bangui, na República Centro-Africana, uma terra marcada pela guerra e sofrimentos.

Assim como seus predecessores, João Paulo 2º e Bento 16, o papa Francisco visitou os campos de concentração de Auschwitz e Birkenau, onde milhares de judeus foram feitos prisioneiros e mortos pelo regime nazista. Naquela ocasião, em julho de 2016, marcada pelo silêncio e oração, Francisco escreveu no Livro da Memória do Museu de Auschwitz: “Senhor, tem piedade do teu povo! Senhor, perdão por tanta crueldade!”.

Em várias oportunidades, o papa falou que a humanidade não deve repetir o extermínio ocorrido na Polônia.

Amazônia.

“Provavelmente, nunca os povos originários amazônicos estiveram tão ameaçados nos seus territórios como estão agora”, disse o papa, manifestando sua preocupação com a vida dos povos indígenas, durante o encontro que reuniu mais de 3 mil pessoas em Puerto Maldonado, no Peru, em 18 de janeiro de 2018.

O encontro foi marcado por testemunhos e um longo discurso do Pontífice, em que o Papa manifestou a sua preocupação pela ameaça que os povos e o território da Amazônia estão sofrendo. O evento foi marcante no processo de realização do Sínodo para a Amazônia, ocorrido no ano seguinte, culminando com a exortação apostólica Querida Amazônia.

Mesmo que o Sacramento do Matrimônio seja celebrado pelos noivos, Francisco demonstrou celebrar, no sentido de exaltar e valorizar, a união de amor entre o homem e a mulher. Em algumas oportunidades, ele fez questão de assistir noivos na união diante de Deus, como em 2018, quando presidiu a missa no casamento de uma jovem brasileira com um ex-guarda-suíço.

Também demonstrou essa valorização na convocação de duas assembleias sinodais sobre a família, a exortação apostólica sobre o amor na família e o ano “Família Amoris Laetitia”, cinco anos depois da publicação do documento pós-sinodal.

Paz e fraternidade.

Em gesto sem precedentes no Vaticano, o papa Francisco ajoelhou-se e beijou os pés de líderes do Sudão do Sul que viviam em guerra pelo controle do país. No dia 11 de abril de 2019, ao concluir um retiro espiritual para a paz com autoridades civis e eclesiásticas do país, o pontífice apelou que eles não voltassem a travar uma guerra civil pelo poder.

“A vocês três que assinaram o Acordo de Paz, peço-lhes, como irmão, que permaneçam na paz. Peco-lhes com o coração. Vamos seguir em frente. Haverá muitos problemas, mas não tenham medo, vão em frente, resolvam os problemas. Vocês iniciaram um processo: que termine bem. Haverá lutas entre vocês dois, sim. Que elas ocorram dentro do escritório; diante do povo, as mãos unidas. Assim, de simples cidadãos, vocês se tornarão Pais da Nação. Permitam-me pedir isso com o coração, com os meus sentimentos mais profundos”, disse o papa.

Em 2019, o papa assinou com o grande imã de Al-Azhar, Ahmed Al-Tayeb, líder muçulmano, uma declaração conjunta de boas e leais vontades, capaz de convidar todas as pessoas, que trazem no coração a fé em Deus e a fé na fraternidade humana, a “unir-se e trabalhar em conjunto, de modo que tal documento se torne para as novas gerações um guia rumo à cultura do respeito mútuo, na compreensão da grande graça divina que torna irmãos todos os seres humanos”. A declaração é considera precursora da encíclica Fratelli Tutti.

Pandemia.

Numa Praça de São Pedro vazia e debaixo de chuva, o papa atravessava rumo à porta da basílica. Uma das imagens mais emblemáticas de seu pontificado, num momento desafiador e de sofrimento para a humanidade inteira. Eram os primeiros meses da pandemia de Covid-19 e Francisco promovia um “momento extraordinário de oração” com a bênção Urbi et Orbi (Para a cidade e o mundo).

Meditando o Evangelho no qual Jesus acalma a tempestade (Mc 4, 35), o Papa ressaltou que, naquele momento, todos estavam no mesmo barco e eram chamados a remar juntos, despertando e ativando a solidariedade e a esperança.

“O Senhor desperta, para acordar e reanimar a nossa fé pascal. Temos uma âncora: na sua cruz, fomos salvos. Temos um leme: na sua cruz, fomos resgatados. Temos uma esperança: na sua cruz, fomos curados e abraçados, para que nada e ninguém nos separe do seu amor redentor. No meio deste isolamento que nos faz padecer a limitação de afetos e encontros e experimentar a falta de tantas coisas, ouçamos mais uma vez o anúncio que nos salva: Ele ressuscitou e vive ao nosso lado. Da sua cruz, o Senhor desafia-nos a encontrar a vida que nos espera, a olhar para aqueles que nos reclamam, a reforçar, reconhecer e incentivar a graça que mora em nós. Não apaguemos a mecha que ainda fumega, que nunca adoece, e deixemos que reacenda a esperança”, disse o papa.

Francisco tentou “construir pontes” diante dos inúmeros conflitos que ocorrem no mundo todo durante seu pontificado, que marcam como que “uma guerra mundial em pedaços”. Ucrânia, Palestina, Israel, Líbano, Mianmar, Sudão e Kivu do Norte foram frequentemente lembrados nas orações do Angelus, junto com um clamor pela paz.

A preocupação do papa se traduziu nas ligações diárias à paróquia Sagrada Família, em Gaza, onde dezenas de pessoas conseguiram abrigo para se protegerem dos ataques de Israel. Mesmo depois do cessar fogo e da sua internação, o papa continuou com as ligações.

Enfermidade.

Francisco não deixou de levar mensagens importantes mesmo com sua fragilidade durante o longo período de internação e após a alta do hospital. Quando possível, ele continuava a ligar para a paróquia em Gaza. Depois de retornar para a Casa Santa Marta, sua primeira aparição pública foi no Jubileu dos Enfermos e do Mundo da Saúde. Francisco quis estar próximo e se fazer com um daqueles peregrinos.

Em outras aparições, o Papa dedicou suas orações diante dos túmulos do Apóstolo Pedro e São Pio 10º, e do monumento dedicado a Bento 16, na Basílica de São Pedro. No dia 16 de abril, teve um encontro com a diretoria e funcionários do Policlínico Gemelli, onde esteve internado por 38 dias.

O pontífice agradeceu a atenção e a assistência recebidas e garantiu suas orações e, em seguida, sua saudação a cada um dos presentes. Na última quinta-feira, Francisco quis manter a tradição de visitar uma prisão por ocasião do lava-pés. Assim, ele esteve na prisão Regina Coeli, em Roma.

“Todos os anos, gosto de repetir o que Jesus fez na Quinta-feira Santa, o lava-pés, na prisão”. E acrescentou: “Este ano não posso fazê-lo, mas posso e quero estar perto de vocês. Rezo por vocês e por suas famílias”, disse o papa.

* Com informações da CNBB

Comentários

Comentários